quinta-feira, 23 de abril de 2015

MICROCONTOS 41, 42, 43, 44, 45

41 Nenhuma viagem tem volta, assim acordou Lima. Nenhuma viagem termina, assim levanta Lucia. Nenhuma viagem se esgota, assim se banha Leila. Nenhuma viagem se esquece, assim se veste Lara. Nenhuma viagem se vence, assim pensava Lírio. Nenhuma viagem termina, assim sentimos os mortos. Num cemitério de subúrbio, muitas viagens interrompidas. Claudia Nunes

42 Quem é capaz de dar conta do sujo da vida? Em seu escritório, imunda, depois de um dia de trabalho, Arlete se pensa. Em seu corpo a sujeito do seu coração. Ela não valia nada. Sua irmã partira magoada e ela era incapaz de se arrepender. Só podia trabalhar e continuar se sujando... se sujando muito. Tudo foi perdido sem nenhuma advertência. Ela era a culpada. Esqueceu a paciência, a beleza e a sinceridade nos olhos de no corpo de Franco, seu cunhado. A vaidade e o impulso foram seus ideais e sua perdição. Sem tempo, a sujeira dos armários e da arrogância. Claudia Nunes

43 Embora sua formação tenha sido uma das melhores da sociedade, Lívia esperava. O tempo passava e ela esperava. Qual era o gosto de esperar? Não sabia, mas esperava. Era pessoa de bem, calma e tranquila, embora isso não fosse vantagem nenhuma. Mas esperava... Seus sonhos ainda eram sonhos. Famílias, filhos, trabalho, tudo conquistado. E esperar era o de melhor sabia fazer. Onde estão os significados das coisas cujo gosto nos faz sorrir? Ela não sabia. Da varanda, observa uma fogueira se apagando, relaxa e, sem egoísmo, se rende à tormenta de olhos bem fechados.  ‘Lívia, Lívia, o leite derramou!!!!!!!’ Claudia Nunes

44 Todos os dias em 24 horas os dois se reencontram para viver o melhor de tudo: o dia. Não se perdem e nem se separam. Um dia depois do outro, os olhos atendem a um chamado: luz. São rápidos, estão em sintonia, são fortes, estão em evolução. Os dois, sem excessos, se permitem ao dia com amor, muito amor. Muitas mensagens reais; outras nem tanto; muita diversão; algumas expectativas; mas o dia é indestrutível. À noite, corações acelerados se esvaem em espíritos do bem sem interesses ou escolhas prévias. Bom dia abraço! Claudia Nunes


45 A raiva é um esconderijo bem limitante às fragilidades. Diante dela é possível reconhecer o que podemos ser apesar dos malabarismos sociais e Arminda sabia disso. Amiga de Célia por anos, não percebeu os desvãos das emoções alheias; não percebeu que sua vitalidade instalava sentimentos doídos na amiga. Célia convivia, sorria, participava, mas não era Arminda.  Sem alternativa para tanta admiração, minava tudo que tocava, e Arminda nada via. Amigas e injustas por anos. Houve um tempo de crescimento e sucesso, mas também de punições internas e violências; e Arminda não sentia nada. Sem pressa, Bruno surge como alternativa. Ele não é o certo, é o que se tem. Arminda investe. Célia se mascara. Bruno acredita. Arminda se doa. Célia ilude. Bruno sonha. Ninguém faz nada do que merece ou parece. Arminda e Célia em euforia. Bruno de contrapeso e no contrapé. Num dia, no parque, uma cartomante avisa: sua desistência será sua felicidade. Arminda se mata. Bruno se muda. Célia se alimenta. E a canção continua. Claudia Nunes.

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