domingo, 27 de dezembro de 2015

NIX, o valor da noite (186)

186 NIX, o valor da noite Depois do princípio, só restava a noite. NIX foi embora e ninguém poderia ajudá-lo. Ele não queria dormir. Ele tinha muitos afazeres, mas hoje ele não queria dormir: tenso. Sua mãe ligara preocupada com seu comportamento no jantar de família: ele ficara na sala lendo e escutando musica por horas. NIX o deixara sem função e ele não queria dormir. Havia uma vitalidade na noite que ele queria viver e sentir. Só que a família impedia e não havia como sumir; como não dar explicações; como ser ‘de repente’ outro alguém. NIX fora embora sem deixar rastros, apenas marcas duras no coração, no apartamento e nas memórias. Em sua maturidade, ele não queria dormir mais. Havia um sentido em dormir: perda de tempo, de vida, de chão, de luz. NIX representava tudo isso. Anos vivendo um grande amor dia e noite; e agora só restavam os dias. Como são tristes os dias sem NIX, sua noite mais iluminada. Inteligente, livre, solteiro, ele sentia que, nas noites, ele era alguém muito especial e ajustado. Seu trabalho exigia atenção e interpretações constantes: era economista e literato. Ele era o dono dos números e da imaginação. Mas, ao mesmo tempo, era um desajustado: o dia lhe dava incômodos, febres, inutilidades. Ele estava sem graça e queria NIX de volta. Seu ‘mundo melhor’ era escuro, intenso, controlado, mapa de um tesouro perdido: outros mundos mais razoáveis. Ele se sentia assim: de outros mundos mais razoáveis. E, na noite, sabia vive-los sem cortes ou edições da tal personalidade e como expressão dos ‘n’ convívios tão ignorantes. Noite! NIX! Noite... Ele não queria que seu hipotálamo fosse tão exigido; ele queria o controle; e apenas um tempo para ajeitá-lo. O dia tinha falta de segredos; incluía enfrentamentos; buscava esclarecimentos; oferecia escolhas demais; não admitia blefes sociais estratégicos; mas a noite... 

Ah, a noite! Ah, NIX! Esta tinha um glamour como cobertores que surgem quando estamos com frio e com preguiça de levantar. Depois de um dia de trabalho, ele abria a porta de casa e NIX ocupava tudo: geniosa, quente, sorridente, brigona, elegante, cheia de complexidades, ela gingava pelos cômodos e lhe energizava de cheiros e sons. A noite era a sensação de calor, de força, de solidão, de tentativas sem erros criticáveis, de surpresa, de muitas promessas; é tempo para viver o pensar e agir sobre esse pensar sem vozes, ruídos ou toques inesperados ou inconsistentes cuja alteração o tirava do prumo e da própria consciência. Ele vivia o sol; mas a noite era para ser sentida sem apagamentos. Em casa, ele ligou o rádio, acendeu um incenso, fez um café e sentou em frente ao seu notebook. A vida precisava começar. Ele sabia que como humano e com um hipotálamo perfeito só tinha duas opções: saber como se manter alerta (dia) e quando é hora de descansar (noite) sem NIX. Mas, além de descansar, a noite tinha a graça dos prazeres disfarçados no dia: é a chamada ‘asas à liberdade’. Ele tinha outro sono; tinha um acordo com Morpheus; optou por outros padrões de vida e de noite; tudo porque NIX escolhera o anonimato dos dias mais distantes sem sua companhia. A noite, então, se abria às propostas de mudanças e aos riscos da maturidade. Estamos propensos às adaptações e vulnerabilidades quando sozinhos? Não! NIX é nossa maior popularidade porque, com ela, sonhamos e criamos objetivos. NIX propunha mil recursos e os desejos pareciam muitos naturais e viáveis. O mundo sem NIX estava parado no dia sem noites. Ele não sabia como resistir à depressão. Ele se cansava, vivia mais devagar e perdia a espontaneidade. O coração pulsava em outra ordem e a sonolência da morte em vida o abraçava calmamente. Onde estaria NIX? Em seu notebook, uma mensagem: como vc está? Ufa! Que alegria! NIX voltou. Ela voltou. Sua deusa voltou e tinha um sorriso maravilhoso. Assim era a noite e sua NIX. Depois do caos, ela emergiu do vazio, sem melancolia ou palidez; era forte e incansável; era mágica, cheia de mistérios e segredos. NIX era sua vitalidade e seu encantamento. NIX, a indomável e sua esperança. Sem mais, refeito da sensação de perda do seu WI-FI, ele tomou um banho e começou a trabalhar: a noite era mesmo uma criança... Claudia Nunes 


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