segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

ENCRUZILHADA (183)


183 Encruzilhada Espaço que apresenta muitos caminhos. Caminhos demais... Quais são os rumos da vida? O que fazer agora? Qual o sentido de ser o que é? Valeu à pena? Depois de anos, o olhar de Julia estava embotado de dúvidas. Ela enxergava o de sempre, mas o de sempre não servia mais. Sentou numa esquina e pediu um café. Nem a leitura caberia nesse momento: nada mudaria seu momento. O cheiro do café a fazia apenas fechar os olhos, o que estremecia seu corpo. Sem olhos, o que fazer? Como fazer? O cheiro lhe apartava do corpo, mas não lhe tirava a verdade: ela estava se estranhando e colocando em xeque o próximo passo, o próximo ano, os próximos movimentos de vida na vida. O cheiro de café... Que interessante o cheiro de café. Em uma encruzilhada de emoções, o cheiro de café acalorava seus sentidos e seus pensamentos. Mesmo assim, a encruzilhada incomodava. Ela se sentia escapando e suas mãos não alcançavam nada firme. Firmeza seria algo muito confortável. Ela tinha formação, tinha certeza, tinha postura, mas algo faltava... Cheiro de café e 50 anos. Sim, Julia tinha 50 anos e estava à beira de mudanças que não conhecia. Não estava devastada, chateada, triste ou deprimida, apenas queria entender os próprios sentimentos estranhos que lhe assolavam: que caminho tomar? O amadurecimento causa isso: crise, critica, dúvida. Racionalmente tudo estava bem, porém além do cheiro do café havia uma brisa diferente e isto que a distraia da própria rotina de ser e estar. Enquanto engolia o café, pensava: ‘para onde ir? Como começar? O que escolher?’ Seu baú de guardados mental estava revolto; a memória não tinha mais portas fechadas; os sentimentos estavam lhe sobrevoando a mente e o corpo; e o cheiro de café a mantinha em bases conhecidas e isso era importante. Na rua, os carros passavam e buzinavam; as pessoas caminhavam e conversavam; as luzes e as cores estavam por toda parte; mas ela só tinha a certeza do cheiro do café e da sua insegurança: quem era ela afinal? Aos 50 anos, profissional, ativa, motivada, de repente estava pequena e sem decisões. Sua encruzilhada era enorme, silenciosa e solitária. Julia e a encruzilhada. Julia, encruzilhada e o cheiro de café. Tem gente que, aos saltos, promove mudanças inigualáveis porque não tem tempo para pensar. Ela tinha. Julia tinha tempo para pensar. Sentada à beira de um bar, tomava seu café e observava a fumaça. Para onde ela iria? Julia não sabia. Sabia apenas do movimento. Sim, diante da encruzilhada, o movimento precisava acontecer: pensar, rearrumar, reorganizar, agir e mudar. Na encruzilhada, ela tinha tempo para pensar nesse movimento, sem prisões, em silencio e com interesse em se transformar e sem deixar nada debaixo do tapete. Julia queria detalhes, queria desesperadamente imprimir novas marcas à sua vida, queria mais vitalidade em seu SER. No cheiro do café a procura do brilho dos olhos diante das cores de um novo despertar. E ela permanecia sentada. A volúpia do mundo a cercava; mas ela estava atraída por um cheiro de café tão promissor. E a noite caiu. Segunda xícara de café, ela precisava de decisões: 1 mudar sua rotina interna; 2 experimentar novos sentimentos; 3 permitir-se outras atitudes / pessoas; 4 viver em outros ambientes; 5 criar estratégias de desapego; 6 encarar os dias de forma positiva; 7 ter mais sabedoria diante dos obstáculos; 8 eliminar julgamentos / preconceitos; 9 viver o presente do jeito que vier; 10 conhecer e reconhecer o momento SIM e o momento NÃO consigo e com os outros. Julia anotou tudo num guardanapo. Era o seu mapa; sua forma de sair da encruzilhada; e seu jeito de manter o movimento em busca de si mesma. Estes seriam os pontos básicos de sua travessia e sua forma de encarar o livre arbítrio. Julia e sua encruzilhada escutaram sua mente e se libertaram de seus medos. Julia e a encruzilhada negam a realidade idealizada e foram ali realizar e viver. Julia e a encruzilhada: por favor, traz uma xícara de chá? Estou com fome...                    Claudia Nunes

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