41 Nenhuma viagem tem volta, assim
acordou Lima. Nenhuma viagem termina, assim levanta Lucia. Nenhuma viagem se
esgota, assim se banha Leila. Nenhuma viagem se esquece, assim se veste Lara.
Nenhuma viagem se vence, assim pensava Lírio. Nenhuma viagem termina, assim
sentimos os mortos. Num cemitério de subúrbio, muitas viagens interrompidas.
Claudia Nunes
42 Quem é capaz de dar conta do sujo
da vida? Em seu escritório, imunda, depois de um dia de trabalho, Arlete se
pensa. Em seu corpo a sujeito do seu coração. Ela não valia nada. Sua irmã
partira magoada e ela era incapaz de se arrepender. Só podia trabalhar e
continuar se sujando... se sujando muito. Tudo foi perdido sem nenhuma
advertência. Ela era a culpada. Esqueceu a paciência, a beleza e a sinceridade
nos olhos de no corpo de Franco, seu cunhado. A vaidade e o impulso foram seus
ideais e sua perdição. Sem tempo, a sujeira dos armários e da arrogância.
Claudia Nunes
43 Embora sua formação tenha sido uma
das melhores da sociedade, Lívia esperava. O tempo passava e ela esperava. Qual
era o gosto de esperar? Não sabia, mas esperava. Era pessoa de bem, calma e
tranquila, embora isso não fosse vantagem nenhuma. Mas esperava... Seus sonhos
ainda eram sonhos. Famílias, filhos, trabalho, tudo conquistado. E esperar era
o de melhor sabia fazer. Onde estão os significados das coisas cujo gosto nos
faz sorrir? Ela não sabia. Da varanda, observa uma fogueira se apagando, relaxa
e, sem egoísmo, se rende à tormenta de olhos bem fechados. ‘Lívia, Lívia, o leite derramou!!!!!!!’
Claudia Nunes
44 Todos os dias em 24 horas os dois
se reencontram para viver o melhor de tudo: o dia. Não se perdem e nem se
separam. Um dia depois do outro, os olhos atendem a um chamado: luz. São
rápidos, estão em sintonia, são fortes, estão em evolução. Os dois, sem
excessos, se permitem ao dia com amor, muito amor. Muitas mensagens reais;
outras nem tanto; muita diversão; algumas expectativas; mas o dia é
indestrutível. À noite, corações acelerados se esvaem em espíritos do bem sem
interesses ou escolhas prévias. Bom dia abraço! Claudia Nunes
45 A raiva é um esconderijo bem
limitante às fragilidades. Diante dela é possível reconhecer o que podemos ser apesar
dos malabarismos sociais e Arminda sabia disso. Amiga de Célia por anos, não
percebeu os desvãos das emoções alheias; não percebeu que sua vitalidade
instalava sentimentos doídos na amiga. Célia convivia, sorria, participava, mas
não era Arminda. Sem alternativa para
tanta admiração, minava tudo que tocava, e Arminda nada via. Amigas e injustas
por anos. Houve um tempo de crescimento e sucesso, mas também de punições
internas e violências; e Arminda não sentia nada. Sem pressa, Bruno surge como
alternativa. Ele não é o certo, é o que se tem. Arminda investe. Célia se
mascara. Bruno acredita. Arminda se doa. Célia ilude. Bruno sonha. Ninguém faz
nada do que merece ou parece. Arminda e Célia em euforia. Bruno de contrapeso e
no contrapé. Num dia, no parque, uma cartomante avisa: sua desistência será sua
felicidade. Arminda se mata. Bruno se muda. Célia se alimenta. E a canção
continua. Claudia Nunes.
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