sexta-feira, 30 de março de 2012

LONGO APRENDIZADO

NICOLAS CARR, um escritor contra a Internet e as redes sociais


Em geral, o surgimento de uma tecnologia provoca também o aparecimento de grupos antagônicos, que em relação a ela se dividem em entusiastas e céticos. Foi assim com o rádio e com a TV. O mesmo aconteceu com a internet e, em tempos mais recentes, com as redes sociais. O escritor Nicholas Carr é um dos líderes dos céticos. Aos 53 anos, o americano, mestre em literatura pela Universidade de Harvard, afirma que as características mais brilhantes da internet podem cegar (no sentido figurado, é claro) seus usuários. Segundo ele, a miríade de conteúdos oferecidos na web termina por minar o poder do usuário de se concentrar em qualquer um deles. O saldo, portanto, é zero, na visão de Carr. As ideias foram parar em um livro, A Geração Superficial – O que a Internet Está Fazendo com os Nossos Cérebros (Agir, 384 p.), que combina análise da tecnologia com descobertas da neurociência. O livro foi malhado no exterior, mas a discussão suscitada pelo autor merece lugar.

Na entrevista ao site de VEJA reproduzida a seguir, o autor reconhece os benefícios provenientes da web, mas volta a atacar: diz que o Google é o motor da desconcentração na web  “O negócio deles é vender distração”  e promete manter-se como um dos poucos americanos a ficar fora das redes sociais: “Não pretendo reativar meus perfis no Twitter e Facebook.” Confira.

Quando o senhor suspeitou que a internet começou a alterar seu comportamento?
Em 2007, quando comecei a ler um livro, percebi que perdia paulatinamente minha capacidade de concentração ao pausar a leitura para visitar sites na internet. Vi que estava treinando meu cérebro para receber estímulos constantes, com um bombardeio de informações em tempo real. Como consequência, não tinha condições de me envolver em tarefas que demandam mais atenção fora do computador, o que me inspirou a escrever um artigo e, posteriormente, um livro sobre como as tecnologias influenciam o pensamento humano. A internet, assim como outras tecnologias já criadas, limita o pensamento.

Se a internet nos deixa menos concentrados, qual foi a estratégia para escrever o livro – que, afinal, demanda concentração? 
Simplesmente mudei meus hábitos virtuais. Durante a produção da obra, acessava e-mails e sites de buscas, mas apenas os usei como ferramentas que me auxiliariam nos argumentos para a criação do livro. A maioria dos conteúdos descritos na obra foi retirada de livros, artigos e outros documentos em papel.

Durante a produção do livro, o senhor excluiu seus perfis no Twitter e Facebook. Eles já foram reativados?
Não reativei e nem pretendo fazer isso. Twitter e Facebook são duas plataformas atraentes e úteis às pessoas conectadas, mas não sinto falta delas. É importante que seus usuários saibam que há um custo ao se tornar membro desses serviços, relacionados não só ao estado de distração e fragmentação de atenção, mas à falta de privacidade que essas plataformas provocam.

O senhor teve vontade de inserir em seu livro algum recurso tecnológico, como links? 
Jamais! Acredito que os links distribuídos em uma obra desencorajariam uma leitura mais profunda a respeito do tema. Há uma seção no meu livro que dedico exclusivamente às trocas de diálogos entre urls, que tendem a reduzir a compreensão de um conteúdo. O link é um inimigo da concentração.

Qual é seu objetivo ao discutir os problemas da internet? 
Quero discutir os perigos do uso intenso da internet e incentivar uma visão mais cética sobre a tecnologia. Ela nos trouxe – e traz, até hoje – praticidade e ajudou a mudar muita coisa no mundo, mas, como escritor, acredito que devo questionar a tecnologia. Sei que é difícil lidar com essa situação, uma vez que a internet está profundamente ligada às rotinas de trabalho e relacionamento das pessoas, mas trata-se sobretudo de uma pequena colaboração para promover a discussão.

Qual é sua opinião a respeito do Facebook? 
Eu desconfio do Facebook. O interesse da empresa reside em transformar usuários em objetos que possam ser vendidos, posteriormente, aos anunciantes. Não acredito que essa rede social seja algo saudável e espero que as pessoas comecem a pensar duas vezes ao usar o serviço.

E o Google? 
Eu acredito que a internet esteja nos deixando superficiais e o Google ajuda substancialmente a construir parte desse ecossistema. O gigante de buscas pretende aperfeiçoar a eficiência de nossos pensamentos, transformando sentimento em conteúdos valiosos para uma máquina. O Google vende distração.

Por que o senhor considera o Google+, a rede social do Google, tão chato? 
Bem, não tem muita coisa acontecendo lá, não é? Muitas pessoas se inscreveram, mas poucas passam algum tempo no site. A rede tende a ser dominada por entusiastas de tecnologia.

O que o senhor aconselharia a quem quer começar a escrever: blog, Twitter? 
Comecei a escrever antes de a web ser criada. Então, é realmente difícil dar uma receita aos novos usuários. Eu tenho um blog desde 2005 e desfruto da liberdade que ele me dá como escritor, mas já antecipo: é praticamente impossível ganhar a vida como um blogueiro, a menos que você tenha muita sorte.

Apesar das críticas que faz a internet, o senhor não concorda que a web tem ampliado o acesso ao conhecimento? 
Sem dúvida. A internet reduziu as fronteiras que separam pessoas das informações. Assim como tecnologias anteriores, ela amplifica o conhecimento, mas sacrifica outras coisas importantes. Compreender um assunto requer pensar profundamente sobre fatos e experiências e realizar conexões entre eles. Eu acredito que a web desencoraja esse tipo de construção do conhecimento, mas são evidentes os benefícios que ela nos traz.

domingo, 25 de março de 2012

TEMPO DE 'CAUSAR'

‘Um homem sem memória é um homem sem história’, logo vamos resguardar nossos melhores contadores de histórias e marcadores de experiências – nossos professores (Nunes)

Hoje em dia, vira e mexe, esquecemos alguma coisa. A velocidade da vida diária e nossa constante mobilidade tornaram nosso cérebro refém dos desejos e ações externas. Sem notar, mas com algumas dores, nossa biologia está alterada. Em pleno vigor, nosso cérebro e corpo tentam se adaptar, assimilar e responder às nossas (intencionais ou não) solicitações, mas, vira e mexe, estão vencidos. E vencidos, falham, rateiam, entram em disfunção e nos desequilibram: hoje, acredito, estamos em desequilíbrio eletroquímico e cheios dos mais variados mecanismos de defesa.

Uma de nossas maiores preocupações é a percepção de que a falha de memória está se tornando ‘natural’ demais. Num mundo em velocidade acelerada, a falha de memória é assustadora. Não me refiro às razões patológicas ou da chegada da velhice, isso realmente é natural; refiro-me à velocidade das informações, à crescente necessidade de se ‘saber e fazer de tudo’ um pouco, ao stress da vida moderna em que há mais cortisol do que serotonina (mais desprazer do que prazer) etc. Estamos eletrizando demais nossas conexões neurais e criando ‘brancos’ enormes no cérebro. Vivemos então desconfortáveis de nossos esquecimentos.

Esquecemos a chave de casa, procuramos os óculos que estão em nossa cabeça, ‘perdemos’ o carro num estacionamento ou supermercado, deixamos objetos importantes em diferentes lugares, esquecemos palavras comuns, enfim: somos reflexo da vida moderna e nossos neurônios de associação vão ficando desvairados, senão esgotados completamente. Então estes esquecimentos, quando constantes, requerem atenção, muita atenção, pois prejudicarão, em médio prazo, nossas diferentes relações e causarão, senão dificuldades, transtornos às nossos comportamentos cognitivos e relacionais. É preciso ter muita atenção a isso!

Em nosso cotidiano veloz, entre ter atenção e compreensão, e realizar armazenamento e resgate (processo de construção do conhecimento e da memória) de informações, é cada vez mais real a presença do estresse, do pouco sono, da má alimentação e, lógico, da má gestão das relações pessoais com o dia a dia. Se assim o é, como fica, por exemplo, o ambiente escolar? Como ficam aprendentes e ensinantes em meio ao processo de construção da memória de longo prazo? Só a afetividade basta para emocionar o cérebro e mantê-lo aprendendo? Bom eu não sei, mas, de ‘prima’, digo: na escola, essa falta de atenção, qualquer falta de atenção é mais (muito) perigosa.

Quando adolescentes, os sujeitos estão confusos, se transformando rápido, tensos de futuro, além de extremamente sociais e autoafirmativos. Suas expectativas estão fixadas no tempo presente. Conquistas, sucessos, amores, dinheiro, sustentabilidade estão na ordem ‘do agora’ e suas relações envolvem estas necessidades e interesses. Seus cérebros estão assimilando informações dentro dessas afinidades, e, em contraponto, é forte e imprescindível a necessidade de autoafirmação, quer por desejo presente, quer por objetivos futuros: o tempo todo isso os retroalimenta.

Embora se imaginem (se projetem) no tempo como grandes conquistadores (médicos famosos, engenheiros famosos, empresários famosos, DJs famosos, artistas famosos, cantores famosos etc.), sua ambiência escolar atual está coagulada, com mielinização rala e sem ‘cola’ em diferentes áreas do saber oferecidas a eles como possibilidade curricular de realizar seus imaginários. E ai: desatenção, indisciplina, violência ou indiferença. Alertas, aqui, à sensação de falta de integração dos alunos ao processo de ensino sempre igual. Então por onde começar? O que fazer?

Particularmente, eu aceito a perspectiva do tempo. É o tempo que nos separa e diferencia. Tempo de vida. Tempo das gerações. Tempo de expectativa. Tempo de formação. Tempo dos desejos. Tempo, tempo, tempo. Sem pensar nisso, é difícil pensar em transformações ou, ao menos, nos porquês das transformações e renovações das práticas e necessidades de um e de outro ator educacional. Afinal, todos precisam de todos.

Nosso sistema nervoso (ensino) entrará em colapso sem o sistema endócrino (aprendizagem) porque estão/estamos perdendo afinidades. Sinapses (aprendizagem) só tem qualidade quando se realizam por afinidade e demandam a participação de todas as nossas memórias mais proteicas e oxigenadas. Então se há forte divisão entre as expectativas estudantis e as propostas pedagógicas e didáticas, o jeito é ‘causar’. Ou seja, é preciso irritar as células e criar formas de condutibilidade das informações no cérebro; é preciso dar sentido, significância, ‘marcar’, ‘surpreender’, ‘desafiar’, ‘chamar a atenção’ e acelerar o movimento sanguíneo e a respiração com força. Porém, atenção, para além da percepção de que as práticas pedagógicas e didáticas precisam de renovação e mais sinergia com o mundo estudantil e tecnológico atual, há a séria necessidade de reformatação da formação dos docentes dentro dessa modernidade toda.

Tal e qual o cérebro, o professor está refém de um tempo em que se sente um estranho, um visitante, um imigrante, quando se vê no contexto da sala de aula. Sua memória cognitiva (formativa) também não encontra ‘cola’ em seu aprendizado teórico. Seus neurotransmissores entram ‘em parafuso’ por falta de informações afins anteriores. Ele se sente um corpo estranho. Mas, ainda assim, dizem, ele precisa se adequar para não desaparecer como tantas outras profissões. Será?

Como é preciso criar novos potenciais de ação (impulsos nervosos) para gerar atenção, curiosidade e questionamento discente, é preciso também potencializar a capacidade docente de estar atento ao novo tempo e seus novos alunos. Aqui ‘causar’ também é uma fonte rica de transformação e realização da ‘decantada’ qualidade docente para o século XXI. E ai, de novo, devemos ter atenção ao tempo: no período de formação, o cérebro do futuro docente, por ritmo e repetição, é crivado de teorias cuja base é o aluno ideal. Acontece uma constante plasticidade em torno da romântica idealização do ensino, da aprendizagem, da escola e de seu futuro aluno. Estranho, não?

Fora isso, em sala de aula, apresentam-se o tempo da reflexão (cognição docente) e o tempo da diversão bem mais tecnológica (cognição discente). E lidar com isso não tem perspectiva na universidade. É a primeira emoção negativa de um docente porque não basta reconhecer essa (ou aquela) realidade, é preciso ativar a memória de longo prazo ou mesmo o cerebelo (e suas memórias mais antigas), criar excitações neuronais e didáticas, para compreender e aprender as novas performances docentes exigidas com boa fluidez e criatividade. Como assim? Se no período formativo, os neurônios especializados tiveram outras tarefas, como exigir outras ações agora? Como recuperar uma memória que não se tem? Como recuperar informação que não se tem?

Bom, continuo pensando... Só sei que não há facilitadores, é trabalhar ou trabalhar; é se experimentar ou se experimentar. Muitos são os tipos de memória (visual, audiovisual, sinestésica e outros) e dependendo da área do saber, o docente pode privilegiar uma delas ao longo de seu trabalho, se tiver tempo e possibilidade de estudos. Senão, será uma proposta de reação instintiva mesmo. E isso tanto pode se oferecer como um momento excelente de ‘oxigenação do cérebro’ e atualização pedagógica; como também, pode ‘causar’ muitos problemas nos ensinos e nas aprendizagens (construção do conhecimento e de memórias de longo prazo).

Se tudo o que for possível estiver eliminado, a resposta está no impossível e daí sinceramente, é ser curioso e aprender a correr riscos. Se o mundo está em erupção social e educacional depois da forte entrada das tecnologias digitais e virtuais, novos caminhos precisam ser encontrados e os planos do curso educacional (re)traçados. Não se pode perder (esquecer) nada e/ou ninguém nos dias atuais, muito menos um professor. Atenção, muita atenção!

Profa Claudia Nunes

Nada nunca é igual

  Nada nunca é igual   Enquanto os dias passam, eu reflito: nada nunca é igual. Não existe repetição. Não precisa haver morte ou decepçã...