Escola de ensino público. Ensino Médio regular.
Turno noite. Jovens de 17 a melhor idade juntos. Estou no pátio, observo e
escuto. Estamos na semana de provas. Mais ebulição do que o normal. Momento
tenso. Conversas variadas, mas algo chama atenção: a questão das provas NÃO é o
assunto principal. Semana de provas e os encontros, os afetos, as passeatas, as
músicas, as meninas ou meninos, o recebimento da blusa da escola, a festa
junina, as decepções, as futuras programações, o trabalho, tudo cerca as
relações orais e os humores, menos as provas. Muitos até perguntam: hoje é
prova de que?
Escuto e me lembro dos tempos de escola. Esta era
uma época de grande preocupação. Fora a questão do saber, tinha a tensão de
‘ter nota’ para mostrar aos meus pais. Era uma semana em que atividades lúdicas
em casa eram restringidas. Eu e meu irmão estávamos estudando. Era uma semana
de muito foco e concentração. Era uma semana em que, em jogo, estavam as férias
na casa da minha avó. E ali, naquele pátio da escola, eu observava e ouvia
jovens-adultos e adultos quase displicentes quanto às suas aprendizagens ou
performances na hora da avaliação. O que aconteceu? Em que momento houve esse
desligamento ou desinteresse sobre a participação das etapas avaliativas da
escola?
Pelo jeito, a avaliação precisa realmente ser
repensada. Estes jovens estão desconectados da escola e não se reconhecem nos
processos avaliativos. Fiquei ali lembrando de mim, minha infância e
adolescência na escola, e comparo conclusivamente: estamos em tempos muito
diferentes mesmo. Paradigmas controversos. Ações lineares. Tradições em crise
total. Questões desfocadas. Falta de espelhamento. Isso tudo é o que eles vivem
e sentem em permanência na escola e nas propostas de avaliação. É uma sensação
reproduzida largamente por tempo demais e o prejuízo estou/estamos percebendo
hoje, aqui. Jovens-adultos são ebulições em expectativa de novidades, por que é
difícil entender ou agir diante disso? Ou qual é o sentido de tanta resistência
docente em SE superar emocional e pedagogicamente? Bate o sinal. Todos em suas
salas.
Duas horas de prova. Aliás, duas horas de provas.
Em minha escola, em cada dia da semana, em duas horas, os alunos devem fazer
duas provas. Hoje acontecerão as provas de Química e de História. Primeiro
entrave: não seriam solicitadas habilidades muito diferentes para os mesmos
cérebros? Enfim observo. Silêncio: alunos pensando. De acordo com a gestão, ambas
as provas com questões discursivas e sem consulta. De novo me surpreendo ‘meio
tensa’ com isso. Um bimestre inteiro de Química e História em xeque, durante
duas horas. Isso é didático? Isso é pertinente? Tem que ser desta forma?
Em pé, ando para lá e para cá e leio os comportamentos.
Silêncios de 30min. Pequenas inquietações durante mais 20min. Olhares perdidos
por mais 30min. Por fim, muitas desistências. Sem tanto rigor temporal, depois
de 40min, muitos alunos já olhando para mim na ânsia de entregar as duas provas
e sair para vida. Eles queriam algo mais interessante e com mais sentido do que
aquilo. Lá fora tinham projetos, planos, expectativas, desejos, aguardando-os.
Lá fora só tinham que provar coisas a si mesmo e se integrar. Lá fora os
significados e ressignificados dependiam somente deles, das suas vivências e
dos riscos que assumiam correr. Lá fora a curiosidade, as independências, as
liberdades. Lá fora desafios e emoção pura!
Para avaliar realmente é preciso entender como esse
aluno, no século XXI, aprende. Em uma hora, bate novamente o sinal e quase
todos os alunos entregam as provas e saem. Provas de Química e de História
realizadas em menos de uma hora? Pois é, é isso. Eu recebo as provas, mas
pergunto: ‘Tudo bem? Acabou mesmo?’. Todas as respostas são positivas. Os
cérebros já tinham outros pensamentos, outras vontades, outras intenções. As
mentes já se imaginam noutros lugares e com outras pessoas.
Todos são jovens-adultos e adultos; são idealistas;
são desejantes; e são dispostos. Muitos não têm consciência do que querem ou do
seu valor, mas todos aprendem e querem aprender. Mesmo com muitas nuances
acreditam na seguinte ideia: estar na escola é para aprender. Mas há algo ‘sem
cola’ neste processo, tem algo que não está ressignificando as relações de
aprendizagem. Ao pegar meu material, deixo cair o livro do carnavalesco Paulo
Barros chamado ‘Sem Segredo: estratégia, inovação e criatividade’ e aquelas
palavras me surpreendem. É isso! Na escola atual faltam formações e renovações
estratégicas voltadas às inovações (desafios) e às criatividades (estímulos às
inteligências).
Eu fico naquela sala parada pensando. Como minha
avó diria ‘estamos com a faca, o queijo e o rato em mãos’, mas não
surpreendemos. Nós, professores, reproduzimos, linearizamos e acreditamos em
aprendizagens iguais ainda. Nós, docentes, entramos numa bifurcação histórica e
observamos de longe às transformações cognitivas e, principalmente, suas
razões. Só a Pedagogia não basta mais para estimular e desenvolver os chamados
‘nativos digitais’ ou ‘geração Y’. Nós, professores, precisamos da Pedagogia,
da Psicologia, da Filosofia, das Tecnologias, da Neurociência, das humanizações
constantes (sensibilidades) para qualificar as vontades de aprender dos
sujeitos de maneira integral. E as décadas de fragmentações, principalmente, curriculares
não favorecem o (re)pensamento dos seus processos: estão obsoletos, estão
fragilizados.
Inovar, empreender, colaborar, desafiar, mediar são
palavras que precisam da prática pedagógica. É preciso tirá-las do âmbito dos
textos teóricos e relacioná-las ao cotidiano escolar com seriedade, tanto
importando conteúdos, quanto valores para uma inserção social menos turbulenta
dos nossos alunos. Os conteúdos tem que ser valorizados por contextualização,
importação dos interesses também dos alunos e momentos de liberdade de ação e
parceria. Com os conteúdos sabidos, professores podem ligá-los à nossa cultura,
economia, meio ambiente, mídia etc. O lugar em que vivem, seja a comunidade ou
a sociedade em geral tem que se fazer presente no processo de aprender. Isso
provoca disciplina em sala, consciência dos fatos, melhores argumentações,
desejo de aprender e menor número de ausências.
Aprendentes necessitam de ensinantes mais
inovadores; ensinantes que, com seu autoconhecimento, desenvolvam uma sala de
aula mais movimentada, pensada, corporal e democrática. Aprendentes necessitam
de ensinantes em constante processo de formação em sua área de saber e em outros
conteúdos. Aprendentes necessitam de ensinantes que os respeitem em suas
singularidades cognitivas e emocionais, e os mantenham aprendendo. É uma visão
romântica ou ampla demais do educar? Pois é, eu sei. Então por que não?
Naquela sala do segundo andar de um prédio mal conservado,
pensei numa nova educação com mais impacto às cognições e às emoções tão
diferentes. E tudo começaria com uma avaliação diagnóstica de excelência.
Desejar mudanças é desejar novos engajamentos, de repente, por imersão e
colaboração de todos com todos em busca de memória e conhecimento.
Eu sei que demora, mas o tempo deve ser usado a
nosso favor sempre. Nós, professores, temos formação e convivemos, muitas vezes,
com realidades comunitárias muito díspares. É preciso (re)arranjar o tempo das ‘ensinagens’
de acordo com o tempo e o ritmo das aprendizagens com pequenas sensibilidades
voltadas ao incentivo às experiências e às vivências dos aprendentes. Algumas
sugestões interessantes indicadas por diferentes textos do site Nova Escola:
- planeje suas aulas com mídias diferentes;
- oportunize o diálogo sobre as aulas, vez por
outra;
- diminua as improvisações;
- determine novos ambientes para aprendizagem;
- indique novas fontes de pesquisa;
- estabeleça pequenos vínculos afetivos;
- use o conhecimento teórico como base às
atividades oferecidas;
- tenha percepção realista dos alunos e suas
potencialidades acadêmicas;
- incentive o desenvolvimento de respostas
possíveis e não apenas as certas;
- influencie o crescimento dos níveis de
curiosidade com atividades desafiantes e em grupo;
- estimule os alunos a explorarem a própria
realidade;
- evite inventar situações descontextualizadas;
- transforme os alunos em agentes ativos e
proativos;
- envolva a todos em aprendizagens de mente e
corpo;
- inspire os alunos a tocar, cheirar e mergulhar em
determinados assuntos, indo além do livro ou foto;
- priorize, quando puder, o trabalho em grupo ou em
conjunto;
- apresente-se como mediador e favorecedor do saber
introduzindo recursos e técnicas variadas;
- dê liberdade ao uso de ferramentas e técnicas
trazidas pela experiência discente;
- oportunize o espaço da sala para os deslizes sem
medo ou rigidez autoritária.
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