Com aprendentes
do século XXI é óbvio que, dentre tantos recursos, as novas tecnologias devem
ser incluídas dentre os recursos interventivos da aprendizagem. Elas pertencem
ao contemporâneo, ao cotidiano e à realidade, principalmente daqueles nascidos
a partir da década de 80. Elas integram os recursos pedagógicos porque renovam
(por afinidade) a sensação de pertencimento dos próprios aprendentes no
processo de realização das atividades de ensino. Mas não se deve esquecer que o
cérebro é tecnologia primeva humana. É o órgão do movimento, da aprendizagem e
do conhecimento. É mutável diante da relação com o mundo externo. Logo ensinar
(enviar um estímulo) aos aprendentes é propor confrontos com informações pré-conhecidas
instaladas na memória a fim de torná-las relevantes no âmbito da relação de
ensino e observar como estes se estabelecem como ferramenta de integração
social. É preciso capacitar os aprendentes a (re)construir os significados
atribuídos a essa realidade e a essa relação (ANTUNES, 2007).
Na possibilidade
de uma prática de ensino mais focada num conhecimento prévio, até os
aprendentes podem se aproveitar do processo, ou seja, como parceiros do ensino
e agentes da própria aprendizagem, podem conhecer o funcionamento do próprio
cérebro e mudar sua visão sobre aprendizagem ou sobre porque estão na escola. É
também uma forma de se criar autonomia e autogerenciamento da informação em
conhecimento.
Para muitos
deles ainda, o espaço da escola é igual a um parque de diversões: serve para
mil socializações menos estudar. E por quê? Porque encontram um cotidiano
escolar sempre igual: chegar, sentar, copiar, fazer exercícios de fixação e ir
embora. Que sentido tem isso? Quase nenhum. E pior, na maioria dos casos, em
três ou quatro horas, é chegar, sentar, copiar e fazer exercícios de fixação de
duas ou três áreas do saber diferentes e ir embora. Nada disso se relaciona com
a aprendizagem em si mesma. Nada se estabelece na memória de longa duração,
gerenciada pelo hipocampo e pela amígdala, de forma a mudar comportamento. Não há desafios!!
Porém, na medida
em que são apresentados aos porquês das suas posturas, atitudes e
comportamentos através de determinadas funcionalidades do cérebro ou realizam
reflexões sobre os próprios comportamentos e/ou pensamentos (certezas), os
aprendentes podem deixar de acreditar que apresentam certas dificuldades
(estigma que carregam, muitas vezes, por causa da fala constante dos ‘mais
velhos’ sobre eles) e se esforcem por aprender individualmente ou em grupo.
Neste momento sim, diante da reflexão e do trabalho em grupo, pode-se articular
o cérebro de recompensa. Neste momento sim, pode-se introduzir valores como
moral, ética, solidariedade, equilíbrio, respeito e educação para consigo mesmo
e o outro.
Os
sujeitos-aprendentes não mais se satisfazem em acessar ou agir em processo
‘pré-fabricados’ do começo ao fim. Não são passivos e assíncronos; têm
interesses próprios e chegam às escolas já seduzidos por um mundo midiático em
diferentes ambientes. A sedução está na possibilidade de reinventar a
arquitetura virtual no ambiente educacional, de acordo com um coletivo. A
sedução está no nível de sinergia e de interatividade permitidas e incentivadas
no período escolar de aprendizado.
Em sala de aula,
no envolvimento afetivo, muitas representações se estabelecem e se esclarecem
pelos vínculos e vivência no grupo escolar. Ao mesmo tempo ambos contem em si
mesmo apropriações emocionais, materiais, psicológicas e culturais diferentes
cujo ‘tempero’ (trocas simbólicas e/ou reais) gera novos desafios emocionais e
novas aprendizagens conteúdisticas. Há uma sensação de pertencimento.
Do vínculo o que
se constrói é o apego. Do apego, um modus
operandi em que, mesmo os aprendizados, as relações adaptativas e
assimilativas dos sujeitos junto às informações se dão dentro de dinâmicas e
estratégias reconhecidas porque já experimentadas (vividas). É quase uma
ritualização de lembranças e esquecimentos (memória) em parceria com os
elementos constitutivos do patrimônio mnemônico sociocultural. E estes, quando
tratados de maneira focada e agradável dão novos significados aos objetivos
iniciais de quaisquer práticas de ensino. Ainda assim, na cena pedagógica,
‘sotaques’ geracionais diversos.
Mesmo hoje, na
convivência de duas gerações, no caso, em sala, há uma memória que remete a um
passado, muito presente e necessária, e em processo de adaptação; e há uma
memória que se processa na relação com o presente, como forma de assimilação. A
convergência é pulsante e dá equilíbrio ao desenvolvimento das relações e
inter-relações. E a perspectiva é dar significância às proximidades e a cada
contato, mesmo reconhecendo as diversidades e respeitando as subjetividades.
Há um mapa
mental[1]
que só se modifica (por acréscimo) lentamente, ou melhor, com muita reflexão,
análise e atenção, porque atinge “...
numerosas funções cognitivas humanas: memória (banco de dados, hiperdocumentos,
arquivos digitais de todos os tipos), imaginação (simulações), percepção
(sensores digitais, telepresença, realidades virtuais), raciocínios
(inteligência artificial, modelização de fenômenos complexos)” (LEVY, 2003,
p. 157).
Neste sentido,
já não se pode comparar os cérebros com um computador. Neste mundo de convergência
intensa e de adaptações não menos radicais, ele (computador) se torna uma mera
‘máquina de escrever sofisticada’ e a Internet, um espaço de acesso mais rápido
e fácil de encontro com a informação: se comparado com a capacidade e nas
relações complexas ocorridas na memória humana.
Neste momento do
trabalho, a memória está sendo entendida como a capacidade de reter múltiplas
informações e (re)transmiti-las às novas gerações através de diferentes
suportes empíricos e hipertextuais, como voz, música, imagem, texto etc. Ela é
um identificador do patrimônio cultural de cada um ou do coletivo e é também um
fator extremamente importante do sentimento de pertença de uma pessoa em um
grupo como maneira de reconstruir-se.
Ainda assim, com
o tempo, a memória torna-se livre e fortemente seletiva. Seu trabalho de
organização das informações, documentos de uma época, torna-se mais exigente e
menos propensa a especulações e probabilidades de uma cultura em ascensão. Esta
exigência (quase resistência) é que vai distinguir formas de apropriação das
duas gerações que se conectam no século XXI.
Contemporaneamente,
a facilidade e rapidez dos meios de comunicação muito relacionados às
influências das tecnologias informáticas estabeleceram um aumento das
informações cujo acesso pode ser feito em diferentes suportes. Este volume de
informações aumentou o nível de ansiedade humana quanto ao consumo de
informação. Os professores são afetados por este movimento acelerado e se
sentem dissociados, no sentido de perceberem que, apesar das suas expectativas,
não têm tempo para apreensão real de todas as informações ou mesmo de todas as
exigências do novo tempo.
Esta visão
ansiosa (ou dissociada) diminui o cuidado seletivo em relação às suas
estratégias de ensino, ainda que esteja preso ao movimento de reorganização
cognitiva da geração nascida imersa no ciberespaço. Não se deve entender que
haja uma forma acrítica de assimilar as informações, de recusar os avanços
tecnológicos, ou de desconhecimento técnico, mas deve-se acreditar numa
condição mnemônica natural daqueles que nasceram tendo as tecnologias da
informática como parte da cultura, e uma condição adaptativa (reflexiva)
daqueles que antecederam estas mesmas tecnologias.
Professores têm
uma memória sociocultural que os identifica com um determinado tempo, senão
pelas ferramentas de que se cerca para empreender aprendizagem, pelo conjunto
teórico ao qual tem contato em sua formação profissional. Ambas tornam-se suas
marcas intrínsecas. Segundo Stuart Hall (2000), as ferramentas tecnológicas da
informática “não são ‘coisas’ com as
quais [os professores] nascem, mas são ‘coisas’ formadas e transformadas no
interior / processo de representação [e de ensino]”.
Toda a questão
do diálogo entre Educação e Neurociência, do diálogo entre professor,
planejamento e aprendentes, é uma questão de esforço diário para a conquista da
qualidade do ensino e de pessoas melhores e mais bem integradas em sociedade. E
tudo se dá no cérebro.
O cérebro é
estruturado para ser capaz de processar as informações e assim ser educado. Ele
é fiel escudeiro de acordo com Relvas (2012). E diante de determinadas
dificuldades, se apresenta com ativação compensatória em regiões cerebrais
normalmente sem ligação com a própria dificuldade. É um sistema integrado de informações
e emoções, cuja excitação provoca alterações em múltiplas regiões.
Psicologia,
neurociência e pedagogia juntas visam transformar a prática de ensino pelo
conhecimento científico. Questões como o que é importante saber, quem está
preparado para ensinar, quem deve ser ensinado e de que maneira inquietam
educadores desde sempre ganham força em discussões pedagógicas, palestras e
publicações em geral.
Antes de
quaisquer rotulações ‘neuro’, o momento da educação é de aproveitamento dos
novos conhecimentos sobre o cérebro na prática da sala de aula. E, como
principio, é preciso rever as teorias da aprendizagem (principalmente Piaget,
Vygotsky e Wallon) e alguns temas caros ao campo educacional como prática de
ensino, projetos pedagógicos, planejamento e avaliação.
Profª
Claudia Nunes
[1] Segundo
Ontoria (2004, p.25), “O mapa mental é um recurso que canaliza a criatividade
porque utiliza as habilidades a ela relacionadas, sobre tudo a imaginação, a
associação de idéias e a flexibilidade [...], é reflexo gráfico e externo do
pensamento irradiante e criativo a partir de uma imagem central. [...]
representa uma realidade multidimensional”.
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