sexta-feira, 31 de agosto de 2012

STANISLAS DEHAENE: "A neurociência deve ir à sala de aula!'


O cientista condena o construtivismo como método de alfabetização e diz como os estudos com cérebro podem ajudar disléxicos a ler

FLÁVIA YURI - Uma das tarefas comuns da ciência é desvendar a complexidade por trás de atividades aparentemente simples. O matemático e neurocientista francês Stanislas Dehaene dedica-se a decifrar as mudanças cerebrais causadas pelo ato de ler. Para ele, a leitura moldou o cérebro humano e preparou-o para assimilar habilidades impossíveis de ser aprendidas por iletrados. Em seu livro Os neurônios da leitura (Editora Penso, R$ 71), ele afirma que o conhecimento do impacto da leitura no cérebro pode melhorar métodos de alfabetização para crianças e dá exemplos de como esse conhecimento tem auxiliado pessoas com dislexia. E mais: Dehaene diz que a pedagogia do construtivismo, altamente disseminada no Brasil, pode ser ineficaz para o ensino da leitura.

NEURÔNIOS EM ATIVIDADE

O neurocientista Stanislas Dehaene em congresso na França. Há 20 anos, ele estuda o impacto dos números e das letras no cérebro (Foto: divulgação)

ÉPOCA – O que suas pesquisas sobre o impacto da leitura no cérebro revelaram?
Stanislas Dehaene – Constatamos que nosso cérebro aprendeu a ler a partir de uma reciclagem dos neurônios. Isso quer dizer que neurônios usados na leitura antes eram empregados em outro tipo de tarefa. Nosso cérebro de primata não teve tempo de amadurecer para aprender a ler. A leitura só foi possível porque conseguimos adaptar os símbolos a formas já conhecidas há milhares de anos. Diferentemente do que disse John Locke, nossa cabeça não é uma página em branco pronta para aprender qualquer tipo de coisa. Esse é um exemplo de como a cultura se adaptou às possibilidades de nossa mente. Concluímos que a leitura despertou em nosso cérebro a capacidade de perceber diferenças sutis e aumentou nossa capacidade de memorizar informações. É interessante observar que o cérebro mobiliza a mesma área para a leitura de qualquer idioma. O processamento da leitura do chinês ou do hebraico, da direita para a esquerda, acontece na mesma região que decodifica o inglês, o francês e o português.

ÉPOCA – O senhor disse que a leitura usou uma parte do cérebro antes destinada a outras funções. Que funções eram essas e o que aconteceu com elas?
Dehaene – Antes de aprendermos a ler, usávamos essa parte do cérebro para reconhecer formas de objetos e de rostos. Se você escanear o cérebro de pessoas que não leem e comparar com as alfabetizadas, a identificação de rostos para as iletradas mobiliza uma parte maior do cérebro que a mesma função nas alfabetizadas. Existe certa competição de competências na mesma região do cérebro. É como se ele tivesse de abrir espaço para a leitura.

ÉPOCA – Isso quer dizer, nesse exemplo, que o cérebro letrado passou a usar um número menor de neurônios para a mesma função? Isso tem impacto na qualidade da função?
Dehaene – Não temos provas científicas de que ocorra perda de competência. Um mesmo neurônio pode ter um número desconhecido de sinapses, de acordo com o estímulo do ambiente. Mas essa é uma suposição lógica. Afinal, temos de dividir um mesmo número de neurônios em várias atividades. Nosso grupo de pesquisas na Amazônia mostrou que o cérebro de pessoas que não leem tem habilidades relacionadas à noção espacial e de matemática muito avançadas. Não temos dados científicos que provem que eles sejam melhores nessas tarefas porque não leem. Mas essa é uma possibilidade.

ÉPOCA – De que forma suas descobertas podem auxiliar no processo de educação?
Dehaene – Verificamos, por meio de várias experiências, que o método mais eficaz de alfabetização é o que cha-mamos fônico. Ele parte do ensino das letras e da correspondência fonética de cada uma delas. Nossos estudos mostraram que a criança alfabetizada por esse método aprende a ler de forma mais rápida e eficiente. Os métodos de ensino que seguem o conceito de educação global, por outro lado, mostraram-se ineficazes. (No método global, a criança deve primeiro aprender o significado da palavra e, numa próxima etapa, os símbolos que a compõem.)
Jogos simples de leitura, de rimas e de troca de sons podem ajudar crianças com dislexia a ler

ÉPOCA – No Brasil, o construtivismo, que segue as premissas do método global para a alfabetização, é amplamente disseminado. Por que os sistemas que seguem o método global são ineficazes?
Dehaene – Verificamos em pesquisa com pessoas de diferentes idiomas que o aprendizado da linguagem se dá a partir da identificação da letra e do som correspondente. No português, a criança aprende primeiro a combinação de consoantes e vogais. A próxima etapa é entender a combinação entre duas consoantes e uma vogal, como o “vra” de palavra. Essa composição de formas, do menor para o maior, é feita no lado esquerdo do cérebro. Quando se usam metodologias para a alfabetização que seguem o método global, no qual a criança primeiro aprende o sentido da palavra, sem necessariamente conhecer os símbolos, o lado direito é ativado. Mas a deco-dificação dos símbolos terá de chegar ao lado esquerdo para que a leitura seja concluída. É um processo mais demorado, que segue na via contrária ao funcionamento do cérebro. Num certo sentido, podemos dizer que esse método ensina o lado errado primeiro. As crianças que aprendem a ler processando primeiro o lado esquerdo do cérebro estabelecem relações imediatas entre letras e seus sons, leem com mais facilidade e entendem mais rapidamente o significado do que estão lendo. Crianças com dislexia que começam a treinar o lado esquerdo do cérebro têm muito mais chances de superar a dificuldade no aprendizado da leitura.

ÉPOCA – É possível quantificar esse atraso de leitura que o senhor menciona?
Dehaene – Quanto mais próxima for a correspondência da letra com o som, mais fácil para um indivíduo automatizar a ação de ler. Português e italiano são idiomas muito transparentes, pois cada letra corresponde a um som. Inglês e francês são línguas em que a correspondência de sons pode variar bastante. Pesquisas mostram que, ao ter aulas regulares, todos os dias, na escola, a criança leva dois anos a mais para dominar o inglês que para dominar o italiano.

ÉPOCA – É possível identificar diferenças no cérebro de quem consegue ler palavras e frases, mas tem dificuldade na interpretação de textos (no Brasil, eles são conhecidos como analfabetos funcionais) em relação a alguém que lê e interpreta o conteúdo com fluência?
Dehaene – Não identificamos isso em pesquisa de imagens. Mas a dificuldade que algumas pessoas têm de interpre-tar o que leem ocorre basicamente porque elas ainda não automatizaram a decodificação das palavras. Decodificar pede esforço para quem não tem essa função bem desenvolvida. Isso mobiliza completamente a atenção e os es-forços de quem está lendo, a ponto de não conseguir se concentrar na mensagem. A solução para melhorar a in-terpretação de texto é automatizar a leitura. Por isso, é importante que crianças pequenas leiam de forma regular até que isso se torne uma rotina. As crianças começam a interpretar textos com eficiência depois que a leitura se torna um processo automatizado.

ÉPOCA – Aprender a ler partituras tem o mesmo efeito para o cérebro que ler palavras?
Dehaene – As áreas do cérebro usadas para ler letras não são exatamente as mesmas usadas para decodificar mú-sica. Não há muitos estudos sobre a parte cerebral usada no aprendizado de música. Mas há diversas pesquisas sobre o efeito da música na vida das crianças. Crianças que aprendem música desenvolvem habilidades escolares avançadas, especialmente no domínio da leitura. Elas têm mais facilidade para se concentrar. Aprender música aumenta os níveis de inteligência (Q.I.). Aprender música é uma forma excelente de desenvolver o cérebro, espe-cialmente o de crianças.

ÉPOCA – Pessoas com dislexia leem de forma diferente ou apenas mais devagar?
Dehaene – Pessoas com dislexia tendem a ter problemas com a conexão entre letra e som. É muito difícil para elas entender essa ligação. Em parte, porque não podem distinguir muito bem as diferenças dos sons da língua. Elas têm problemas com fonologia. Não com o som de letras como a, b, c e d. Mas com o som da linguagem, como dã, bã e pã. Há diferentes tipos de dislexia. Há pessoas que têm dificuldade em enxergar as letras em determinados lugares da palavra ou em visualizar símbolos específicos. O que os disléxicos têm em comum é a dificuldade em criar o mapa dos símbolos e dos sons.

ÉPOCA – Sua pesquisa pode ajudá-los de alguma forma?
Dehaene – Antes não era óbvio que a maioria dos disléxicos tinha problemas com os sons da linguagem. Agora que sabemos disso, começamos a trabalhar com jogos de reabilitação com ótimos resultados. É possível ajudar as crianças com dislexia com jogos de leitura, de rimas ou brincadeiras de mudar sílabas. Pode-se brincar de trocar o som de “bra” de Brasil por “dra” ou “pra”. Vimos que brincadeiras orais fáceis têm facilitado o aprendizado.

ÉPOCA – Que resultados esse tipo de exercício já produziu?
Dehaene – Constatamos com exames de imagem que partes do cérebro não usadas em pessoas com dislexia passam a ser exercitadas com esse tipo de atividade. Isso as ajuda a perceber os sons da linguagem, o que é muito importante para o aprendizado da leitura. Para surtir resultados, é importante aplicar esses jogos todos os dias, de forma intensiva.

ÉPOCA – Se o cérebro dos disléxicos é organizado de forma diferente, isso sugere que eles possam ter outras habilidades que alguém sem a dislexia não tem?
Dehaene – Essa é uma questão interessante. Assim como há a possibilidade de perdermos algumas habilidades quando aprendemos a ler, existe a possibilidade de o cérebro disléxico ter facilidade com algumas áreas. Ainda faltam pesquisas para podermos constatar isso. Mas estudos sugerem que o senso de simetria do disléxico pode ser mais desenvolvido, e isso ajuda em matemática. Sabemos que há muitos disléxicos que podem ser bons em matemática. Estudos sugerem que eles podem enxergar padrões sofisticados com mais facilidade.

ÉPOCA – Pode haver gênios em matemática que não sabem ler?
Dehaene – Isso é algo muito, muito raro. Pode haver pessoas iletradas muito boas em cálculos. Mas elas não serão gênios em matemática sem ler. Para avançar em matemática, a pessoa precisa entender diferenças sutis num nível muito sofisticado. É justamente a percepção dessas diferenças sutis que a leitura ativa no cérebro. Ler é uma habilidade extraordinária que pode transformar o cérebro e prepará-lo para outros níveis de aprendizado. Não dá para ir muito longe sem leitura.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Estudos de Neurociência aplicada à Aprendizagem Escola

"Neurociência" é um termo guarda-chuva que engloba todas as áreas da ciência: biologia, fisiologia, medicina, física, psicologia e que se interessam pelo sistema nervoso: sua estrutura, função, desenvolvimento, evolução, e disfunções.

O que somos, fazemos, pensamos e desejamos é resultado do funcionamento do sistema nervoso e sua interação com o corpo, juntamente com a história de vida de cada um, a cultura, a sociedade, e a genética fazem de nós o que somos, individualmente, como seres humanos, e como animais racionais.

"Aprender é uma questão de foco, organização e ritmo neural." - Marta Relvas

A Neurociência quando dialoga com a Educação promove caminhos para o professor tornar-se um mediador do como ensinar com qualidade através de recursos pedagógicos que estimulem o aluno a pensar sobre o pensar. Entretanto torna-se fundamental para o professor promover os estímulos corretos no momento certo para que o aluno possa integrar, associar e entender. Esses estímulos quando emoldurados e aplicados no cotidiano, podem ser transformados em uma aprendizagem significativa e prazerosa no processo escolar.

A Neurociência aplicada na Educação vem como um estudo a mais, e não como "receita de bolo" ou uma "panacéia" de todos os males da Educação para serem curados pela Neurociência. Não é uma teoria e nem tão pouco uma tendência pedagógica. É um estudo científico de como o cérebro pode aprender melhor e guardar saberes.

A função do professor é potencializar os cérebros na sala de aula. Aliás, no olhar neurocientífico, os atrasados não existem, não existem pessoas que não aprendem. O que existe são cérebros com ritmos neuronais, desejos e experiências diferentes e que recebem os mesmos estímulos/ informações / conteúdos ao mesmo tempo e coletivamente na sala de aula.

Quando mais aprendemos mais conexões neurais formamos... Quanto mais estímulos mais aprendemos? Mito: aprendizagem não está relacionada com quantidade de estímulos e sim com a qualidade desses estímulos!!! Por isso não existe "nivelamento" de aprendizagem, pois somos diferentes nos contextos biológicos, psicológicos, emocionais, afetivos e sociais.

Existem comprovações científicas que o cérebro sofre modificações ao longo de nossa existência. E isso tem a ver com a capacidade de formações de novas conexões neurais. Nascemos em média com 88 bilhões de neurônios e cada neurônio tem uma capacidade de produzir milhões de novas conexões, quando estimulados desenvolvem uma capacidade denomina-se plasticidade neural/ cerebral, ou seja, quando o funcionamento do sistema motor e perceptivo sofrem estímulos baseados em mudanças no ambiente, através da conexão e (re) conexão das sinapses nervosas.

Somos o que vivenciamos, experimentamos e pelo que lembramos - Marta Relvas

Aprende-se com o cérebro, e todas as ações perpassam como um filme na máquina fotográfica, ou comparando a um hardware, onde vários softwares são "rodados" por meio de impulsos elétricos, e pela centelha dos afetos ou desafetos existentes e recebidos ao longo de nossas vidas.

O cérebro sozinho não possui função nenhuma, ele só estabelece um funcionamento quando em conjunto com outros sistemas se interconectam, recebem e respondem aos estímulos para realizar um potencial de atividades elétricas e químicas.

A forma de aprender está relacionada ao recebimento de estímulos que são captados pelos sentidos, considerados fiéis escudeiros e selecionadores, chamados canais sensoriais. Esses estímulos conhecidos como informações (som, visão, tato, gustação, olfação) chegam ao tálamo que é uma estrutura no cérebro que tem a função de receber esses estímulos e reenviá-los para áreas específicas que são responsáveis na elaboração, decodificação e associação dessas informações. O tálamo funciona como um "aeroporto" e junto com o hipotálamo, as amígdalas cerebrais (responsável pela emoção), e o hipocampo (responsável pela memória de longo prazo), promovem as lembranças e a aprendizagem significativa.

É fundamental destacar a função da escola, pois transmite valores e idéias que servem como espelho da sociedade em que se insere, mostrando sob qual código ético se tecem as relações intersubjetivas e intrassubjetivas. Representam também a cultura no espaço e no tempo físico em que a criança permanece fora de seu lugar primordial, a família.

É importante o educador estar atento a estas questões, pois a escola necessita junto com a família preparar para os enfrentamentos dos desafios da vida profissional, pessoal e emocional.

Aprende-se com a cognição, mas sem dúvida alguma, aprende-se pela emoção, o desafio é unir conteúdos coerentes, desejos, curiosidades e afetos para uma prazerosa aprendizagem. (Marta Relvas)

O cérebro é provavelmente o órgão mais fascinante do corpo humano. Ele controla tudo, da respiração até as emoções e inclusive o aprendizado.

Se você é professor e educador, conhecimentos básicos da Neurociência são essenciais para seu trabalho, já que seu objetivo é proporcionar aprendizagem a seus estudantes e, de preferência, da forma mais otimizada possível.

Profa. Dra. Marta Relvas
Palestrante, Conferencista e Consultora na área de Neurociência Aplicada à Aprendizagem Cognitiva e Emocional no Desenvolvimento Humano. Bióloga, Neurobióloga, Psicopedagoga, Psicanalista, Pós graduada em Anatomia Humana, Especialista em Fisiologia Humana, Bioética Aplicada e Didática do Ensino Superior. Pesquisadora na área de Biologia Cognitiva e Aprendizagem e Membro Associada da Sociedade Brasileira de Neurociência e Comportamento. Mentora e Professora do Curso de Pós Graduação de Neurociência Pedagógica da Faculdade Integrada AVM-UCAM/RJ, ministrado as disciplinas de Neurociência da Anatomia e Fisiologia Cognitiva e Emocional, e Neurociência e Educação. Autora dos Livros: Fundamentos Biológicos da Educação - desenvolvendo inteligência e afetividade na aprendizagem, editora WAK. 5° edição. Neurociência e os Transtornos da Aprendizagem, editora WAK 5° edição. Neurociência e Educação: Gêneros e potencialidades na sala de aula, editora WAK.2° edição. Neurociência nas Práticas Pedagógicas, editora WAK , 2012. Co-autora dos livros: Neuropsicologia e Aprendizagem para Viver Melhor - Editora Científica; Luiza Elena Ribeiro do Valle, Sociedade Brasileira de Neuropsicologia - editora Tecmedd,SP. Neuropsiquiatria Infância e Adolescência - Abordagem Multidiscpilinar de problemas na clínica, na família e na escola. Org. Eduardo L. Ribeiro, editora WAK,RJ. Como Aplicar a Psicomotricidade. Org. Fátima Alves, editora WAK, RJ. Mídia em DVD - Neurociência e Aprendizagem Escolar - editora WAK.

Olhar sobre as IDADES




quarta-feira, 8 de agosto de 2012

A Mosca de Aristóteles (José Pacheco)


A escola herdeira do Iluminismo, a escola da afirmação da Modernidade, já não existe - ela vegeta, agoniza. E arrasta na sua agonia milhões de jovens condenados à ignorância e à exclusão.

Entre o aparecimento da lousa de ardósia e o da lousa digital distam séculos. Nesse longo hiato, a escola pouco, ou mesmo nada, mudou. Apenas terá mudado o tipo de material utilizado na fabricação da lousa.
Oitenta por cento dos jovens internautas comunicam com outros, pedem ajuda e prestam ajuda, em chats, emails, em múltiplas plataformas online. Num tempo em que importa mais que seja o aluno a esforçar-se, para descobrir realidades, do que uma "realidade" ser comunicada por um professor, quantos desses jovens comunicarão com os professores através da Internet?
Num tempo em que a prática da escrita da letra cursiva vai sendo abandonada, muitos docentes obrigam os seus alunos a um gasto significativo do tempo escolar no exercitar da letra cursiva, para que - segundo afirmam - os seus alunos tenham "uma caligrafia perfeita". Talvez se inspirem em Steve Jobs, que, quando passou pela universidade, apenas quis aprender... caligrafia.
Jardins de infância precocemente escolarizam a infância, instituindo rotinas, nas quais todas as crianças devem começar a dormir ao mesmo tempo, ainda que não tenham sono (e, frequentemente, "embaladas por crews, sertanejos e bandas sonoras de novelas...). 
À revelia das descobertas da cronobiologia, as escolas mantêm rituais de horário fixo, como a hora de entrar e de sair, ou os cinquenta minutos de uma aula, que quase ninguém sabe explicar por que são cinquenta... E, entre dois toques de sirene, se anuncia que todos poderão ir ao recreio, ao mesmo tempo. Venho suspeitando de que existe alguma analogia entre o banho de sol dos presidiários e o recreio dos alunos... Ao mesmo tempo, todos deverão estar olhando a nuca do colega da frente. Ao mesmo tempo, todos devem merendar, todos devem fazer xixi no mesmo período de tempo.
Já alguém se prerguntou se terá sido sempre assim? Desde o século XVIII, não existe sequer uma teoria que sustente o modelo de escola, que, no nosso tempo, ainda é hegemónico.
A escola herdeira do Iluminismo, a escola da afirmação da Modernidade, já não existe - ela vegeta, agoniza. E arrasta na sua agonia milhões de jovens condenados à ignorância e à exclusão. A par da família, a escola não se adaptou aos novos tempos. Hoje, é matriz oculta do insucesso escolar e social.
Permiti que cite dois mestres. João Guimarães Rosa, que disse que mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. E Claude Lévi-Strauss, que acertou quando escreveu que sábio não é aquele que fornece as verdadeiras respostas, é aquele que faz as verdadeiras perguntas. Aqueles que, interrogando-se, se libertam de preconceitos e soluções convencionais conseguem compreender que a escola dita tradicional deverá ser demolida, e que, com o material da demolição, se poderá construirá uma nova educação. Sem esquecer que quando se alcança um determinado objetivo de projeto, o mundo já mudou de novo, e que todos os projetos humanos estão em permanente fase instituinte.
O sistema mais antigo de classificação de seres vivos que se conhece deve-se ao filósofo grego Aristóteles, que classificou e descreveu todos os organismos vivos então conhecidos.
Conta-se que Aristóteles deixou registado ter a mosca doméstica oito patas. Ao longo de muitos séculos, os copistas reproduziram a aristotélica asserção até que alguém se atreveu a desafiar a autoridade científica de Aristóteles e verificou que a mosca tem seis patas. 
Quando chegará o tempo em que os protagonistas do absurdo modelo de escola, que ainda temos, se decidirão a contar as patas de uma mosca?

http://www.educare.pt/educare/Opiniao.Artigo.aspx?contentid=C30C0A8C85B30E77E0400A0AB80001BA&opsel=2&channelid

Nada nunca é igual

  Nada nunca é igual   Enquanto os dias passam, eu reflito: nada nunca é igual. Não existe repetição. Não precisa haver morte ou decepçã...