Depois de anos
em sala de aula, hoje questiono a sala de aula. Trabalho há 23 anos em sala e,
de repente, estou diante de uma geração que não se importa. Isso! Eles não se
importam. O presente é muito insosso, menos para o corpo. Futuro é cheio de
possibilidades apenas na mente. Não observo atitude e/ou objetivo. Não são apenas
os comportamentos cognitivos que estão desorganizados. Mas também suas questões
emocionais, aliás, suas questões socioemocionais. Fragilidade e fragmentação.
Trabalho em
escola pública do subúrbio do RJ com uma faixa etária de 16 a 26 anos. É o
chamado ‘Ensino Médio’ regular (EM). Inovação é a palavra de ordem, mas nem
isso gera atenção. O vão do EM parece ser vivido como grande obrigação senão
‘não serão ninguém’. Inovação é a tônica e estudo constante, mas parece que
nada os atrai, satisfaz ou diminui a tensão. Suas rotinas de vida são muito
tensas (comunidades parcialmente violentas) e/ou sem graça (sedentarismo
total). Por que se importar?
Sala de aula
tradicional, em sua maioria. Cadeiras enfileiradas, às vezes. Conteúdos sendo
oferecidos de muitas maneiras. Professores repensando práticas. Mas alunos
desatentos, desinteressados e agitados. Tempo de escola é bom. Mas a escola não
importa. Eles não SE importam. O que vale é o social. Estar na escola para
criar relações de todos os tipos é o que vale. ATENÇÃO só serve para isso: quem é quem? Quem está afim de quem?
Quem ficou com quem? E a sala de aula cognitiva torna-se um campo de conflitos
e desavenças. Armas antipedagógicas são arma para o silêncio, o controle e os
limites. Sua utilização aumenta muito. Desatentos, eles têm diálogo difícil; e
não se importam. Ignoram valores para suprir inseguranças, fragilidades e
ignorâncias. Exposição para o social, nunca para o aprendizado por que eles não
se importam.
Sala de aula é
sala de convivência sim; mas dos interesses pessoais e lúdicos; não das
necessidades cognitivas para conviver fora dali como sujeito social
equilibrado, empático e empreendedor. Aliás, fora dali, a escola não importa
mesmo: eles vão sem lápis, caderno e/ou uniforme e se incomodam quando são
chamados atenção. O tempo da escola é marcado: de 18h40 até 22h é escola; de
resto, é pura vida sem importância ou para suprir suas necessidades. Não
importa o outro ou o amanhã.
Cadê os
sonhos? Cadê os desejos? Cadê os objetivos? Para que estudar? O que fazer
depois de formado? Não importa. Agora, não importa. Agora, a ‘boa’ é atender
amores, alguns trabalhos, relações, músicas, celulares, baladas, futebol e, às
vezes, família, se não for complicada demais. De resto, nada importa.
Sala de aula
confusa. Revista em sala. Dificuldade em compreender etapas do trabalho.
Dúvidas, dúvidas, dúvidas. Eles não me ouvem. Eles não se ouvem. Não importa. Penso
em atenção. A mágica da atenção é o toque de Midas do ensino hoje. Ponto de
mutação entre o ‘não importa’ e o ‘importa muito’. Os sons do silencio interno
não acontece, nem em grupo. O celular é mais atraente. O futebol é mais
importante. A roupa da festa é mais legal. Atenção, tudo é atenção. Observo e
penso: o som é ruidoso e ele atrapalha. Será? Na vida, o som é duro, intenso e
constante. Vivemos no meio dele e precisamos criar estratégias para nos focar e
aprender, apesar de. Abstrair e aprender importa muito.
Como afirma
Goleman (2013), aprender diante de sons intensos significa a presença de atenção seletiva “(capacidade neural de mirar em apenas um alvo, ao
mesmo tempo em que ignora um mar atordoante
de estímulos chegando, cada um sendo ele próprio um foco potencial)”. Meus
alunos tem essa habilidade? Não sei... Como eles não Se importam, atrair ideias
e pensamentos tem sido uma luta dura. Não escrevo sobre barulhos que eles
mesmos fazem em sala junto aos colegas: são adolescentes; escrevo sobre sons de
tiros terminando a aula no meio da noite; sons musicais altos demais nos
ouvidos; sons emocionais tóxicos em família; sons de enfrentamento junto à
direção ou aos professores; sons de baixa autoestima rotineiros: enfim, sons
tóxicos que reprimem sua própria humanidade e que estimulam seus cérebros
primitivos para sobreviver.
Segundo
Goleman (2013), há dois tipos principais de distrações: a sensorial (aquela em que você lê algo, mas abstrai sons externos,
cores ao redor ou outros estímulos quanto a sabores, cheiros, sensações tácteis
etc.) e a emocional (mais
desanimadoras porque os estímulos surgem carregados de informações e não há
como abstrair: ao responder um e-mail, alguém chama seu nome, ai é impossível
manter o foco: algo se perde no e-mail).
Para aprender,
então, não é possível a presença constante do ‘tumulto emocional’. Algo que vai
além da dinâmica da sala de aula diante de quaisquer áreas de saber. Meus
alunos não se importam porque, inconscientemente, se percebem invisíveis e
convivem com dinâmicas emocionais que não pedem licença para desorganizar seus
pensamentos e por fim seus comportamentos. Meus alunos não importam porque há
uma emoção premente desde cedo: o INCÔMODO. Meus alunos não se importam porque
são incomodados. “A linha divisória entre uma ruminação infrutífera e uma
reflexão produtiva está no fato de chegarmos a alguma solução experimental ou
algum insight que nos permita abandonar esses pensamentos — ou se, por outro
lado, simplesmente continuamos obcecados em torno da mesma preocupação”
(GOLEMAN, 2013). Será que meus alunos reconhecem essas opções aos seus
processos de aprendizagem? Não sei... Eles não se importam.
Atenção
relaciona e equilibra diretamente FOCO e CONCENTRAÇÃO. É uma tríade fundamental
à IMAGINAÇÃO e CRIATIVIDADE. Mas eles não se importam. Ansiedade, alerta,
insônia, desequilíbrio emocional criam uma sala de aula às vezes reptiliana, às
vezes límbica, quase nunca pré-frontal, ambiente da capacidade humana de manter
o foco; ambiente que favorece o desejo de se concentrar (realizar as atividades
escolares) e a decisão de ignorar os ruídos externos ao redor. “Como o foco
exige que abstraiamos as distrações emocionais, nossa estrutura neural para a
atenção seletiva inclui a inibição da emoção. Isso significa que quem tem
melhor foco é relativamente imune a turbulências emocionais, tem mais
capacidade de se manter calmo durante crises e de se manter no prumo apesar das
agitações emocionais da vida” (GOLEMAN, 2013).
Só que meus
alunos não se importam. Suas mentes se perdem. Suas emoções ganham ansiedade
crônica. Seus comportamentos tornam-se disfuncionais. E a noite termina com
broncas e ações antipedagógicas (reforço negativo): alunos fugindo da escola,
alunos fora de sala e/ou alunos proibidos de participarem das atividades
seguintes.
Não sei o que
pensar... Preciso pensar... Eu ainda me importo...
Profª
Claudia Nunes
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