quinta-feira, 7 de abril de 2016

208 A DOR

Dor contínua: algo desagradável, desconfortável e incapacitante. Aspectos físico-sensoriais e emocionais alterados e desarticulados. Não há experiência pior, principalmente, quando ela se torna crônica. E quando a dor instala-se nas articulações, os movimentos estão impedidos; a vida cotidiana começa a perder sentido e a cama é o melhor lugar pra se esconder. Não há mente saudável que se sustente. Estamos incapazes de nos comunicar facilmente com o mundo e com as pessoas: nunca mais correr, abraçar, pegar, andar, eis os pensamentos que esvaziam nosso vigor. Não há subjetividade nisso: a dor dói mesmo. A engrenagem corporal funcional aos trancos e barrancos; e o cérebro começa a jorrar cortisol nos sistemas: surge a vontade de ‘nada’; surgem mais respostas ‘não’ do que ‘sim’; surge o olhar cinza e a utilidade de solidão; surge o silencio, a falta de humor e o sedentarismo. Assim chega e fica a doença trazida pelo Aedes Aegypis, no meu caso, a Chicungunha. Mais do que febre ou infecção, a inoperância dos movimentos traz muita dor física e também emocional. É um alerta de que, de novo, estamos á mercê da sorte e/ou na mão do outro. É um alerta à nossa fragilidade e limitação orgânica em meio a uma Natureza tão violada por nós mesmos. De repente e sempre, estamos disfuncionais e não há o que fazer. Cinco dias, um mês, seis meses, dois anos: quanto tempo podemos suportar os limites do corpo às nossas vontades e responsabilidades, sem enlouquecer ou deprimir? A dor apresenta a possibilidade de olharmos nosso corpo e nossa mente de outra maneira: diferente; e investe na possibilidade de criar estratégias para retomar o caminho da saúde; mas a questão crônica nos impede de perceber a positividade desse momento. A dor demora. Demora demais. É uma experiência que não desejamos, mas que, de uma hora para outra, nossa pele está alterada, nossa temperatura elevada e nossas articulações travadas / doloridas. E nossas responsabilidades, aquelas que nos distraem do corpo e da mente, não tem como serem descartadas. Saídas de carro, aula com febre, movimentos, toques, tudo continua só que há um novo elemento: A DOR. É pesado! É duro! É desesperador! Tudo dói demais em dupla face: por dentro (efeito da picada) e por dentro (emocional / psicológico). Experiência sensorial sem alinhavo e concordância: só uma vontade louca de deitar e dormir eternamente sem dor. De uma hora para outra, só temos a necessidade de tolerância. Quanto tempo podemos tolerar a dor? Particularmente, tempo nenhum! Essa tolerância sim pode ser considerada subjetiva: ela está relacionada ao tanto de dor já vivido e superado. Tolerância depende também da experiência de / da dor. Além de nos surpreender com o corpo e a mente, nossa individualidade percebe a dor de acordo com nossa experiência de vida. Em dor estamos altamente estimulados na parte afetiva, fisiológica, cognitiva: estamos à flor da pele. Ansiedade, medo e depressão tem uma proximidade bem forte aos nossos pensamentos: são fantasmagóricos e arrepiantes. Vontade de nada mesmo! A dor faz interação direta com o psicologismo do sujeito. Quanto tempo isso dura? Quanto tempo a tolerância é positiva? Estamos alarmados (doloridos). Estamos ‘psicossocialmente’ disfuncionais. E os dias se tornam angustiantes e tristes. Meu sistema nervoso central interpreta assim: agonia. Vou deitar de novo... Claudia Nunes

207 O REAL VALOR DA PÁSCOA

Pensando em Páscoa (Pêssarr, em hebraico = passagem). É um jogo de memória. É uma forma de lembrar que precisamos ter mais humildade, paciência, consciência ecológica, amor verdadeiro, força de vontade e juízo. Sim, devemos reorganizar nossos sentimentos ao encontro de mais juízo e identidade. Nós, humanos, somos luz do mundo, mas sozinhos não iluminamos nada e nem ninguém. Eu e o outro promovemos a fé e a confiança necessárias às promessas, às alianças, ao sucesso, à superação e ao entendimento dos nossos dias sem tantos problemas. Da Natureza, somos as criaturas das mudanças e do pensamento; da curiosidade e da criatividade; logo somos símbolos de uma representação de fé, comunhão e solidariedade. E precisamos de mais libertações das mentiras, das falsidades, das maldades, das indiferenças e das malícias. Páscoa é a lembrança de jantares em família; risos na mesa; trocas de afagos e abraços; conversas francas; sem pressas, desatenções ou celulares. Nós não somos mais escravos de nada ou ninguém; e nem deveríamos optar por sê-lo em nome da modernidade, civilização ou atualização. Não somos mais cordeiros; mas devemos nos ‘alimentar’ de bons fluidos e energias, quando diante de um bem, um bom, uma bonança, um benefício, uma beleza sem orgulhos bobos; e devemos saber juntar e viver as diferenças com respeito e silencio. Silencio é a tônica dos dias atuais sem que se perca a identidade ou a verdade. Silêncio é a tônica da gratidão mesmo se for nossa última opção de bem-estar. Páscoa é herança de fé e de força seja ela sentida como ‘Easter’ (adoração à deusa Ishtar) ou ‘Pêssach’. Páscoa traz o conceito de primavera: reflorescer, revitalizar. Páscoa é a fertilidade de campos, corações e mentes para um novo tempo ou ciclo de vida. Páscoa é uma passagem de vida para uma nova vida cheia de oportunidades e surpresas: daí a representação do coelho (fértil) e do ovo (início da vida). Até os dias de hoje muitas histórias, de culturas diferentes, se uniram para agradecer e entender este momento. Há uma grande ritualização necessária a sensação de renascimento, mesmo que a penitencia seja importante. É um período de parada, entendimento, menos velocidade, mais interiorização, de expectativa sobre morte e ressurreição: metáforas da nova oportunidade de mudarmos nossas formas de viver como lagartas e reviver como borboletas. Eu acredito nisso. Eu acredito muito nisso. Estamos às portas de uma entrada para a verdadeira ‘vida eterna’ e precisamos decidir vivê-la com menos invenções, restrições ou tensões junto aos outros tão importantes em nossas vidas. Páscoa é isso: outra data para decidirmos o que seremos nos próximos dias e quais valores / pessoas nos envolverão com graça, calma e amor. Chocolate é bom; mas o amor ao próximo é fundamental. Claudia Nunes

206 'DEUS não joga dados com o universo'


Quando vivemos nossos sonhos precisamos ter muitos cuidados, principalmente em nossas relações. Nunca devemos ignorar a simplicidade de duas palavras: gratidão e humildade. Mesmo com rios de dinheiro ou holofotes de celebridade não podemos perder a noção de humildade. Nós voltaremos ao pó, mas vivemos a vida esperando não conviver em pó: sozinho, fluido, vagando e sem base afetiva. Precisamos da humildade. O sentido da gratidão é reflexo de nossa humildade sempre. Será que perdemos isso? Será que ficamos tão duros ao ponto de aceitar a soberba ao invés da humildade? Os tempos estão difíceis e confusos. Mas viveremos com os outros, e onde estará a amizade? Sem humildade, difícil ser amigo. Mesmo se alcançarmos todos os degraus dos desejos, os outros sempre serão a participação especial nesse processo. Precisamos ser humildes mesmo! E assumir a responsabilidade de, apesar de conquistadores, manter um olhar em nossos pés (casa, amigos, afetos) sem as prepotências dos ganhos obtidos. Sejamos humildes! Ninguém é melhor ou pior que ninguém. Dignidade, respeito e honestidade, por exemplo, são ganhos de homens de bem em todos os setores da sociedade. Fama, sucesso, dinheiro são importantes? Sim, lógico, mas há algo a se lembrar sempre: somos limitados, temos limitações, não somos perfeitos. E a modéstia, nossa melhor amiga e fonte de atitudes positivas, sempre nos possibilitará elevação espiritual, tão importante ao futuro quando fama, dinheiro e sucesso estiverem em outras mãos. Tenhamos humildade quanto ao modo de vida; às posses; ao jeito de agir e falar; às escolhas; às decisões; às formas de afeto das outras pessoas; afinal as experiências são diferentes e merecem nosso melhor sorriso, cuidado e respeito sempre. Humildade abre um leque para empatia e simpatia, e constrói uma vida quase isenta de solidões e mal-entendidos. Sim, os pouco humildes sofrem demais, afinal suas fraquezas estão disfarçadas com a chamada personalidade. Há uma capa fina os protegendo das invasões e das perdas. Os ‘sem humildade’ não sabem perder e por isso tem um manto de invisibilidade: são duros, marrentos e arrogantes. Perderam a noção do amor e da delicadeza com o próximo. E se desculpam porque a vida não lhes deu trégua até serem o que são. Pena! Triste! Sem humildade, as pessoas são encaradas como perigosas, invasivas, inúteis, descartáveis. Sem humildade, a tal personalidade se sente superior e, como um trator, passa por cima das pessoas, mesmo as que mais ama, sem lembrar que o amanha existe. Eles acreditam sinceramente que são melhores e não mais se lembram da virtude de um abraço simples, de um silencio respeitador, de um sorriso aberto ou de um papo livre de senões ou certezas absolutas. Sem humildade, a vida é uma tensão constante e cheia de orgulhos bestas. Por favor, sejamos humildes! Em meio ao sucesso, sejamos cordiais, hábeis e simples. Não há glória na solidão, nas inimizades, nos desencontros, nas perdas que a falta de humildade oferece. Todos somos iguais, apenas alguns souberam aproveitar as oportunidades da vida e alcançaram outros patamares de aprendizagem. Há de haver humildade para saber escutar, falar, sentir, rir, esperar, se desculpar, se abrir ao novo, ignorar pensamentos ruins, esvaziar-se de preconceitos e ser feliz junto, nunca separado. Humildade é a virtude central da vida em vida e para vida. Ela é testada todos os dias talvez para confirmarmos ou não nosso merecimento a partir de nossas atitudes e ações. Humildes, mas com atitude. Humildade, mas com elegância. Humildade, mas com limites e delicadezas. Não há rebaixamento nisso, é o reconhecimento humanizado e real de nossas falhas. Fertilizamos nossa vida através da humildade sem pieguice. Não neguemos esse sentimento. Não ignoremos sua força. Não descartemos sua enorme energia transformadora. Nossos sonhos podem ser realizados, mas exigem disciplina e simplicidade para construi-los objetivamente. A humildade se compromete, realiza, alcança, conquista, compartilha e nos disponibiliza para saber mais e melhor junto com os outros. Humildade é junto; o orgulho é separado e estagnado. Não há movimento no orgulho. Sofremos da aparência do movimento porque nos orgulhamos de quem somos e do que conquistamos; quando deveríamos aprender e agradecer o tempo de luta até reconhecermos quem somos e o que conquistamos. Sejam sociais e menos possessivos. Nada é seu; tudo pode favorecer a todos. Não desejemos grilhões; desejemos portas abertas e um livre trânsito de emoções e pessoas que possam nos ajudar a continuar crescendo: isto é humildade! Se o mar quisesse ser o primeiro, se quisesse ficar acima de todos os rios, não seria mar, seria uma ilha. E certamente estaria isolado. Sócrates já dizia ‘só sei que nada sei’. Este é o ponto da humildade. Esta é nossa busca eterna: sonhar, agir, aprender e conquistar sem escravidões orgulhosas. Humildade é um valor, não uma condição: e é para vida toda. Àqueles com humildade sabem que nada sabem e procuram aprender sempre; sabem dar valor a quem lhes ajuda ou ajudou; sabem conviver com as diferenças sem exigir que provem quaisquer coisas ou que o outro seja o que não é. Pessoas, sejamos humildes e, com certeza, nosso mundo entrará em uma rotação mais positiva e feliz com a Naturezal. Aproveitem, afinal, como afirma Einstein, ‘Deus não joga dados com o universo!’.  Claudia Nunes

204 RETORNO À OUTRA DIMENSÃO


Vamos voltar à sala de aula adolescente!
Corpo e mente estão eletroquimicamente se organizando (e alterando) para este novo momento na vida de milhares de profissionais da educação. Mesmo aqueles mais cansados, desiludidos ou indiferentes, sempre há uma ponta de expectativa quanto ao retorno ao trabalho e ao que encontrarão como aprendente. Em ambos os lados dessa balança chamada ‘ensino-aprendizagem’ há sonhos, vontades, esperança de realizar um bom trabalho ou de ser um bom aluno.
As férias são importantes para a neuroplasticidade profundamente positiva: somos professores e humanos; logo a distração, prazer, o tempo vago (vagando), a família, os amigos, reestruturam a composição orgânica e mental porque tem seu tempo de vivência intensa e livre. Noradrenalina, serotonina e dopamina renovando corpo e mente: é a esperança ganhando espaço. Neste sentido (e tempo) pensamos o futuro e sinceramente imaginamos um tempo mais promissor sempre ‘da próxima vez’. Parece que há múltiplas dimensões / realidades e com elas convivemos todos os dias até as férias; daí em diante, Sangrilá se estabelece e vivemos dias de reorganização emocional. Em férias, eu vivo a cultura carioca e em geral, e penso constantemente no que posso me rever como profissional, mas sou assolada por uma tristeza enorme: meus alunos não tem a mesma oportunidade.
Na volta à sala de aula adolescente, penso em meus alunos e nos planejamentos. Eu preciso planejar um ano inteiro, em língua portuguesa e literatura, para quase 110 alunos, de 2º e 3º anos do Ensino Médio público, turno da noite. E a pergunta primeira é COMO?
Do subúrbio carioca, de contexto semiviolento, qual é a dimensão cultural vivida / experimentada por eles, de forma a favorecer o aprendizado de língua portuguesa e literatura? Pelo que escuto e observo, é quase nada. Fora do tempo da escola, estão na vida como vagalumes: atraídos por quaisquer luzes bonitas que os façam distrair de suas mazelas diárias. E eu vou voltar a essa dimensão. Em sala as duas dimensões: a minha e a deles. Não é só uma crise geracional; é uma crise de oportunidades. É uma viagem sem luxo ou paz, e, quase sempre, na base dos conflitos.
Sou otimista, mas, em quase 10 anos, volto para um profundo processo de nadificação intelectual e social. Os alunos passaram as férias trabalhando (único momento fora do contexto); em festas; namorando sem qualidade; cuidando dos irmãos menores; em meio a violências; sendo violentos ou maltratados; brigando; vagando; nas esquinas e bares; nas madrugadas sangrentas; sem paz carinho, amor, novidades, leituras, informações, limites, silêncios e sono.
Mesmo sendo seres vivos humanos adaptados aos seus ambientes e necessidades; são zumbis do seu tempo e das oportunidades. E de novo o ano recomeça e só o que temos é o que Pandora prendeu: a esperança.
Vamos tentar novamente mudar os rumos e os olhares desses grupos de alunos que chegam ou retornam às escolas.

Escola como salvação? Não! Mas escola como espaço das possibilidades e onde devemos tentar, tentar e tentar oferecer outros conhecimentos, com criatividade e muita, muita paciência.          Claudia Nunes

MICROCONTOS 196, 197, 198, 199

196 (12.01.16) Um nada...
Carolina tomou um susto. Ao abrir a porta, o mundo se foi. Nem o tapete da porta contaria sua história. Tudo era branco e sem cor. O corpo paralisou: não tinha para onde ir. Quando o coração acalmou, decisões: ou fugia, ou mudava, ou enfrentava. Nunca as consequências foram tão velozes: ela perdera tudo de repente. Cega, andava pelas ruas pedindo algo para comer e reviver. O caminho não tinha mais ritmo, apenas um pedido: por favor, pode me ajudar? Claudia Nunes


197 (12.01.16) Sem volta
Os pensamentos surgem por causa de gatilhos dos sentidos. Estes sim merecem nossa atenção constante. Eles são crianças que nos acessam quando querem e estimulam nossas memórias mais guardadinhas. Estudando memória, Selena se perdera em sua própria vida. Não sabia reencontrar o foco. Sabia que suas emoções estavam liberadas e não havia como parar. Duras e prazerosas, elas ganharam seu corpo e tiraram sua querida passividade: ela era ela sem ser o ‘ela’ de sempre. Ela não tinha paz; mas ‘ela’ tinha controle. Ela tinha liberdade; mas ‘ela’ vivia dentro de limites. Elas não se completavam e eram a mesma pessoa. Muito barulho e pontas, e ela com profundos andaimes de atenção e linguagem pelo corpo. Selena não tinha como voltar; não sabia como voltar; os caminhos eram um pó elétrico se chocando entre si e criando outros comportamentos e emoções dentro dela. O que pode ser mais fútil, insensato ou insano do que criar resistências? E assim se rendeu e se encontrou. Sim! Serena era a melhor pessoa do mundo, diziam seus amigos psicólogos! Claudia Nunes


198 (12.01.16) Opções
Sem perder tempo, não leve a vida tão a sério; acredite no tempo; limpe as coisas e armários ruins; sinta a leveza da vida, da paz e do sorriso; aja com cuidado, carinho e humor; respeite o futuro e o alheio; nunca seja vítima de si mesmo e das palavras; apodere-se de quem é e dos ensinamentos; lustre os recantos emocionais e seus entulhos; tenha atitudes bonitas e loucas; festeje os dias e a vida; ache a senha do silencio e do beijo; perdoe ansiedades, amores e amigos; mude o gesto, o jeito, o peito; cresça com coração, oração e gratidão; honre pai, mãe, amigos e a si mesmo; lute com fé, a pé e todos os ‘zés’ da vida; e, com tudo isso, Claudio inventou uma linha para a vida: a consciência e o otimismo. Claudia Nunes


199 (14.01.16) FÉRIAS...

E ela foi às férias. Sem crachá e identidade, ela foi à vida para respirar. Nada suspenderia seu momento. Iria respirar o que fosse necessário, sozinha e independente. Seus passos tinham memórias; mas seu futuro estava sombreado e em paz. Ela tinha que respirar e esquecer. Anos pensando em mudanças, planos, atitudes, amores e loucuras. Anos sendo o fenômeno de humano da força, da fé e da compreensão. Anos se trocando, se doando, se esquecendo, se controlando. Agora foi às férias. Férias definitivas. Férias das lutas, dos descasos, das necessidades, das responsabilidades e das farsas. Sim, ela queria ficar longe das farsas das relações de todo dia. Que prazer! Que amor! Que sol! Que luz! Se mais, Camila desligou os aparelhos que mantinham sua mãe viva há 03 anos: férias... Claudia Nunes

POESIAS 188, 192, 194, 195, 203

188 (11.01.16) Deus dará
Um dia precisamos dizer adeus
Não há aprendizado para isso.
A vida se apresenta firme
E tudo o que doeu
Precisa dizer adeus.
De uma hora para outra
Acabam manhas e manias;
Chatices e bobices;
Senões e fantasias;
Amores e dinastias.
A lei é dizer adeus.
A esperança passou,
O medo sumiu,
Na frente dos olhos
Apenas a necessidade de dizer adeus
Com choro ou desejos
Pendências ou cortejos
Lamentos e apreços.

Quando se diz adeus
A Deus
Dará.
Claudia Nunes

192 (12.01.16) Alma
Olhares que se encontram
Quando a dor desencanta
São sentidos desembaraçados
Pela vida mercante que canta
Se no caminho se chocam
Melhor o silencio andante
O respeito ululante
E os abraços refrescantes
É preciso recompor os amantes
Pra uma luta incessante
E uma sobrevivência rompante
A maturidade é isso
Olhares que se encontram
Com promessas veladas
A vida baseada,
Assim dizem
Revivem
Transgridem
Progridem

Animem
Animas
Alma
Claudia Nunes

194 (12.01.16) Hall de Hospital
Encontros e choros
Choros e amizades
Amizades e imagens
Imagens e memória
Memória e medo
Medo e ansiedade
Ansiedade e vazio
Vazio e silencio
Silencio e ruído
Ruído e dor
Respiração
Morte
Morte?
Outra vida
Sempre vida
Claudia Nunes


195 (12.01.16) De fé
A magia se fez
Quando o coração se refez
Não há primeiros nem últimos
Há os presentes
Presentes de vida,
De sorrir e de chorar.
Nada é tão importante
Do que as presenças
E os eternos presentes
Impossível resistir
Fingir ou iludir:
Os presentes são a moda
E nossa responsabilidade.
Diante de portas fechadas
Mentes e presentes
De sempre
De frente
Enfrente
Frente
Entes
De fé
E a pé.
Claudia Nunes

203 (29.01.16) SURPRESAS

Sem destino certo
Encontrei um mundo no lixo
Um lixo de sombras e alegrias
Sujeiras, risos e esperanças.

A surpresa derreteu a negação
E pude simplesmente olhar e viver.
Esse é o lugar das oportunidades!
Crianças brincavam na lama;
Crianças, bolas de gude e bolas de meia;
Crianças, piqueta e pega-pega;
Crianças, amizades e muito calor;
Eram pequenas e grandes;
Felizes, sujas e sortudas.

A surpresa travou minha fuga
E o impulso ‘falou’ mais alto.
Eu corri ao encontro da alegria e dos sonhos!
Impossível iludir os sentidos
Quando a força da verdade nos sufoca.
Os gritos mudaram meu coração
E eu não pude fugir

A surpresa desesperou meu cotidiano
Trouxe inverno às minhas certezas e rotinas
E gelou tudo o que era ‘de sempre’ e correto.
Sem blefes, manchas ou fumaças,
Juntei abraços e encontrei beijos.
Assumi o entusiasmo das pernas alegres
E ocupei meus dias de grandes abraços.

O vento não deixou de soprar
E ninguém parou de sofrer
Mas sem as surpresas da vida
Não há evolução e nem viver.

Claudia Nunes

MICROCONTOS 189, 190, 191, 193, 196

189 (11.01.16) Voou...
A recepção silenciosa e fria. Desde os tempos de infância, a recepção dava medo: cheiro de dor. Quando foi chamado, correu pela escada de serviço. Ele precisava ver o mundo de outro jeito: ele queria ritmo e solidão. Tudo vai dar certo, diziam seus pés. Hemodiálise tem todos os dias e hoje se permitiu voar... Claudia Nunes


190 (11.01.16) Mesma volta
Ele voltou! Ele voltou! Casa desarrumada; vida mudada, sentimentos trocados e tempo mais velho. Mas ele voltou! A vida girou como previra. O som de seus passos semeou novo sorriso. Coração nunca se engana: ela precisava ser rápida. Ele voltou, limpou seu lugar, tocou seu corpo, fez uma mala e se foi... Claudia Nunes


191 (12.01.16) Valor da dor

Na cama do hospital, um movimento ruidoso: medo. A vida passa e o ruído continua: medo. Amanda sentia o peso das ações através dos tantos estranhos que a tocavam e se aproximavam, todos os dias, de seu corpo. Na cama de um hospital, as ardências incomodam muito, mas as feridas do passado latejavam muito mais. Essa é a hora da verdade? Da sua verdade? O tempo só mostrava o seguinte: descanse. Uma mensagem de paz e de medo. Seu coração vibrava em arritmias. Ela sentia o gosto do sangue e da vida. Hospital não era o lugar do sonho; era lugar da saúde dolorida; e saúde exigindo infusões, reflexões, repasses, limpezas e mudanças profundas e íntimas. Será que fora boa? Será que fora amada? Será que fora útil? Na cama de um hospital não há nomes, apenas dores e lutas. Só lhe resta olhar, aceitar e dormir. “Vou dormir na esperança de outro corpo...” E a máquina grita um apito alto e contínuo: piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii... Claudia Nunes

193 (12.01.16) Silêncio e vento
Quando o silêncio é a melhor opção; os ruídos destroem o respeito. Depois que foi o que queria, Soares recomeçou sua luta sozinho e livre... O desapego fora sua melhor arma e destino... cerrou suas algemas e encontrar as surpresas de outono. Claudia Nunes

196 (12.01.16) Um nada...
Carolina tomou um susto. Ao abrir a porta, o mundo se foi. Nem o tapete da porta contaria sua história. Tudo era branco e sem cor. O corpo paralisou: não tinha para onde ir. Quando o coração acalmou, decisões: ou fugia, ou mudava, ou enfrentava. Nunca as consequências foram tão velozes: ela perdera tudo de repente. Cega, andava pelas ruas pedindo algo para comer e reviver. O caminho não tinha mais ritmo, apenas um pedido: por favor, pode me ajudar? Claudia Nunes

ADOLESCÊNCIA e suas ANSIEDADES

Em projetos focados nos desejos e sonhos dos alunos (adolescentes) surgem sempre dúvidas sobre o futuro. Perguntas como ‘o que vc pretende depois do ensino médio?’ ou ‘o que fará profissionalmente depois do ensino médio?’ ou mesmo, ‘vai cursar alguma universidade depois do ensino médio?’ causam preocupações às vezes impensadas. Eles passam o tempo como se tivessem todo o tempo do mundo para decidir a vida. Só que, ao final do 3º ano do ensino médio, eles se sentem angustiados porque as exigências sociais se apresentam e o tempo ‘over’.

Depois de um seminário sobre características realistas hoje (aula de literatura), muitos pensamentos me preocuparam ainda mais em relação a esta geração de quase 21 anos. Do terceiro bimestre em diante, há um novo movimento nas turmas: é a inserção no social através de outros estudos e novos trabalhos sendo exigidos pelos adultos, mas eles nem sabem por onde começar e o que pensar sobre isso. É hora de SE definir, dizem a eles. E a ansiedade tem suas taxas internas avolumadas. Como? – se perguntam...

Antes disso, algo deve ser observado: eles não sabem aproveitar oportunidades e/ou tempo de aprendizado. E mais, ainda que o tempo seja sentido como inextinguível, comportamentos, desejos e emoções tem uma velocidade exponencial: eles fazem tudo correndo. O foco é o fim, nunca o processo. Amam, comem, dormem, realizam tudo correndo. A ação reflexiva em que o cérebro precisa de tempo para se adaptar à frequência e rotatividade de informações ocorre aos trancos e barrancos. Os sentidos não confluem para o fortalecimento das suas experiências; eles são acessados apenas, por exemplo, no momento da prova em que serão avaliados. As chances de conexões de qualidade são poucas.

A matemática do comportamento adolescente é: sentido + ação (foco) = nota máxima. Em muitas escolas, NOTA é a base dos movimentos à aprendizagem e os recursos para que alcancem estas notas nunca giram em torno do tempo passando, mas sim no tempo da HORA acontecendo. E eles se tornam ansiosos na produção dessas NOTAS porque estas se relacionam ao sucesso, conquistas, privilégios e separações. No trigo, eles querem ser JOIO e a NOTA (meritocracia) faz bem isso para suas emoções e para suas relações em geral.

Adolescentes têm outros aguçamentos emocionais, isto é um fato. Amores, celular e redes sociais, por exemplo, são seus mundos e por eles ganham status com outros colegas e/ou na família: quem TEM não TEME nada. Com estas ferramentas, eles conversam, interagem e se relacionam, ao contrário do que muitos pensam. Eles estão formando outras redes em outras redes / ambientes / plataformas. Nesses territórios, constroem identidades, formas de pensar e certezas no agir. As diferenças entre ambiente virtual e real diminuem; os prazeres e os desejos podem ser experimentados; e a formação humana ganha outra arquitetura. E como fica a formação na escola? Resposta: desconectada.

Com interesses ignorados, eles precisam funcionar em paralelo entre ambientes: o real e o virtual; entre a obrigação e o prazer; e entram numa correria contra o tempo em que o tempo da escola torna-se uma obrigação social sem nenhum prazer. Eles passam esse tempo observando a vida lá fora (da escola), numa rotina de prazeres múltiplos por dentro, em contato confuso com emoções, pessoas e decisões. Como querer que, depois de três anos de ensino médio, eles tenham um futuro profissional definido? Nem a palavra ‘definição’ os reflete. Difícil... tudo está muito difícil... para eles.

Quando paramos para ouvir e pensar esse adolescente, reconhecemos uma rotina agitada de vida urbana, cheia de afazeres e sem pensar no amanha. Em sua maioria, eles têm uma liberdade inconsequente. E se chocam consigo mesmos quando se deparam com o fim do curso: tornam-se ansiosos ‘do depois’. É uma ansiedade da hora, do agora, do hoje por causa ‘do depois’. E se não estão trabalhando (sendo úteis), eles ratificam o que sempre lhes disseram de uma maneira abrupta: eles não são ninguém; eles não são nada. Pergunta base: o que fazer? Por onde começar?

Adolescentes dificilmente se deixam desfrutar pelo futuro no presente. Sua ansiedade é hoje. É preocupante esta ansiedade: ela é paralisante e o corpo se acostuma com níveis altos de cortisol. Engraçado que o tempo (passado, presente, futuro) é característica humana. Somos todos formatados por esses tempos por causa da convergência de nosso cérebro reptiliano (sobrevivência contra predadores, fome, sede), nosso cérebro emocional (percepções, luta e encontro de abrigo) e nosso cérebro racional (relação, pensamento, raciocínio), logo ansiedade nos capacita a criar estratégias adaptativas do sistema nervoso, do corpo e da mente para conquistar objetivos, sonhos e pessoas.

De outro lado, a ansiedade fortalece nossa criatividade, habilidades, competências no trato com o meio ambiente. É uma reação natural do organismo humano em situações de medo, dúvida ou expectativa. Ou seja, há motivações. Adolescentes indisciplinados, agitados, com linguagem confusa, podem apresentar ansiedades com intensidade e duração inadequada. Resultado: professores reclamando muito. Quais gatilhos estimulam esses comportamentos? Formas de aproximação? Insatisfações? Falas grosseiras? Emoções pessoais despercebidas? Práticas de ensino inadequadas? Atividades pedagógicas desinteressantes? Perda da sensação de pertencimento? Muitos estímulos sonoros e visuais em sala? Resposta: tudo isso junto!

A questão da identificação do gatilho é importante. Porém o professor deve saber antecipadamente: ansiedade fora do normal é persistente, aparece todos os dias e pode apresentar uma ou mais reações físicas como boca seca, taquicardia, sudorese excessiva, tensão muscular, tremores, tonturas e dor de cabeça, frutos de um desequilíbrio nas funções internas. Adolescentes estão excitados e são excitáveis facilmente. Há hormônios demais em questão, o que pode acarretar o estímulo excessivo da noradrenalina, neurotransmissor produzido nas glândulas suprarrenais (localizadas nos rins), cerúleo e núcleo amigdaloide cerebral. E ele realmente fica à mercê de uma genética (programada) e um meio ambiente (adquirido) e sem controle.

Tal ansiedade gera dificuldades de rendimento cerebral, principalmente das funções cognitivas, na forma de esquecimentos e dificuldade de concentração. Temos que lembrar com calma: adolescentes tem pouco tempo de vida informativa e emocional, mas tem problemas, muitos problemas e quase sempre relacionados às indecisões, às desinformações, às incertezas e às exigências excessivas externas. É preciso ter cuidado e, principalmente, entender, reconhecer e trabalhar estas memórias tão complexas.

Como as questões de trabalho (mercado de trabalho) ainda não estão definidas, a maioria dos problemas é emocional. Sem equilíbrio emocional, tudo tem cores exageradas na adolescência, afinal procuram afirmação para e no grupo. Entre estudar sujeito e predicado para a prova final; e reconquistar a namorada que está com outro cara da sala ao lado, o que acham que os preocupam mais? Adultos entendem (não sabem) o que é prioridade e autoestima; mas adolescentes? Eles querem tudo e um pouco mais para suprir rápido seus desconfortos. Eles querem se integrar, tem objetivos, mas não tem estratégias e nem recursos saudáveis, em sua maioria, para realizar.

A ansiedade vai gerar confusão mental e ineficiência de ação; logo eles não serão coerentes em seus argumentos e atitudes; e privilegiarão o momento, o grito e o uso exacerbado do palavrão (palavras de baixo calão). A ansiedade gera resposta imediata em que o córtex pré-frontal tem pouca participação, num primeiro momento. O contexto corporal fica desorganizado e há uma reação em cadeia: fala acelerada, parte para briga, bate nas coisas, grita muito: ele SE prejudica e não consegue parar.

Nos dias seguintes temos que ter atenção, segundo estudiosos, porque podem surgir problemas cardiovasculares e gastrointestinais; problemas no sistema imunológico; e algumas inflamações e infecções. Caso não haja interferência nesse processo (familiar, pedagógica, médica), estes são pontos de origem para algumas fobias, síndrome do pânico, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), transtorno de ansiedade e estresse pós-traumático. E se todos se misturam, temos o transtorno de ansiedade generalizada (TAG).

Importante salientar, por exemplo, que, na educação infantil, é possível reconhecer um ansioso, já que os sintomas se manifestam desde cedo, sendo uma criança agitada, às vezes hiperativa, que tem dificuldades para dormir e que chora com facilidade. De outra forma, é válido ressaltar que a exposição de uma criança a um ambiente problemático, em que ela se sinta insegura, pode gerar ansiedade mesmo em quem não apresente qualquer tipo de predisposição. E como a escola é o segundo momento em que a criança interage, o contexto familiar pode ser tão perigoso quanto o DNA, ou mesmo o nosso ritmo moderno atual.

Adolescentes são sociais e estão em frente às questões pedagógicas todos os dias por isso é importante pensar formas de aprender e sobre suas emoções; por isso é importante conhecer o adolescente, talvez oportunizando práticas diferentes e proativas que possibilitem certa exposição de suas formas de pensar o mundo, seus sonhos neste mundo e a si mesmo neste mundo.

Professores de adolescentes tratam, antes de tudo, com emoções já pontuadas na inserção social. Emoções em sobrecarga numa sociedade competitiva e exigente. Emoções que desconhecem limites ou a possibilidade de mudança de hábitos. Emoções em processo de amadurecimento e que, por isso se apresentam inadequadas: pelo excesso ou pela total indiferença.

Nós, professores, temos opções para amenizar essas sobrecargas e estes comportamentos, mesmo reconhecendo a participação do contexto externo? Sim, temos. Sugestões:
ð  Atividades de produção em grupo;
ð  Ações de construção de propostas sociais (doações, solidariedade);
ð  Dinâmicas de grupo voltadas à autoestima, ao corpo e à relação interpessoal;
ð  Avaliações através de manifestações (pintar, escrever, desenhar, criar vídeos);
ð  Aconselhamento esporádico da orientação pedagógica;
ð  Sugestões de outras atividades à / com a família;
ð  Visitas pedagógicas de tempos em tempos;
ð  Momentos simplesmente lúdicos (jogos e brincadeiras);
ð  Discussões temáticas orais (seminários, apresentações);
ð  Indicação de alimentação;
ð  Palestras motivacionais com pouco controle da expressão de pensamento;
ð  Utilização pedagógica de certas mídias;
ð  Demonstrações de afinidade e reconhecimento constante.

Por fim, atenção, em todo processo, feedbacks são fundamentais. Adolescentes precisam de limites reconhecidos. Ou seja, eles precisam reconhecer por onde e como caminham em relação à própria aprendizagem em sua área de saber.

Prof.ª Claudia Nunes



OS GRITOS DA SALA DE AULA

Como diminuir os comportamentos indisciplinados? Como um professor pode estimular mudanças nessas emoções indisciplinadas e, por conseguinte, nos comportamentos para aprendizagem? Parando de gritar! Professor, pare de gritar!

Nós podemos ser impositivos olhando nos olhos e tendo calma na fala. A questão do tom da voz é muito importante. Pense: será que grito resolve? Grito mudaria seu comportamento, professor? Para o aprendente, em meio aos colegas, o grito é chocante e humilhante; e, provavelmente estabelece links com sua memória afetiva mais negativa; e, ai surgirá reação impulsiva também negativa ou a interrupção dos processos de aprender. Primeiras atitudes do aluno: susto, silêncio, estranhamento e uma decisão ‘tô fora desse professor!’. E, dependendo do aluno, no momento seguinte, haverá CONFRONTO, nunca CONFLITO. Eis a indisciplina...

Em sala, professor, regras estabelecidas devem ser cumpridas. Importante um nível de flexibilidade? Com certeza. Mas deve-se esclarecer o porquê das mudanças e procurar não repeti-las. Depois de certo tempo, exemplo e rotina, o aluno, que gosta de arrumar confusão, perceberá sua insensatez, sentir-se-á como um ‘peixe fora d’água’, pensará duas vezes antes de agir negativamente e, em médio prazo, poderá colaborar com a aula com mais prazer, mais do que atenção. Professor, mudança de comportamento tem relação direta com a aprendizagem, mas ela começa em você. Gritar não adianta...



Professor, talvez algumas sugestões lhes sejam interessantes: temos que mudar o foco das atenções incluindo, por exemplo, o movimento do corpo em sala de aula. No movimento do corpo, é possível que os gritos da memória afetiva se enfraqueçam; que, na corrente sanguínea, seja introjetado um conjunto neuroquímico diferente e renovador; que a sensação de bem-estar e tranquilidade ganhe primazia; e que os alunos permaneçam ativos, só que agora positivamente. Eles têm vontade de participar, discutir, questionar, colaborar, se solidarizar, tornarem-se proativos, autônomos e, enfim aprender; só que gritos, muito relacionados ao medo de perder a autoridade ou sensação de impotência, minimamente danificam a autoestima; esvaziam a possibilidade de confiança; e, por fim ‘alimentam’ o descontrole emocional. Como aprender assim?

Depois da primeira semana de aula, professor, vamos pensar diferente e de acordo com Alberca (2015), vamos pensar que “a atenção é a capacidade que o cérebro tem de dirigir a sua atividade para algo concreto de forma voluntária; logo, a atenção é um estado afetivo” (p.101); e, por conseguinte, vamos pensar que, “na realidade, a distração não é mais do que a fixação da atenção em outra coisa” (p.103); ou seja, “a dificuldade de aprender deve-se, com frequência, a uma incapacidade para fixar a atenção, o que não vem incorporado no corpo humano, mas é adquirido” (p.104). Será que parte dos problemas de aprendizagem foi adquirida pela vivencia dos gritos familiares e sua reprodução pelos professores?

Sem querer eu descobri: os gritos do mundo fundamentam fortemente as dificuldades de aprendizagem e distraíram os caminhos da inteligência. Por causa dos inúmeros e diferentes gritos travaram-se os procedimentos das emoções / dos afetos, e criaram-se pensamentos quase unânimes: ‘não sou capaz’; ‘não adianta’; ‘sempre tive essa dificuldade’; ‘sou igual ao meu irmão’. Pelo que observei, os alunos perderam a consciência de suas potencialidades intelectuais e emocionais. Eles foram moldados pelos tantos gritos ‘afetivos’ e a eles recorrem quando pensam em se integrar ou precisam escapar de situações de emoções intensas.

E foi isso que percebi, ao final da primeira semana de aula, diante de avaliações diagnósticas, no Ensino Médio, turno da noite, de uma escola pública, localizada no subúrbio do Rio de Janeiro, através de discussões e jogos temáticos. Os gritos adquiridos embotaram suas inteligências com muitos NÃOS e, por estes, eles vem se adaptando, se desenvolvendo e sobrevivendo solitariamente.

Para a semana seguinte e a partir da análise das avaliações diagnósticas, pensei em algumas alternativas para que estes gritos comecem a ser esquecidos:
ð  ao apresentar uma atividade, dê tempo para que a realizem, ainda que, no processo, haja papo paralelo, afinal o coletivo é importante nesse período (não incomode o brainstorm);
ð  com tempo para realizar a atividade, medie os grupos e suas ideias, afinal eles são proativos e, com certeza, pensarão em outras formas de realiza-la (saiba gerenciar a si e aos grupos com tranquilidade e escuta sensível);
ð  enquanto realizam a atividade, ofereça o maior numero de informações possíveis e abra espaço para pesquisa online (alunos do Ensino Médio adoram seus celulares) sem tantas restrições (introduza informações novas sempre que for necessário utilizando múltiplos recursos);
ð  não trave os movimentos do corpo, saiba que muitos alunos precisam do movimento para realizarem suas tarefas sem tantas dificuldades (compreenda que o movimento serve para ‘esfriar a cabeça’ e eliminar o cansaço mental);
ð  mesmo em meio à atividade, crie momentos lúdicos em que o aluno fale de si (adolescentes adoram isso) sem medos ou mentiras (crie espaços de aproximação e de crescimento da confiança mútua);
ð  entenda que todos têm formas de concentração diferentes (transforme a distração comum em algo proveitoso e de sucesso);
ð  estabeleça momentos de discussão cuja avaliação dependa da participação e do comportamento, mas lembre-se: fora do padrão é outra forma de padrão (seja flexível com as formas de se apresentar, falar, ouvir, avaliar);
ð  sempre que puder, quebre a rotina das aulas criando momentos mais significativos, e as melhores opções podem acontecer nos projetos de ensino;
ð  e, por último, e não menos importante, dialogue, pergunte, divida ideias (esteja disponível mesmo fora do seu tempo de aula).

No meu Ensino Médio, os gritos formataram um silencio comportamental e este vem determinando a perda da curiosidade. A questão atitudinal adolescente está presa no que conhecem / vivem. Se não há a curiosidade, não há possibilidade de superação, não há o olhar ‘para além’ e nem encontro com outras realidades. Os alunos equilibram suas emoções nos exemplos que têm (gritos, castigos, críticas constantes) e no que a vida lhes apresenta todos os dias. É sobrevivência de qualquer jeito e uma sequencia de ações ‘tapa buracos’, reflexos de uma sociedade sem prioridades, novidades, estímulos e/ou atenção em relação às novas gerações. E aos ‘trancos e barrancos’, eles vão vivendo.
Professor, a experiência do grito desilude, inclui indiferença e constrói corpos sem textura afetiva. E sendo assim, a aprendizagem não tem cores, caminhos e/ou sentidos. Os tempos da juventude não podem ser optimizados na vida adulta como fazemos ou fazíamos em nossos computadores. Maus exemplos e problemas de conduta são aliados às chamadas indisciplinas; e estas tanto surgem dos gritos, quanto constroem gritos que interferem, basicamente, na aprendizagem e, pasmem, no poder de resiliência futura.
Professor, atenção a isso. Para provocar atenção, tenha atenção aos seus gritos internos e tão presentes nos comportamentos de seus alunos adolescentes.

Profa Claudia Nunes


APRENDIZAGEM e seus POSSÍVEIS ADJACENTES

Estamos em um tempo em que o pensamento sempre se volta para um conceito / atitude: aprendizagem, resultado final de imersões variadas, contínuas e complexas em um número infinito de informações cujo foco favorece a mudança dos comportamentos cognitivo, afetivo e físico.
No território da educação, isto é uma constante. E por isso, de tempos em tempos, surgem ideias compreendidas como inovadoras, principalmente, das práticas de ensino (metodologias). Porém uma pergunta sempre surge: como estimular a vontade de aprender, mesmo em situações de vulnerabilidade?; ou, em ambientes violentos?; ou, ainda, em mentes com baixa autoestima? Superficialmente podemos responder: difícil diante da crise social e econômica do país; difícil diante da rápida desvalorização da profissão docente; difícil diante da falta de perspectiva real observada na mentalidade dos discentes inseridos em comunidades, às vezes, de precariedades extremas. E de tão difícil, repensamos o conceito de ‘líquido’[1] trazido por Baumann. E de tão difícil, voltamo-nos para a biologia do cérebro e sua complexidade neuronal.
Toda forma de pensar é representativa do conjunto de memórias genética e social que o cérebro assimila enquanto vivo. E justamente a memória social (aquela que compõe a inteligência / a ‘ecologia coletiva’ trabalhada por Pierre Levy) parece ser a fonte de uma intensa (e, às vezes, inconsciente) adaptação das potencialidades inatas aos sujeitos de maneira positiva ou negativa na relação com o cotidiano. Essa adaptação, por sua vez, torna-se ponto nevrálgico em que, no processo maturacional, se amalgama as aprendizagens.
Entendemos que ‘aprender’ é libertar das amarras; é inaugurar links para a imaginação e a criatividade, ainda que se utilizem ferramentas cognitivas comuns; e é desenvolvida por atitudes inovadoras que proponham, segundo Johnson (2011, p.41) “centelhas, lampejos, sopros, iluminações, estalos em nossa mente”.
Para aprender é preciso desatenção das rotinas cognitivas e reorganização das redes de neurônios, “uns em sincronia com os outros, pela primeira vez, em nosso cérebro” (p.41). Para o senso comum, então, à aprendizagem é necessário sair da rotina emocional, e assim “explorar o possível adjacente de conexões que possam ser estabelecidas em nossa mente” (p.41). O outro é fundamental: somos sociais sempre.
Nas aprendizagens cotidianas e escolares, há um enxame de iluminações “capazes de estabelecer conexões complexas uns com os outros” (p.42). Os estudantes têm expectativas. Mesmo àqueles que demonstram comportamentos disfuncionais, as expectativas de estar diante de algo diferente e aprender, permanece; logo, é importante que repensemos (nós, os professores) nossas maneiras de apresentar os conteúdos e, assim, fortalecer a rede de aprendizagem necessária à liberação, por exemplo, da imaginação e da autonomia; e mesmo, necessária ao desenvolvimento qualitativo de funções executivas[2].
Ainda que saibamos que o cérebro é plástico, a qualidade desta neuroplasticidade exige que estimulemos, com frequência e intensidade, novas configurações às redes de neurônios com metodologias / práticas desafiantes, contextuais, proativas e libertárias. “Uma rede densa que não consegue formar novos padrões é, por definição, incapaz de mudar, de investigar nas bordas do possível adjacente” (p.42).
Práticas pedagógicas com recursos inovadores ou renovados trazem a ‘sensação de novidade que torna a experiência [de aprender] tão mágica’, além de inaugurar novas correspondências nas células do cérebro, trazendo a percepção de que, por exemplo, os sonhos mais guardados tem real possibilidade de serem realizados.
Práticas pedagógicas envolvendo diferentes tecnologias / técnicas, variadas manifestações artísticas e outros movimentos de corpo recriam “um conjunto inteiramente novo de neurônios” (2011, p.42) cujo processamento transforma a ação dos sentidos junto à realidade e, por consequência, afetos, cognições e atitudes: comportamentos em geral de um ser afetado integralmente pelo novo. Para Johnson, “as conexões são a chave da sabedoria (...) logo o que importa em nossa mente não é só o número de neurônios, mas a miríade de conexões que se formam entre elas”, quando diante de atividades diferenciadas, desafiantes e significativas (p.42).
Nós, professores, devemos criar uma rotina de mudanças pedagógicas tendo em vista que estaremos sempre diante de mentalidades diferentes; são outros conjuntos de neurônios, eletroquimicamente, ativos e ávidos por se experimentar e se experienciar, nas diferentes configurações de realidade a que tiverem a chance de imergir.
Só que Johnson (2011) nos pergunta: “como impelir estes cérebros para redes mais criativas”; no caso da escola, mais equilibradas e atencionais; e, ainda, no caso da sociedade, mais producentes e funcionais?
Uma primeira resposta, segundo Johnson (2011, p.43) seria “maravilhosamente fractal: para tornar nossa mente mais inovadora, temos que inseri-la em ambientes que compartilhem daquele mesmo tipo característico de rede; isto é, em rede de ideias ou pessoas que imitem as redes neurais de uma mente que explora os limites do possível adjacente”.
Outra resposta pode estabelecer-se na introdução da percepção de que a atividade pedagógica oferecida é uma aventura, uma competição regrada, um jogo, com necessidade de associações (grupo), a partir de / através da realidade (informações conhecidas), de forma a se criar / desenvolver soluções/ resultados possíveis.
Como todos os alunos são capazes de aprender, todos são potencialmente capazes de criar novas conexões, de serem geradores de novas relações e de reorganizarem o ambiente escolar realçando suas formas de pensar / agir / sentir, se a eles forem liberadas ferramentas cognitivas coerentes, ou seja, se puderem ‘manejar’ seus ‘aprenderes’ em colaboração com as informações escolares, a partir:
ð  do aprender a partir de;
ð  do aprender acerca de;
ð  do aprender através de;
ð  e, principalmente, do aprender com[3].

Há uma energia armazenada e pronta para ‘acontecer’ e fertilizar nossa sala de aula de inovação, criatividade e afeto. De acordo com Johnson (2011, p.45/46), esta é a reflexão do “poder combinatório do átomo de carbono”. Mas, atenção professor: ‘sem um meio que lhe permita [o aluno] colidir ao acaso com outros elementos, suas capacidades conectivas serão provavelmente desperdiçadas’. Ou seja, o desafio, a proatividade e a colaboração são mesmo as chaves mais interessantes para o desenvolvimento da aprendizagem porque são chaves ‘atitudinais’ que trazem a surpresa da possibilidade de SER diferente para o cenário da mente discente e da dinâmica da sala de aula.
Será que videoclipes de hip-hop podem ser introduzidos para ensinarmos elementos da comunicação, figuras de linguagem ou gêneros textuais? Será que dinâmicas de grupo podem ser recursos didáticos em que se vivenciem características literárias, raciocínio lógico, expressão corporal e assim introduzir o equilíbrio emocional? Será que jogos, como damas, bingo, xadrez, ou de memória podem favorecer mudanças de comportamento ou o entendimento de conteúdos de física, matemática e até geografia? Será que passeios pela comunidade ou pela própria escola podem se justificar através de relatórios, maquetes, pinturas, desenhos, murais imagéticos, o aprendizado de história, artes, língua portuguesa? Será que a criação de vídeos temáticos pode ajudar nos conteúdos de química, interpretação de texto, lógica, leitura? Será que não fazer nada, só ouvir música e conversar, ou meditar e aprender a respirar, vez por outra, é tão improdutivo assim? Vamos nos repensar, professor, o mundo mudou seriamente e seus alunos tem outro movimento de realidade em seus sentidos.

‘Quando voltamos nossos olhos para o mecanismo original de inovação na Terra, encontramos duas propriedades essenciais. Primeiro, uma capacidade de estabelecer novas conexões com o maior número possível de outros elementos. Segundo, um ambiente ‘randomizante’, que estimula colisões entre todos os elementos do sistema’ (JOHNSON, 2011, p.46).

Essa citação nos faz pensar o seguinte: em sala de aula, há cérebros solventes e fluidos se reorganizando sempre por combinação de estímulos e os selecionando em conexões de interesses, e estes mudam de acordo com as faixas etárias (adaptações estáveis) e a vivência de outros estímulos (necessidades e desejos). Nós, professores, somos responsáveis, então por esta organização e auto-organização quando respeitamos as formas de aprender, entendemos um pouco sobre o sistema nervoso humano e, a partir disso, requalificamos nossas práticas.
Metaforicamente e, como o cientista da computação Christopher Langton (apud JOHNSON, 2011, p.47) afirma, para descrever a qualidade dessa prática, pense no comportamento de moléculas em cada um dos três estados da matéria: gasoso, líquido e sólido:


Fator científico
Fator educacional
Na forma de gás
O caos impera; novas configurações são possíveis, mas a todo instante são rompidas e despedaçadas pela natureza volátil do ambiente.
Na sala de aula: indisciplina, desinteresse, baixa autoestima, falta de afeto, desrespeito entre os atores educacionais etc.
Na forma sólida
Acontece o contrário: os padrões têm estabilidade, mas são incapazes de mudanças.
Na escola: práticas engessadas, repetição de práticas de sucesso, estigmatizações, grande burocracia, falta de flexibilidade, manutenção dos paradigmas tradicionais etc.
Na forma líquida
Cria-se um ambiente mais promissor para o sistema explorar o possível adjacente. Novas configurações podem emergir por meio de conexões aleatórias formadas entre as moléculas, mas o sistema não é tão instável a ponto de destruir num instante as próprias criações.
Na sala de aula e na escola: mais independência, autonomia, prazer, colaboração, compreensão, diálogo, afeto, respeito, integração entre todos.


A questão do conceito do ‘liquido’ tem uma versão positiva quando empreendemos densidade às células glias, à bainha de mielina, às redes neuronais ilustrando o ambiente escolar com imagens e movimentos significativos para os estudantes e fortalecemos as interconexões para a exploração de novos padrões em consonância com a preservação das “estruturas úteis por longos períodos de tempo” (p.47). Não fugiremos da construção de padrões, mas precisamos vivenciar novidades para recriar ou reintroduzir novos sentidos / movimentos às nossas memórias de procedimento e de longa duração.

Profa Claudia Nunes

Referencia:
JOHNSON, Steven. Rede líquida. In. De onde vêm as boas ideias. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p.41-59.





[1] Bauman apresenta o conceito de ‘modernidade líquida’ como volátil, incerta e insegura; acreditamos que, por isso mesmo, as potencialidades aprendentes possam ser provocadas à ascensão no real como comportamentos cognitivos mais criativos e flexíveis quando se deparam com ensinagens significativas. É o princípio da neuroplasticidade, processo constante de adaptação do sistema nervoso; e da criação da memória de longo prazo.
[2] Habilidades cognitivas que nos permitem controlar e regular nossos pensamentos, nossas emoções e nossas ações diante dos conflitos ou das distrações. Estas habilidades estão concentradas em três grandes panoramas: autocontrole, memória de trabalho e flexibilidade cognitiva. Fonte: www.enciclopedia-crianca.com/funcoes-executivas
[3] Ferramentas cognitivas ou mindtools são todas as tecnologias ou aplicações que, numa perspectiva construtivista da aprendizagem, facilitam o pensamento crítico, permitem uma aprendizagem significativa e envolvem ativamente os alunos: na construção do conhecimento, na conversação, na atitude, na colaboração e na reflexão. Fonte: http://ferramentascognitivas.blogspot.com.br/2002_09_22_archive.html

Nada nunca é igual

  Nada nunca é igual   Enquanto os dias passam, eu reflito: nada nunca é igual. Não existe repetição. Não precisa haver morte ou decepçã...