Hoje acordei com a noticia de que o Imperador Adriano sofreu uma contusão e ficará 05 meses sem estrear em campo. Fiquei parada olhando a TV e pensando: o que a perda de um pai não faz. Muita gente pensa que criança é uma cadeira: joga para lá, joga pra cá; falam o que querem; agem como lhes dá na veneta; e a criança vai junto. Hoje em dia a representação da família mudou, eu sei, mas estamos produzindo monstrinhos, esquizofrênicos e seres cheios de manha e soberba porque aceitamos, sem discutir, que criança não sente, não entende, não vê e não sabe se comportar.
Nesta perspectiva, estamos quase em paralelo com alienados, ignorantes e dependentes integrais. Que burrice! Criança é campo aberto aos mais variados tipos de emoções. Algumas destas emoções precisam de atenção e esclarecimento constante senão se estratificam no corpo e na mente como dificuldades, problemas, transtornos, distúrbios. E não é certo pensar que, em ambientes menos favorecidos, essa atenção não vá acontecer com inteligência e persistência. Por ser um ambiente menos favorecido, ao contrário, em cena, estão, dentre outros, a vontade de um mundo melhor, uma criação melhor, uma ânsia de desenvolver personalidade com valores certos. Isso! A palavra é essa: em ambientes menos favorecidos o que se deseja é o certo, o honesto, o caráter, a coragem, a solidariedade.
Mas ai surge a primeira perda. A vida participa desse processo cortando os passos humanos com situações assustadoras e esvaziadas de sentidos; e logo depois exige paciência e superação. Da perda de um objeto à perda de uma pessoa para sempre, constantemente somos surpreendidos pela ação de olhar um lugar sem achar nadaou ninguém. Alguns dizem que são as separações necessárias para se manter o crescimento pessoal e mental, será mesmo? É possível, mas para este momento não há preparação, há sim a atração de novas parcerias e aproximações confortáveis que determinam diferentes mudanças nas próximas respirações, agora, a partir da percepção da existência de um espaço/lugar vazio.
Adriano foi sorteado à fama dentre tantos meninos que nascem com a bola nos pés nos campinhos das favelas brasileiras, alcançou a nobreza do mundo futebolístico e voou para longe do seu habitat natural. Mudou o contexto, não o seu interior. Ainda que se aceite que o processo de adaptação é natural e básico, diante, principalmente, do conforto que o dinheiro começa a proporcionar a todos que o recebem em grandes proporções, Adriano é um peixe fora d’água. Sua auto estima é dependente. Diferente de todos da sua geração que fizeram outras e rápidas ligações com o mundo e com a liberdade da celebridade, por dinheiro, dentro do futebol, Adriano manteve seu fio de prata com seus espaços de infância e sua família, e não esqueceu onde se construiu como pessoa e como profissional.
Adriano foi para o mundo, jogou bola, sentiu saudades, mas tinha pai. Tinha família perto e longe, e tinha pai. Não interessa o tipo de pai ou como o pai foi pai, apenas um garoto que tinha pai longe, mas muito junto de suas verdades e ações. Se tudo desse errado, tinha pai. O que significa isso? Significa segurança, ‘pé no chão’, sentido, equilíbrio, distancia de confusões e contusões. Mas as Moiras, caprichosas, projetam em Adriano outro destino: seu pai morre no auge do seu futebol.
Num ambiente cercado pela força do feminino, o menino Adriano perde seu herói e se desencanta. Sua atualidade é fruto de seu desencantamento, de seu desprazer consigo mesmo e com a vida que levava. Cada um foi para o seu lado e nunca mais se encontrarão. E é essa dor silenciosa que dói demais, que transforma comportamentos e formas de ver a vida, em atitudes inúteis ou sensacionalismos baratos.
Mas e agora? O cara que bronqueia forte, o cara que conversa claro, o cara da cerveja junto, o cara dos primeiros amores e camas, o cara das presenças em folguedos infantis, o cara que trabalha sério, o cara da mesa do almoço e do jantar, o cara da bola, o cara que fala ensinando, o cara dos melhores anos de vida DESAPARECEU... Como explicar que tudo isso agora só está na fotografia, imóvel, calado e sem movimento, ou somente em sua memória? Uma pessoa, tendo a idade que for, tem dificuldade de agüentar esse tranco e sorrir ou jogar (no caso do Adriano) fantasticamente uma semana depois. Nada há o que fazer.
Depois de curtir este momento, Adriano grita por ajuda. Diante da dor, Adriano foi visitar Hefestos e sua imensa obscuridade sem prazo de volta, sem consulta prévia, e não está conseguindo voltar à tona e ser feliz de novo. A crença do pacto eterno com a vida feliz foi quebrada e suas emoções não conseguem se harmonizar depois de tudo. É um rompimento com uma presença basilar. É quase um enlouquecimento da razão entorpecida pelo desaparecimento abrupto daquele que, com rédeas curtas, ocupava as lembranças e o quarto ao lado.
E ai? O que se faz com um garoto grande que, diante da morte, bloqueou seu espírito guerreiro e feliz em campo, e deseja apenas soltar a sua pipa com seus amigos, na laje de sua casa, como antigamente? Esta é a memória que o esporte capitalista desentende e pergunta: ‘tem tanto dinheiro e quer voltar pro Juramento? Está louco?’ Engano... Adriano está solitário. Adriano está sem perspectiva. Adriano ainda não superou a saudade e se comporta como um adolescente. Difícil entender? Tudo bem. Saudade não é para ser entendida mesmo, mas precisa ser respeitada.
Agora, de novo na mídia, ele está sozinho e sem atividade. O corpo, aos poucos, apresenta a tensão da perda paterna e das perseguições midiáticas. Ele não quer ser exemplo de nada. Ele quer paz para viver outros amores e sua família. Adriano precisa ‘da’ e ‘de’ família para superar essa partida abrupta e sem despedida, o quanto antes. Então atenção ao ditado anônimo: ‘Quem quiser vencer na vida deve fazer como os seus sábios: mesmo com a alma partida, ter um sorriso nos lábios’.
Força Adriano, meu Imperador!
Profa Claudia Nunes
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