Uma
palavra tem aparecido muitas vezes em minhas leituras e vida: networking (‘net’
= rede; + ‘working’ = trabalhando). Fora essa mania besta do brasileiro de
utilizar palavras em inglês em suas relações pensando que isso incorpora status
e força ao que se expressa, ‘networking’ representa ‘rede de contatos’ e foi
introduzido ao cotidiano profissional e pessoal pela administração e pelo
marketing.
Em tempos de
muita exposição, muitos ambientes para exposição e pouco tempo para reflexão e
seleção do que / como expor ou se expor, surge o ‘networking’. Novidade? Não!
Apenas outra forma de se sentir incluído em sociedade a partir dos seus
desejos, objetivos e/ou interesses. Estamos falando de ‘relacionamentos’, de
‘rede’, e de como construímos a vida todos os dias, no que percebo, por causa
de interesses. Hoje em dia networking é outra forma de conectividade só que
embutido está o interesse no que o outro pode lhe proporcionar ou criar
diferentes nichos / visibilidades para si mesmo.
É uma palavra
incomoda. O sistema de recompensa e o bolso agradecem, afinal contatos, mesmo
os potenciais, geram possibilidades reais de ascensão, por exemplo, na vida
profissional. Mas será que sabemos quais passos éticos a dar nesse processo?
Será que sabemos organizar os contatos e mensurar suas reais consequências, por
exemplo, na vida afetiva ou amistosa? Será que ganhamos mais do que perdemos ou
seria ao contrário? Realmente networking é uma palavra que me incomoda.
Na vida vamos
conhecendo pessoas e ambientes; emoções e habilidades; e tudo cria uma sinergia
com nosso hipotálamo (gerente da memória), fortalece nossas redes neurais
(inteligência) e transforma nossos comportamentos e decisões (córtex
prefrontal) para que nos desenvolvamos com boas ferramentas estratégicas e
criatividade. Sendo assim, networking
é uma expressão que representa uma rede de contatos e de informações com as
quais interagimos para ter sucesso, tanto nas relações em si, quanto em
ambientes de trabalho. Só que, como tudo realizamos o tempo todo (excesso),
networking em tempo integral coloca o ser humano num outro espelho a olhar para
si mesmo: menos sensibilidade, menos paciência, menos feeling, menos empatia,
menos verdade.
Networking tem
lado bom e lado ruim como tudo na vida.
O lado bom são
trabalhos e atividades que fazem com que sejamos visualizados por pessoas
interessantes e dai surgem grandes oportunidades profissionais e afetivas, além
disso, surgem encontros inusitados e estes causam alteração positiva em nossas
vidas.
Os ‘networkers
‘:
ð
tem
organização e foco;
ð
fazem
planos em médio prazo;
ð
criam
redes uteis de trabalho;
ð
aumentam
seus níveis de influencia;
ð
antecipam
ações, gestos e presenças;
ð
pesquisam
ambientes em que há possibilidade de retorno afetivo e/ou financeiro;
ð
observam
os tempos de forma a reorganização suas redes pessoas e profissionais;
De outro lado,
o lado ‘ruim’, aparentemente (e por isso incomoda), os ‘networkers’ parecem:
ð
perder
a delicadeza, o olhar carinhoso, além do gesto sereno e parceiro;
ð
ter
menos alegria para conviver com as coisas mais simples;
ð
ter
comportamentos mais tensos, atentos à emissão e quase monocórdia;
ð
as
vezes, ser assolados por uma depressão de algo que não tem mais;
ð
ignorar
o outro no processo de conquista / sucesso
ð
perder
a noção de ética, principalmente, com os amigos;
ð
separar
bem ‘insiders’[1]
dos ‘outsiders’ profissionais.
Lógico que,
como afirma Pierson (2010, p.15), “de vez
em quando devemos ampliar os limites de nossas zonas de conforto, mas isso é
totalmente diferente de nos comportarmos de maneiras questionáveis”. É
preciso que o ‘networker’ fique atento ao seu entorno de antes: não há presente
sem passado; e, no passado, sempre estão pessoas que, um dia, foram importantes
nos primeiros planos / objetivos afetivos e profissionais.
Parodiando
Pierson (2010, p.36), a necessidade de conhecer muita gente; de focar-se nas
pessoas de ‘altas patentes’; de acreditar basicamente no poder do networking
constante; de ter o conhecimento de tudo; de conviver apenas com o grupo de
retorno certo (networking); e de acreditar que, no processo, se constrói
amizades; são mitos do networking e
estes não deixam o simples (belo, afeto, sorriso, respiração, olhar, abraço,
beijo) acontecer.
Networking em
excesso transforma os comportamentos relacionais e afetivos; tende a eliminar o
‘feeling’ (sentimento / sensibilidade) e afastar pessoas outrora importantes
porque o foco está em outra dimensão de interesses; causa distanciamento
afetivo às vezes insuperável pela falta de percepção sobre até onde essa
atitude pode alcançar ou o que se pode atingir / a quem se pode magoar com ela.
É uma pena, ainda que seja uma opção e, por outro lado, se pensarmos um pouco
mais sério, um grande esconderijo de si mesmo.
Networking
como mecanismo de defesa precisa ser melhor esclarecido pela psicologia
urgente!
Nunca
estivemos fora da conexão. Conexão é nossa forma de aprender e crescer. Agora
as formas de conexão é que dependem das nossas experiências e dos nossos
objetivos. Nossos afetos e nossas decisões são muito importantes para montar
essa plataforma / suporte de informações as quais acessamos sempre que
precisamos dar um salto profissional ou dar ‘o pulo do gato’ pessoal. E as
pessoas com as quais nos ligamos e lidamos são nossas grandes fontes de energia,
de saber e de sucesso; por isso, é preciso ter cuidado com o networking.
Em cada etapa
da vida, de forma surpreendente ou a partir das oportunidades, nossas conexões
formam ‘networkings’ emocionantes. Mas, de novo, cuidado com o egoísmo e a indiferença.
Há conexões afetivas cujo beneficio está no longo prazo. Não se pode querer
aproveitar do outro indiscriminadamente em lucro próprio. Isso fundamenta o
isolamento e a solidão.
Em muitas
leituras sobre o ‘networking’, palavras como reciprocidade e colaboração surgem
como maneira de frear quaisquer transformações de perfil de personalidade de
quem se dele utiliza por muito tempo. O benefício deve ser mútuo: mesmo com
grande experiência, uma pessoa sempre pode aprender alguma coisa com a outra; uma
pessoa sempre deve procurar momentos de relaxamento total de quem precisa ser
para ser quem realmente é; uma pessoa sempre deve ter espaços para reencontrar
sua essência em ambientes e pessoas afetivas e sorridentes. Filosofia? Ilusão?
Sei lá... Mas bom demais!
Nós conhecemos
muitas pessoas, mas de acordo com nossos desejos presentes ou futuros, é
preciso aliá-las às pessoas certas e convenientes. As competências são necessárias,
mas as habilidades para fortalecer essas competências (espaços, status e/ou
pessoas) são fundamentais. Todos nós precisamos encontrar pontos de referencias
ou nos introduzir em grupos que, potencialmente, nos deem indicações. Só que é
preciso conquistar e manter sem deixar rastros de mágoas desnecessárias ou
inconsequentes.
Quem faz
‘networking’ não pode perder a atenção quanto aos seus contatos presentes e
passados. É uma rede de pessoas para potenciais trabalhos e afetos? Sim! Mas
também é uma rede de pessoas com sensibilidade e expectativas. Foco, atenção e
cuidado faz do ‘networking’ uma ação de qualidade. Tudo dependerá, então, da
aptidão social e afetiva de alguém dentro dos links que for atraindo ao seu
cotidiano. É um pacto quente com a vida, logo é preciso ser eficiente na
construção de relacionamentos interpessoais. Só vivemos o presente. O futuro é
pura suposição.
Segundo
administrador de empresas e palestrante Max Gehringer, networking é
"uma questão de paciência e não de urgência". Na urgência, as perdas
são maiores e mais graves; e o preço das coisas e/ou das pessoas torna-se mais
importante que seus valores.
Parabéns pela
vitalidade do networking em sua vida e cuidado com o tempo de imersão em networkings
em que preço e valor têm diferenças tênues porque, em certo momento, ainda que
com muita gente ou muitos movimentos na vida, pode-se deparar com a aridez e o
silencio de uma casa descolorida e/ou de um mundo cheio de magoados.
Profª
Claudia Nunes
Referências:
PIERSON, Orville. O networking eficaz: como se relacionar com as pessoas certas para
ter o emprego ideal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
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