175 Sou
o tempo do ‘sou’, do ‘soul’, do sol
Embora
tenhamos o tempo como tempo de vida, esquecemos que o tempo também é tempo de
morte. Nunca o tempo será amigo se não nos dermos tempo de autoconhecimento e
sorrisos. Sim, sorrisos são fundamentais no tempo que o tempo tem para nós. Sem
tempo, dissipamos, inutilizamos e engessamos o tempo que o tempo tem para tudo.
O assunto
tempo torna-se pedra no sapato: e, no tempo, matamos leões e cordeiros além do
tempo. Sem a lua ou o sol para energizarem as emoções e os passos, o tempo traz
a luta das cobras: tempo da inutilidade, afinal, venenosas ou não, todas as
cobras morrerão entrelaçadas, sangrentas e coletivas apesar do tempo que o
tempo tem.
Eu sugiro o
seguinte: sorriam e amem.
No tempo que o
tempo tem, aprendam a diluir as dores e as delícias das relações sem tempo para
ser triste. Ser triste é realmente perda do tempo que o tempo tem para nós: não
vale a pena! Pense em tempo, com tempo, no tempo e dê um tempo.
Hoje a idade
está avançada e contraditória: é fonte de frescor e de frescuras com enorme
tempo de se reviver ou se matar. Nós nos envolvemos com desejos e crescemos
indesejáveis perdendo tempo com amores sem tempo ou amizade limitadas por um
tempo, antecipadamente, adjetivado: interesseiro.
Eu queria a
paz do silencio das pequenas solidões, mas não sei viver sem os barulhos das
grandes multidões; então não entendo privacidades ou imunidades dentro do meu
tempo. Esses esconderijos ignoram o tempo da experiência e da aprendizagem
dentro de uma bolha de tradições e frivolidades de outro tempo.
Entendo
valores como respeito, apreço e endereços afetivos para salvaguardar também o
meu tempo. E as cartas dos baralhos se desmancham lindamente: são os jogos de
paciência do tempo. Elas não caem, elas se desmancham mesmo e ignoram
territórios, certezas e constelações de tempos sem tempo para ter tempo para a
vida do tempo.
Sentada à
beira do rio, minhas pernas estão sem sentidos, sem paz e sem tempo. Repasso a
vida diante da verdejante loucura das ignorâncias e das invasões de todos com
todos com tão pouco tempo. É difícil pensar no tempo sem tempo para pensar no
tempo.
Penso em
generosidades, em educação, em delicadezas, em elegâncias e me assusto pensando
em pessoas que perdem seu tempo com o tempo alheio. Oh raça ruim! Oh raça
complexa! Oh gente bacana!
O rio passa
sob meus pés e suas águas me arrepiam: no tempo, preciso enxergar além dos
medos que o tempo me trouxe. É difícil. É uma questão de generosidade comigo
mesma, ainda que misturada com uma personalidade que só eu e o tempo sabemos
entender. Não vou escapar de mim, mas a invisibilidade do caminho das emoções é
minha maior inteireza no tempo que me resta. Sou o que sou porque o tempo me permitiu
assim.
Lavando os
pés, pegando a roupa, caminhando por todo tipo de estrada, a vida torna-se
plena sem que eu perceba porque o tempo não é material; ele me leva como
passageira em ventos que nem tem tempo para me sentir, apenas tocar.
Ao olhar a beira
do rio e as beiras do caminho, sei que o tempo é uma ilha enevoada em que a
minha participação monta um quebra-cabeças de quem sou no tempo que tenho para
ser quem sou.
Eis o meu
segredo: sou o tempo do ‘sou’, do ‘soul’, do sol.
É luxúria
isso? Que bom!
Sou o que sou
no tempo que tenho para ser o que sou sem ninguém ter o direito de dizer quem
sou no tempo que tenho para ser quem sou.
Luz, sombra e
meu ego são o que sou no tempo que tenho para ser quem sou.
Fui... Claudia Nunes
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