domingo, 23 de janeiro de 2011

Cuidado com seus pensamentos (em construção)

Hoje estou lendo artigos sobre civilizações antigas e só penso nos seres humanos. Ontem vi o filme ‘Nosso Lar’ e pensei em seres humanos. Aqui em casa, neste calor senegalês, ainda assim me descubro pensando em histórias humanas. Com as tecnologias mudamos muito, principalmente, nas formas de nos relacionarmos com outras pessoas, com as coisas ou mesmo com nossos pensamentos sobre diversos assuntos. Aqui na Terra, somos a civilização perdida recortada à francesa de forma desigual. Hoje somos vestígios de nosso passado e ignorantes do futuro. Os mistérios do passado incrementam nossas previsões atuais, por isso são nossas maiores fontes de interesse. Somos genéricos. Somos rascunhos sofisticados. Somos vestígios claros de nós mesmos. Para nós só rotas inéditas sempre e torcer para chegarmos ao fim de cada uma delas com saúde e liberdade. Mas uma dúvida: qual escolher? Para a vida ter graça e gerar quaisquer aprendizados, esta é uma pergunta sem resposta, porque nem sempre temos essa opção. O ser humano vive vivendo o que der para viver no momento em que a vida se torna um leque de trilhas reais. Daí as tecnologias serem importantes: são ferramentas que nos ajudam a criar combinações quase perfeitas às futuras descobertas e podem diminuir os possíveis tsunamis e terremotos que nos assolam. De um processo de degeneração, reverberamos num processo de regeneração com mais conforto e tranqüilidade fazendo ‘plasticidades’ internas e externas sem fim. As tecnologias então nos dão as coordenadas cognitivas necessárias a uma inserção pleno do social e promovem uma absorção plena de informações. Neste sentido, os seres humanos e suas personalidades se inauguram o tempo todo tal e qual as estações do ano e muito de acordo com suas criações tecnológicas. Em cada inauguração, incandescências, reviravoltas, transformações abundantes são desencadeadas, encadeadas e, novamente desencadeadas. Nós temos um roteiro onde o X não marca o tesouro ou o ponto final, mas sim marca nossos próximos passos, experimentações e possíveis reparos. No rastro de nossa evolução, algumas evidências comprobatórias de nossa passagem são deixadas ao léu como os pedaços de pão de Ariadne e estas auxiliam gerações futuras a reconhecer nossa passagem. É a única forma de obtermos reconhecimento. É o único jeito de haver celebração do passado em objetos como enciclopédias, livros, CDs, DVDs, museus, diferentes bibliotecas, fotografias etc. Cravados na história, nossos pensamentos incrementam a capacidade humana de criar e mesmo de destruir. De resto, ‘cuidado com os seus desejos, eles podem se tornar realidade’.

Profa Claudia Nunes

sábado, 15 de janeiro de 2011

SINAIS DO AMOR

Domingo de muito frio. Frio traz certa melancolia e preguiça ao corpo. Mesmo as pessoas mais felizes preferem a quietude do lar e a quentura do cobertor. É um dia para o silêncio de si ou para o amor mais lento, mais simples, mais sensível com o Outro. E o dia segue arrepiando a pele vez por outra de qualquer jeito... Num domingo de muito frio, é o coração que ‘fala’ mais alto. Amor em todos os poros, ou sobre os outros e nossos tantos assuntos da semana; ou sobre ‘UM’ outro seja real ou imaginário. Todo o conjunto do que se chama ‘romantismo’ se materializa. Num dia maravilhoso de frio, nosso coração está amoroso e é puro desejo. Ainda assim, um dia de frio deve ser o início de atenções à atividade que começa a vibrar nas veias e através do sangue. O ritmo está mais lento, é certo, mas é possível sentir momentos sem cor ou espaços vazios nesta corrida de vida. O que fazer? Vozes ao lado dirão: ‘supere!’, não adianta. Vozes do passado afirmarão: ‘experimente!’, é tarde. Vozes dos sonhos lembrarão: ‘acredite!’, é estranho. Vozes do medo suspirarão: ‘cuidado!’, é assustador. O que fazer? Hoje, num dia de frio, é simples dizer: sinta o coração! Mas o que fazer quando a mente cisma em romper a imaginação e segregar nossos mais queridos afetos? Lutar! Nosso coração pulsa o hino dos amores de mil maneiras. Nosso coração baseia a vertencia das felicidades e engrossa o sangue que corre em nossas veias. Capturados pelas emoções, passeamos pela vida acreditando no carinho e no abraço dos outros. O frio da realidade entra em fervura por causa de todos os contatos de pele ou do olhar. Amor é coração! Amizade é coração! E o cérebro é nossa mecânica, nossa engrenagem. Mesmo assim os mistérios continuam. Como agüentamos tantas emoções? Necessidade? Ignorância? Não! Procuramos preencher os espaços vazios em projeções individuais em busca da realização dos desejos, e aí criamos experiência. Saltamos entre êxtases de toda sorte na expectativa de construir parcerias afetivas. Alias as parcerias sempre são afetivas: com carinho, por solidariedade, por amizade, com saudade, para sorrir, pela lembrança, num grande abraço, com licença, por um ‘bom dia’, no toque, no torpedo, no scrap, no telefone, nos estudos, no trabalho, com o vizinho, com seus livros, sua solidão, seu cobertor, a si mesmo, sua vida. E como isso se dá? Por escolhas. Não tem jeito, são as escolhas que nos determinam no tempo, na realidade e na história. Nós temos problemas com o tempo porque esquecemos que ele (o tempo) não é nosso, tem humores e acontece quando deve ser. Hoje, agora, amanha, à tarde, são adjuntos de tempo e como adjuntos complementam os fatos e não podem ser supostos ou previstos na ação do sujeito. Logo, o que melhor fazemos, então, depois de ‘ontem’, é permanecer sonhando e desejando... E o coração mantém sua bombástica relação com a vida. É imprescindível saber que os afetos, os amores e as amizades são para relaxar, são para energizar o organismo, são para iluminar caminhos/mentes radicais. E lembrem-se para que o coração continue ardente de emoções, é preciso ser orgiástico ou orgasmático vez por outra;é preciso aceitar um kit realista por dentro das emoções: choro, amigos, novos amigos, novo guarda-roupa, corte de cabelo e novos olhares, afinal a vida não espera; é preciso estimular os hormônios, ter distrações e manter um sorriso de eterno gozo; é preciso criar limites para gente espaçosa demais e se manter respeitado; é preciso desobstruir as paredes dos vasos sanguíneos: relaxar e ter ataques de riso; é preciso sentir a ‘antioxidância’ de gesto de amor por dia; é preciso se movimentar, sozinho ou acompanhado, bombeando o coração de novidades e surpresas do que for impressionante.

Portanto, AJUDE-SE!

Referência:

Profa Claudia Nunes

MERGULHOS

Num descampado, a luz do céu ilumina cada recanto da mata. As nuvens se embaralham e encantam os passarinhos. Estou andando na grama e assustada com as emoções conturbadas que me atravessam. Há uma desorganização tão grande no meu olhar que as cores da Natureza se esvaem. A loucura das relações me tirou do prumo e, sem poder de escolha, saí a esmo pelas liberdades de um dia desconhecido. Não consigo chorar... Não consigo falar... Apenas um passo de cada vez e as cenas passadas me perturbam e me matam. Não gosto de perturbação... Não gosto dos descontroles... Gosto dos meus pensamentos, limites, sentidos e suspiros. Gosto do que é meu, pronto! Porém, um dia, distraída, fiz uma dupla: alimentei corpo, sangue, dias e mente. O mundo estava dobrado e ampliado: agora, era ‘nosso’. Cada registro era uma surpresa, uma prova e eu acreditei em extensões: meus braços podiam alcançar tudo e a mim sem pudores. Às vezes chamam isso de maturidade. É fácil suspirar a liberdade da cama. É difícil compreender os limites da casa. Eu fui nós, mas, sem reparar ou cuidar dos nós, dei linha na experiência por fraqueza e franqueza: era preciso viver. Hoje meus pés são tristes e meus olhos os acompanham: é o fim. Sem um fato, o processo é incoerente, suado e cheio de desvios de terra batida, sem árvores e nenhum som. Quero ocupar de novo meu lugar de eu, mas me perdi completamente. O labirinto é fechado e eu só posso crer numa salvação sem direção. Eu serei salva? Eu espero... De qualquer jeito, eu sempre espero... É uma passividade ativa: por dentro, no orgânico e no imaginário, há movimentos. A cabeça vai e volta, procurando... O olhar sob e desce, indecente... Eu daria tudo por um espelho: é a calma de antes. Porém tudo está aos pedaços e doendo na pele. De repente, um susto: uma poça d’água me guarda em segurança... Sem ponto de contato ou pensamento, mergulho...

Claudia Nunes

DOR SILENCIADA

Era uma tarde de sábado chuvosa. Em melancolia, a idéia de ficar em casa ganhou em fluxo na cabeça de Ingrid. Excelente psicanalista, ela olha o vidro da janela e vê os tantos caminhos que as gotas de água podem fazer até chegar o seu fim. Cada gota, ainda que comece sua trajetória de maneira individual, para seguir seu caminho, tem que se juntar a outras e aos tantos caminhos que outras já fizeram. As gotas não seguem marcas iguais, apenas aqui e ali aproveitam o espaço desbravado de outras tantas gotas. Interessante as gotas. De sua espreguiçadeira, Ingrid é a gota. Ela está escorrendo e, hoje, sem nenhum controle. Sem querer, ela enfrenta um luto: um luto proibido. De longe imagina: se as gotas me olham aqui, sei que elas não me vêem. Sou também mais uma para elas. Sou parte de um painel cuja passividade ou movimento não lhes diz respeito, nem as impede de ‘caminhar’. Seus caminhos são percorridos à revelia de minha presença. Sou um objeto frio e desconhecido cuja função é nada. Interessante a gota. Hoje eu sou a gota. A chuva aumenta e Ingrid perde a gota. Dor. Tudo se fundiu tal e qual ela. De onde ela está o fogo é imenso. O calor é cáustico. Ela está muito emocionada e não sabe o que fazer com o que lhe aconteceu. Na casa há vozes familiares. Na janela, gotas univitelinas. Dentro dela, a ardência de um luto proibido. Dentro dela, a voracidade do amor estancado por decreto. Eu não quero mais! Ela não quer mais! Prazer de conquistar, prazer de descartar. Eros e Thanatos têm a mesma intensidade e, ali, não estão separados: ela ainda ama demais! Ingrid sabe que seu ponto de equilíbrio com a vida foi decepado. Ela sabe o que fez. Nem o movimento dos olhos distrai sua memória: sou impotente diante do amor demais. A pulsação está vertiginosa e ela tinha que viver isso tudo sozinha, de novo. Fracasso e impotência apesar da decisão tomada estão presentes. Um pensamento: as vozes familiares têm que ser respeitadas. Com uma força sobrenatural, vai até a escrivaninha e se senta. À sua frente, uma foto: o seqüestro de um momento secreto. Ela está invadida pela sensação de morte. Ela se toca e se descobre vapor: ela não é mais ninguém! O único contato com a dimensão pública era seu olhar: impávido e frio. Foram 20 anos de mundos diferentes em que nunca pôde se extravasar porque o julgamento social seria ferino demais. Não podia se inaugurar em ondas emocionais sem construir explicações mirabolantes. Ela perdeu um afeto sempre tão plenamente protegido por decreto. Ela perdeu a energia com a qual se mantinha sã e viva todo dia por respeito. E agora? Sem perceber, chora copiosamente e se diz: amo demais, mas amar é saber o momento de separar. Mas isso não convencia o seu coração, sua pele e seu olfato. O sentido de lateralidade estava perdido e seu labirinto, tantas vezes atravessado, estraçalhado. Isto só deveria acontecer com os outros. Ela deveria apenas falar sobre os outros. Ela só tinha que tratar dos outros. Mas também a finitude está na existência dos outros. Seu corpo já sentia a solidão. Não há o que velar ou enterrar, havia apenas a realidade de um desligamento abrupto: sou, de novo, apenas de mim. E o ‘de mim’ se integra ao mundo cheio de imperfeições: eu não sei o que mais fingir. Ela sabia que tinha que raciocinar e refletir, mas só sabia sentir. A chuva pára. As gotas não correm mais. Ela se deita embaixo do vidro e espera sem esperança. Nem dormir ela consegue. Os sonhos sempre foram bons esconderijos e ajudavam a manter o sorriso social. Mas hoje, Morpheus a abandonou. Ela está sem conforto, no chão, à espera da total inconsciência. Ela tem 34 anos e estava de luto por algo muito desejado. Quais os mecanismos certos para viver isso? Nenhum! É viver ou viver! Suas costas doíam demais. As gotas ‘viviam’ suas vidas com destreza e intensidade porque o tempo não lhes era nada. Sem que soubesse como, se viu sentada na garagem de casa, dentro do carro. De soslaio lembrou-se de suas histórias de liberdade e prazer. Fechada e em silencio, o que mais valiam eram as lembranças e sofria por causa delas. Qual o seu sentido hoje? Só o descompasso do coração e a vertência das lágrimas faziam barulho. A linguagem nunca foi uma opção e nem se ofereceu como amiga. Nunca se deixou ultrapassar por verbalizações porque teria que decidir prematuramente. E isso tudo era só dela, corria nela e sempre se voltava a ela: sua energia vital. Em alguns momentos se sentiu desfalecer, mas estava proibida disso também. Sem mais nem menos era preciso reconhecer, aceitar e lidar com tudo, mantendo ‘o fora’ longe disso. Seu mundo não tinha manchas de quaisquer julgamentos, apenas a força de um desejo, de uma paixão, de um amor vivido com volúpia e liberdade. Nunca sentiu vergonha, raiva, medo ou culpa, mas hoje, além desses sentimentos, ela estava desiludida, solitária e triste. Todo o corpo doía demais! Toda a alma doía demais! Era carga demais! Isso se chama ‘dor silenciada’ - reflete - cujo melhor resquício a se esperar era a amargura... De novo, o choro sonoro... Não há mais segredo. Ela não é diferente. Ela estava turva e sem cor. Ela voltou a ser apenas alguém sem méritos e sem um rosto. Ela começa a se pentear... se pentear... se pentear... passa batom... coloca brincos... acerta o relógio. Demitida de tudo, liga para uma amiga e disse quero lhe contar minha história...

Profa Claudia Nunes

Uma década de informação colaborativa

A Wikipédia comemora 10 anos neste sábado (15). Depois de críticas sobre a precisão de seus artigos, se transformou em uma das principais fontes de informação da rede

REDAÇÃO ÉPOCA

A Wikipédia comemora dez anos neste sábado (15), tendo se tornado um dos site mais importantes do mundo. Durante essa década, a enciclopédia livre foi criticada duramente por conta da confiabilidade e da precisão de seus aritigos - afinal, em tese, qualquer um pode editá-los -, mas cresceu para se tornar parte cotidiana da vida online: um dos dez sites mais acessados do mundo e principal repositório online do conhecimento humano. No fim, imprecisões ocorrem - só que muito menos do que se imaginava, e são corrigidas rapidamente.

Uma pesquisa na Pew divulgada na quinta-feira (13) mostra que 53% dos usuários de internet dos Estados Unidos acessam regularmente a Wikipédia para buscar informações. Isso não é muito menos do que os 61% dos americanos que usam redes sociais com regulariedade, ou dos 66% que assistem a vídeos no YouTube. Claro que a maior parte dos usuários vai apenas consumir informações e não editar a Wikipédia, mas essa é uma característica comum das mídias sociais ou interativas.

A campanha anual por recursos da Wikimedia Foundation, a organização sem fins lucrativos que gere a Wikipédia e seus sites irmãos, como o Wikiquote e o Wikibooks, é um exemplo de como a interação com os usuários da internet tem aumentado. Em 2009, a fundação arrecadou US$ 8,59 milhões a partir de 230 mil doações. Em 2010, foram US$ 16 milhões, com 500 mil doações de 140 países. Esse dinheiro serve para manter a Wikipédia no ar sem a necessidade de propagandas, o único site entre os 10 maiores sem publicidade.

Confira alguns dados sobre a Wikipédia no mundo:

O importante agora é pensar sobre o futuro da Wikipédia. A organização, por exemplo, vai abrir na Índia seu primeiro escritório fora dos Estados Unidos. “A coisa mais importante é aumentar a diversidade de línguas”, afirmou esta semana Jimmy Wales, fundador da Wikipédia. De acordo com Wales, a porcentagem de artigos em inglês já caiu de 30% para 20%. Além disso, Wales espera que o site aumente nos próximos anos parcerias com universidades, bibliotecas, museus e ganhe mais presença na internet móvel.

Como você acha que vai ser a Wikipédia daqui a 10 anos? Ainda vai existir? Para ajudar a pensar, há uma ótima reportagem no Washington Post e a Atlantic publicou textos de grandes pensadores da internet falando sobre o site, incluindo alguns membros do conselho da Wikipédia.

Acessado em 15/janeiro/2011

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

INSENSATO CORAÇÃO

Embora se faça presente de todo jeito, o amor acabou... Embora o choro tenha sido compulsivo, o amor acabou... Embora o tempo traga muitas idades, o amor acabou... Novas direções podem ser escolhidas para viver as permutas do amor: a profissão, a independência, a autoestima, o reconhecimento. Ainda assim tudo isso é parte de um todo esperado, incerto, incompleto.

Sem amor, mesmo transmutado em muitos nomes, a vida é um conjunto de sombras cheias de potencial. Na mesa da boate, diante de um copo límpido de vodka, ela treme com o som potente: ‘não quero pensar!’, ela se diz. Ela rodopia o líquido do copo com o dedo, no fundo de um salão, acima da pista de dança. A cada volta, em cada brilho mais forte, ela se procura, procura uma idéia de felicidade, algo retome sua vida como gostava... como se acostumara...

Ao seu redor, observa o que chamam de emoção, tesão e sedução. Tal e qual as tribos indígenas e seus rituais bacantes, o que ela vê são corpos procurando formas de encontro ininterruptas com muito prazer. O que ela está fazendo ali? Ora, ela também quer um encontro que modifique o que lhe aconteceu. Ela quer o ‘por dentro’ dos sentidos, o ‘por dentro’ de seus vales emocionais atingidos por uma realidade impensada: de novo, ela está sozinha...

Ela não vê as cabeças dançantes, ela vê membros e olhares se tencionando na antecipação do toque mais ‘por dentro’, sem seleções bobas. Ela vê a ocorrência do prazer. Mas o amor acabou... Mas seu amor acabou... Sua luta não tem mais sentido. E agora? Ação ou reação? Anos acreditando em análises, compreensões, silêncios e promessas para, hoje, ter apenas uma rua vazia e mal iluminada para voltar. Nada tinha mais controle e sua inteligência evaporou-se: ela estava em um projeto ‘solo’ novamente...

Na madrugada da boate, o reflexo da vida: turbilhão de desejos, carinhos, frustrações, amizades, descasos, perdas, diferenças sem parada para o raciocínio ou a lógica. Ali e aqui se instala o atemporal cuja ação é não distinguir o que é real e o que é criado pelo pensamento confortável: ‘o que farei de mim amanha?’ e seus olhos acompanham os malabarismos dos abraços sem fim.

Nova volta dos cubinhos de gelo no copo e a música não irrompe em seu coração porque uma certeza fez morada e assumiu o controle de suas emoções. Ela está cansada, mas a certeza lhe ‘alimenta’: ‘ele foi feito para mim! Ele foi feito para mim!’ Seis meses antes, um telefonema: ‘nossa relação acabou!’. Em casa, a respiração fugiu do comum: ‘como assim?’. A ligação foi cortada.

Desnorteada, ela foi a um parque de diversões: ‘eu quero minha alegria de volta!’ gritava ‘por dentro’ e em cada passo. Ela se senta junto à barraca do mágico, olha o alvo dos dardos, fecha os olhos e vai até suas emoções com muita garra. A liberdade forçada quanto à relação, os desrespeitos verbais, as traições antes e agora, dizem apenas que ele perdeu o controle, sujou seu caráter, tem desvios de comportamento e não a quer. Porém (ela se diz), não dizem que a relação é ruim ou que não pode sobreviver a tudo: ‘eu tenho pena dele, coitado...’.

De repente, está de volta aos cubos de gelo, lá está sua ordem, solidez e clareza sobre sua certeza e são suas tábuas de salvação. No guardanapo, embaixo do copo, um plano de construção: ‘quando ele retornar, eu serei diferente, mais amiga, parceira, compreensiva, afinal é disso que ele mais precisa’. A batida da música segue não a deixando pensar. Ela fecha os olhos, sonha e suspira: ‘nossa cama, nossas pernas, nossas bocas, nossas aventuras um no outro... esse mundo é meu!

Ao lado um casal se beija profundamente e seu corpo se arrepia: ‘eu tenho saudade!’ A palavra não sacrifica sua certeza. A ação não arranha o seu sonho: ‘ele vai voltar para mim!’. Os casais mudam, o homem sai e vem outro; noutro momento, a mulher se retira e logo surge outra. As formas de vida se transformam, mas o casal nunca deixa de estar composto. Diante dela, a loucura da conquista com a ‘espetacularização’ dos beijos: ‘ eu não sei fazer isso... eu não preciso fazer isso...’. Sua certeza não aceita mudanças aceleradas. Sua certeza conforta, esquenta, fixa o sonho numa base forte e duradoura: ‘duradoura? Isso! Isso é muito bom!’.

Já no terceiro copo de vodka, ela chora, se sente atropelada pelo passado. Sua certeza está prensada no canto da imaginação. Já em cima da mesa, tem a língua solta, os ‘chakras’ abertos e as divindades ao redor explorando recantos numa ebulição intensa e interior: ‘ela é mais... ela precisa de mais... ela pode mais!’ Diante de anos de contenção, hoje ela precisa da maior erupção que conseguir e o primeiro estágio é o descontrole emocional, é a descompostura social.

As músicas lhe atravessam enfim e começam a ter sentido em seu corpo, mãos, sorriso e vontades. Sai da mesa, atravessa o salão e, eletrizada pela descoberta de si, escolhe e beija vorazmente seu primeiro olhar. É uma loucura, mas há muito tempo ela não sentia a beleza de mãos e boca tentando lhe conhecer e aspirar. Tudo é forte e vigoroso, e ela está ali plena de sua escolha e de seu momento. Ela se esvazia, se areja, se despe, se sente atravessada pelo mundo dos sentidos sem pudor. Quando o tempo passa, ela agradece, nega seu telefone, paga sua conta e vai pegar seu carro. Ela não se vingou, ela se experimentou no desconhecido e se sentiu maravilhada. Seus passos são trêmulos porque não quer saber o que fez, ela sente o que fez, e isto intensifica as cores da realidade e de quem ela pode ser sempre ou quando quiser. Ardor e esperança são suas parceiras de noitada.

Uma música interfere no fio da navalha do prazer, seu fio de prata com o futuro é cortado, é o celular: ‘amor, onde você está?’. Enregelada em fração de segundos, ela responde: ‘Onde você me quiser...’.

Profa. Ms. Claudia Nunes

Nada nunca é igual

  Nada nunca é igual   Enquanto os dias passam, eu reflito: nada nunca é igual. Não existe repetição. Não precisa haver morte ou decepçã...