Em tempos de calor senegalês, Aurora
tomava vários banhos curtos ao dia. Seu ar-condicionado estava com problemas e
ela estava sem grana para consertá-lo. Daí nos dias e noites de calor, a opção
eram os banhos refrescantes que lhe davam, pelo menos, duas horas de sono
profundo. Ela se sentia cansada. Como um bebê recém-nascido, ela acordava
várias vezes, à noite, para tomar banho ou como dizia seu pai: ‘para jogar uma
água no cadáver’. Em um desses momentos, ela olhou para o chuveiro e pensou no
banho. Pensou? Como assim? Banhos são para se tomar, não para se pensar. Mas
ela sentiu e pensou: quando a água tocava e escorria pelo seu corpo, havia uma
mudança, não apenas de temperatura, havia uma transformação de humor. É prazer,
é satisfação, é harmonia, é vitalidade. E como tudo, no banho e na vida, essa
mudança tem um tempo e este precisa ser bem usado com equilíbrio e para o
relaxamento mental. Às 4h da manha, sem culpa nenhuma, ela incluiu a cabeça
nessas águas e o corpo arrepiou. Ela pensava em livramentos, alegrias, família,
soluções, amores, sonhos etc. De repente ela pensava em cores: o calor a
tornara vermelha; o banho lhe deixava azul, verde, amarela, branca de paz.
Enquanto a água escorria, sua aura vibrava, se movimentava e se modificava: ela
estava em sua própria luz plena de energias. Será era isso que significavam as
férias; os feriados prolongados; um mergulho num piscina enorme; uma risada de
um amigo sábado à noite; um por do sol no Rio de janeiro; um tempo de meditação
ou reclusão; um amor incondicional; um objeto novo; um café com leitura ou com
bobagens? No banho, tudo isso, é verdade e faz o corpo tremer. Para haver
livramentos e paz, o banho é o início de uma varredura interna que estabelece
outro padrão corporal, emocional e físico. Ela não queria mais sair do banho.
Ela almejava a purificação total. Que soberba! Não há paz, harmonia e
equilíbrio totais ou por tempo indeterminado: banho também é pensamento e este
pode ser atravessado por diferentes nocividades: parte de quem somos e parte de
quem decidimos ser. Então por que o banho é bom e importante? Porque muda as
rotinas cerebrais e nos prepara para compreendermos quem poderemos ser em cada
tempo de prazer que tivermos. É um luxo humano, muito humano: é pensar sobre o
pensar o sentido de um banho para pensar a vida. E o tempo passa... E o banho
continua... Mas só a água não resolve: a água apenas estimula, abre caminhos,
inicia o contato primordial. É preciso esforço para que tudo termine bem.
Aurora resolveu lavar a cabeça e usar o sabonete: todos nós precisamos de
recursos para o sucesso, a alegria, a conquista, o aprimoramento de nossos
desejos. Desejo e imaginação. Desejo, imaginação e estímulo. Desejo,
imaginação, estímulo e esforço. Para se refrescar é preciso suar, suar muito...
Aurora estava formando hábitos. Aurora criava mundos, tempos e ideias em sua
mente e em seu corpo para uma reconexão com sua realidade: era um banho com a
sensação de proteção. Mas tudo, na vida, tem um fim. Não há começos ou
recomeços sem um fim. Era hora dos fechamentos. Era hora de decidir terminar e
começar outra trajetória por outros caminhos. Aurora resistia e se perguntava:
por que / para que se sujar novamente? A vida, com assepsias tão densas, é
muito melhor e eficiente. A água continuava lhe dando prazer e volume de
possibilidades. Mas isso não era normal, ela sabia: para se reconhecer a
beleza, era preciso ter vivido a feiura; sem isso não havia como crescer e ser
feliz. Sem ninguém ao seu lado ali ou depois, Aurora retomou sua vida, seu
corpo, suas emoções e seu banho; e fechou o chuveiro. Não havia mais águas, não
havia mais refúgios, não havia mais desligamentos. Ela abriu os olhos e encarou
seu banheiro: vida cotidiana e um calor senegalês, outra vez. Só que ela estava
diferente: ela estava fria; ela ainda estava em perspectiva e com outra
dimensão curativa (?). De olhos abertos, ela encarou a toalha. Agora a vida era
irrecusável, então o jeito foi respirar profundamente, pegar a toalha, secar e
colar as energias e, de novo, enfrentar o mundo com roupa, reza e coragem... FELIZ 2016! Claudia Nunes
O mundo é desconhecido e estou desbravando a mim mesma para aceitar o mundo como ele é. Como professora (Estado), Tutora em cursos de EAD, Revisora de Material Didático e MESTRE em Educação (UNIRIO), estou seguindo a vida fazendo o que gosto, como gosto e com quem gosto muito. Escrevo e publico textos para me esvaziar de mim e poder aceitar o Outro como vier. De resto meu vicio é o mundo virtual, ainda que eu nao seja dissimulada. Mutante? Isso! Eu gosto de ser mutante!
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