quarta-feira, 15 de outubro de 2008

A Hora da Estrela: Ms. Christie


“Tudo no mundo começou com um sim.”
Clarice Lispector – A Hora da Estrela

Semana cheia de altos e baixos. Comecei a ler “A Hora da Estrela”. Clarice Lispector ajuda a me entender e a entender as pessoas. Depois de algumas perdas, o dia-a-dia é de recomposição, revisão e continuar seguindo. Segundos os mais velhos, “fatos que independem de nossa vontade, resolvidos estão”. Então tudo certo. Os parâmetros mudam, não há controle sobre isso. Outros espaços e amigos são reencontrados. Depois de um momento tenso, muitas harmonias! O certo tem sido isso: perder um pouco do controle e correr o risco de experimentar, por exemplo, a novidade do tempo, de ter tempo. Aí torna-se importante à vida experimentar outras emoções, mesmo que não sejam nossas. Emoções “oxigenam a mente” e recarregam o corpo de novas energias e impulsos. Esta semana experimentei uma das maiores emoções da minha vida!

Vou contar: a mais de 06 anos a Instituto A Vez do Mestre, além da oportunidade de estudo e trabalho, meu deu grandes emoções: amigos. Lindos, inteligentes, reconhecidos, indomáveis e extremamente afetuosos. Alguns com uma vida acadêmica reconhecida em muitos setores e também em outras instituições; outros, muito mais focados na transformação da aprendizagem e do pensamento de seus alunos. E, para tal, oferecendo (como doação integral) o que têm de melhor de si em cada tempo, em cada dia, em cada gesto, em que as relações aconteciam. Para ambos, a idéia é provocar mudanças e superação sempre! Uma dessas figuras estelares chama-se CHRISTIE CAMPELO!

A cerca de dois anos, havia um limite para o trabalho dela: o mestrado. De diferentes formas, pairava no ar a sensação que este SER era “menos” porque havia uma “falha” acadêmica. Eu não conseguia entender. Por quê? Para que? Ela é perfeita! Ela é a luz para o qual devemos ir sempre! Em aula, ninguém era/ficava inútil, indiferente, ileso, igual. Eu tenho medo dela. Ela me atinge muito rápido, mas não desisto de olhar, de estar junto, de perceber o quanto eu ainda preciso crescer emocionalmente. Numa mesa do Paço Imperial, conversamos sobre inscrição do mestrado. Christie resistia: “para que isso? Já tentei e me decepcionei! Não preciso disso! Não me vejo capaz! Besteira!” Insisti, insisti e insisti. De repente um lampejo: “Terceira idade, ressentimento, riso e Nietzsche e Chaplin! – diz ela -, É isso que você quer? Escreve ai então: Terceira idade, ressentimento, riso e Nietzsche e Chaplin”. Nossa, como assim? Que tema é esse? Outra coisa: Christie e Nietzsche? Christie lê Nietzsche? Que susto! E que linda surpresa!

Os dias seguintes foram de pura pesquisa e profunda plasticidade cerebral. O projeto precisava estar pronto e entregue em menos de um mês! Cruzes! O computador da Christie queima, apaga. Outra pessoa bacana entra no circuito: Nadia Riche. Em muitas segundas-feiras, almoços e lanches, sua casa foi o espaço das discussões, das quase desistências, dos conflitos mais sérios, dos choros, das crises emocionais e da dor de escrever. Sim, Christie tem dor ao escrever! Ninguém ali tinha status ou posição: somos amigas de um SER que arriscava um grande passo e a gente... confiava. Burilar, burilar, burilar: ações eivadas de novas dores. Pior do que criar um texto é descartar partes dele em nome de qualquer coisa. Mas Christie demonstrava que a emoção com que trabalhava o tempo todo, também fazia parte do seu corpo e da sua mente. O que não dava para resolver, terapia!

Conosco e com muita terapia, último dia, inscrição feita, projeto aceito, provas muito bem realizadas, Christie é mestranda! Ufa! Lindo vê-la entrar na academia e... estonteá-los. Sim, sabíamos que haveria um diferencial naquela tradição. Literalmente Christie foi um divisor de águas. Parodiando Milton Nascimento: depois da Christie, “nada foi como antes”! No processo, ela fez o reconhecimento do ambiente, assumiu uma postura, sem perder em nada sua individualidade, e... surpreendeu! Desconstrução e reconstrução em todos/tudo: ações reais o tempo todo. Todos foram abatidos pelo furacão Christie! Sua qualificação foi um evento concorridíssimo: representação de Chaplin, participação interativa de sua turma da UNATI e de colegas de curso, participação dos alunos de diferentes instituições e anônimos, apresentação de vídeos das chanchadas etc. A banca? Em vertigem! Fazer o que? Falar o que? Decisão: apenas ponderar, ter cuidado, opinar na metodologia, aceitar a diversidade e... ser feliz! Sim, a banca estava feliz. Havia uma luz no fim do túnel do pensamento, das práticas pedagógicas, para o desenvolvimento de aprendizagem. Aplausos, aplausos e aplausos! Um dos sentidos do livro “A Hora da Estrela” de Clarice Lispector é verificar que, na vida, por diferentes maneiras, o ser humano deixa de ser invisível de formas impensáveis. Como Macabéa, Christie era a “retirante, uma mulher comum”, cheia de marcas profundas da vida, problemas de organização escrita, em busca de melhores condições profissionais, mas ao contrário de Macabéa, Christie sabe quem é, sem submissões, sem repressões e, em muitos momentos, capaz de impor-se frente a qualquer um. Ela não quer mais descobertas, estas ela entregou ao acaso das oportunidades e das emoções. Ela não se pergunta mais “quem sou eu?”, ela quer sentir “como sou eu?” e... ver no que dá! Não foi uma qualificação, foi uma badalação!

Muito tempo se passou. Acertos foram feitos: na dissertação, na escrita, nas relações, nas obrigações, nas vontades, nas terapias, nos chopps, nos almoços, nas certezas. Nós e outras pessoas importantes estávamos a postos a qualquer deslize ou esmorecimento. Christie como uma borboleta ia surgindo, se centrando, se podando, se revisitando, fazendo pequenos acordos com a vida e os amigos, ainda que mantendo a cor, o sorriso, o gesto farto e o abraço forte. Entre grandes impulsos e dolorosos “silêncios para ouvir os gritos da vida”[1], Christie destacou-se e soube se fazer respeitada pelas diferentes personalidades do “Memória Social”.

Ontem, 14/10/08, a defesa. Confesso que sai de casa emocionada. Nada é certo neste momento, mas sendo Christie quem é, ou optamos por viver todas as emoções imprevisíveis, ou é melhor nem aparecer. Defesa? Que nada! Christie, nervosa, apresentou sua escrita de forma oral e teatralmente, afinal seu “público-alvo” – a terceira idade da UNATI – compareceu em peso! Lindas e lindos! Super bem vestidos, perfumados e verdadeiros leões nietzschinianos! Christie chorou e nós também. De novo, vimos Chaplin e mais duas novidades: a representação das grandes divas do cinema (lindas senhoras se apresentando de forma sensual no palco) e Dalva de Oliveira em homenagem à Radio Nacional! Nossa, Dalva apareceu para agradecer a renovada lembrança que Christie provocou em sua produção e participação no curso. Christie chorou e nós muito mais. Ai o ritual acadêmico. Ritual? Que nada! Argüições se transformaram em grandes diálogos. Cada fala inicial da banca, a mesma premissa: “Christie, não tenho nada a lhe perguntar, tal a força da sua escrita e de sua transformação neste processo, então vamos conversar?” Convite à publicação, elogios, elogios e mais elogios. O orientador, dono de um poder de sedução imenso, afinal conseguiu manter Christie em certos limites durante dois anos e meio, estava orgulhoso de tudo! Nossa, que momento! Fala final: elogios, agradecimentos e... muito choro de todos. Nossa, a muito tempo eu não chorava tanto. Nada de tristeza, amargor; mas riso, alívio, alegria, energia, força, felicidade!

Christie é MESTRE! Diferença? Nenhuma!
Christie, PARABÉNS!!!!!



Claudia Nunes
Mestranda em Educação/UNIRIO
Espec. Tecnologia Educacional/IAVM

[1] Fala da personagem Macabéa em A Hora da Estrela – Clarice Lispector

3 comentários:

Anônimo disse...

Sendo que, a estrela reservada à sua amiga será mais brilhante, ou seja, de um futuro verdadeiramente esplendorosos.

Diferente da Macbéia...


Bjs, Silvia.

Anônimo disse...

Por um feliz acaso entrei nesta esquina virtual e levei um susto: a vida pulsava para além da tela! Sim, a vida pulsava e pulsa porque tive e tenho o enorme prazer de ter sido agraciada pela presença intensa da Cristie na minha vida. Acompanhei a gravidez de sua escrita de perto. As contrações seguidas de parto foram várias, cada frase era um filho forte que era trazido ao mundo. Filhos dionisíacos, nascidos, na maioria das vezes, em guardanapos,nos encontros em que tínhamos, nas esquinas do mundo do lado de cá. Líamos em cafés, bares. Ríamos e nos emocionávamos com a força que surgia dos encontros do mundo junto a escrita.
Cristie crescia cada vez mais. Cresciam juntos afetos novos. Cresciam juntas as linhas de sua escrita. E eu, acompanhante da sua metamorfose, crescia também.
No meio do caminho, muito trabalho, algumas dores e ao mesmo tempo e cada vez mais, a força desta mulher gritava por todos os seus póros.
Seu texto traz esta força. Traz todas as linhas que percorrem o corpo desta mulher. Linhas de afeto e poesia. Linhas da liberdade. Linhas da coragem de ser-com-os afetos. Linha da coragem de afirmar a diferença.
A academia se rendeu a Cristie. Não foi ela quem aprendeu, mas uma parte do univeso academico (UNIRIO) se dobrou diante de Cristie e recebeu um sopro de vida.

Anônimo disse...

Esqueci de assinar. Meu nome é Aline

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