segunda-feira, 15 de outubro de 2018

BARALHO DE EMOÇÕES


De novo pensando em jovens da escola pública. Mais do que qualquer coisa, uma primeira impressão: eles não tem autoconsciência e nem tem onde busca-la ou aperfeiçoa-la de modo que ganhem autonomia de emocional. Sentada no pátio da escola, eu observo comportamentos, a partir das linguagens verbal e nao-verbal. E é a não-verbal que mais me surpreende, pelo descontrole, pela insegurança, pelo disfarce, pelo nervoso, pela indiferença, das atitudes (formas de fazer valer suas vontades / crenças) emocionais diferentes.

Em papos diversos, eles reagem com o corpo e com a voz de forma agressiva ou abrupta. A sensação é a seguinte: quando colocados em xeque, eles se desarticulam e atacam. Atacam com deboche, palavrões, gritam, irritação, riso histérico. E eles só estão juntos e conversando. Tudo natural... Mas há temas que fragilizam, que tocam em suas memórias mais afetivas ou traumáticas, e eles reagem... reagem para acabar com o problema: sua insegurança / seu medo. E de novo, lembro: eles estão apenas conversando.

De repente penso em Paul Ekman, um psicólogo americano (Washington, 1934), especialista no estudo das emoções e da expressão facial. Para além da cultura, Ekman percebeu, em suas pesquisas, que era preciso aceitar a perspectiva evolutiva e o pensamento de Darwin foi fundamental. Além da cultura (internalizada pelas interações em espaços de média violência e tensão), então, meus jovens nascem e crescem com emoções conturbadas: exemplos diversos o que gera comportamentos ‘fora do padrão’ num simples ‘bate-papo’.

Penso em Ekman e em seu livro “A Linguagem das Emoções” que estou lendo com calma. Esses jovens não têm emoções de qualidade; eles chegaram aos 17 ou 18 anos sem emoções de qualidade, principalmente, qualidades positivas para a convivência e aceitação da diversidade em geral. Esses jovens são ‘umbilicais’, aprenderam a ser ‘umbilicais’ por se desenvolverem ou muito sós, ou com muitas pessoas em um cômodo só. Ambas as siturações são inibidores ou intensificadores do sistema nervoso em termos de autonomia de pensamento, e/ou estratégias de sobrevivência. É muita energia / vontade represada...

Segundo Ekman (2011), no século XXI, é preciso preparar os jovens com quatro habilidades básicas: (1) torna-se mais consciente do momento em que se emocionam; (2) escolher como se comportam quando se emocionam; (3) torna-se mais sensível em relação à maneira como os outros estão se sentindo; e (4) usar cuidadosamente as informações que se adquire a respeito dos sentimentos do outro. Afinal “as emoções determinam nossa qualidade de vida”. Ou seja, Ekam refere-se ao ensino da empatia e do equilíbrio às funções executivas!

Aos 17 ou 18 anos, eles nem tem noção dos gatilhos emocionais que insistem em aceitar e que resultam em ações cujas consequências não estão preparados para assumir; quanto mais reconhecerem quais gatilhos mentais tem para poderem trabalha-los adequadamente na medida em que surgem. Dificil pedir equilíbrio emocional quando mal se conhecem emocionalmente. Então aos trancos e barrancos, eles vão agindo sem pensar e liberando energias / vontades em todo e qualquer espaço.

Segundo Tomkins (apud EKMAN, 2011, p.17) “as emoções motivam todas as escolhas importantes que fazemos”, mas para isso é preciso que se conheçam emocionamente e que adquiram ferramentas para lidarem com as emoções quando surgirem. Sentada no pátio, eu penso em Ekman (2011) e nas mudanças que as emoções podem causar a cérebros tão juvenis.

Ao mesmo tempo em que reconhecemos a presença de partes do cérebro que regulam as emoções, reconhecemos também que estas são as primeiras atingidas pelos estímulos que deflagram as emoções. Mesmo conversando entre amigos, num intervalo de aula, eles estão com o sistema nervoso autônomo muito alterado. Este “regula o batimento cardíaco, a respiração, a transpiração e muitas alterações corporais” (p.37). Mas estão desregulados: eles querem de quaisquer maneiras aparecer; eles amam a exposição mesmo que beire ao ridículo ou um transtorno.

Através das linguagens nãoverbais, eles expõem todas as experiências de interação que tiveram até a idade de 17 ou 18 anos, e quase sempre ou são impróprias, ou são disfuncionais, ou mesmo desorganizadas; e quase sempre geram situações de desconforto ou chateação por parte da equipe pedagógica.

Ekman (2011, p.44), afirma que “nascemos preparados, com uma sensibilidade em desenvolvimento para os eventos que foram relevantes para a sobrevivência de nossa espécie em seu ambiente ancestral como caçadores e coletores”. Eu acredito que estamos desenvolvendo apenas jovens coletores emocionais já que as emoções que vão angariando enquanto crescem tem poucas oportunidades de sublimação, de experimentação e/ou extravasamento. Sendo assim, há uma carga neuroquímica sendo alimentada pelas revoluções hormonais e amplificada pelos níveis de negação ou de violência cujo resultado são violências supreendentes; ações intempestivas; desejos de riscos absurdos; medos insensatos; e silêncios inacessíveis.

Sabemos que as emoções negativas, quando controladas (na medida certa), ajudam à sobrevivência, tanto da espécie, quanto dos mais jovens. Por isso, Ekman (2011, p.75) afirma que “tristeza, raiva, surpresa, medo, aversão, desprezo e felicidade são termos emocionais de emoções afins”. O que pode variar é a genética, a intensidade e a frequencia de sua vivência e convivência. E, de onde eu observo, a constante vivência dessas emoções trouxe comportamentos que, na escola, são quase aceitáveis, pois observamos este local como local do erro, do resgate, do ajuste, da reabilitação, do controle e do equilíbrio para viver em sociedade; mas, quando eles forem para o mundo, estes comportamentos serão pontos para sua desagregação, desilusão, depressão e ações preconceituosas destes mesmos jovens, quanto da sociedade para com eles.

Meus jovens dialogam como se estivessem em um ringue de luta livre cuja ideia é disputar uma vaga no ranking dos mais descolados, intensos, inteligentes, amoroso, chamativos, intransigentes, participativos, junto às emoções de uma geração que só saber se fazer presente, no presente, com força, vontade e muitas emoções no corpo. A linguagem nãoverbal reafirma sua vontade de ser único: a estrela criada em seu imaginário.

Hora da aula. Vamos ao futuro...

Profª Claudia Nunes


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