Mais um dia observando a casa vazia. Mais um dia especial nada especial. Desde cedo, Sancha não conseguiu sair de sua cama. Luz do sol. Silencio em casa. Vazia de alma. Sancha respira profundamente e pensa no passado. Um passado em que a mesa da cozinha nunca estava vazia ou em que sua casa tinha movimentos intensos e variados. Ah havia sempre música. Muita música.
Hoje é Páscoa e seu presente é o
silêncio. A passagem de mais um dia de silêncio. Lá fora: Jesus, crucificação,
ressurreição, reis magos, libertação, anjo da morte, passagem. Dentro de sua
casa e mente: saudades, lembranças, silêncio, mesmice. Sancha não era
religiosa, então, para seu autocontrole, sua mente corre ao passado para
entender o presente.
Mesmo depois dos 50 anos, cadê a
blusinha de presente escondida para brincar de quente e frio? Sim! Em sua casa,
Páscoa, Cosme Damiao e Dia das Crianças sempre foram lembrados com risos de
criança. Da cama, ela olha ao redor e... nada... ninguém. Nada diferente em
volta. A porta não vai se abrir para ela escutar: “Oiiiii!! Não vai levantar
não??? Já fiz café!” Não há barulhos na cozinha. Não há surpresas no celular. É
o sol, a casa, a cama e ela.
Ela lembra: Páscoa como passagem.
Jura? Passagem de um tempo a outro muito sem graça, sem destino, sem
liberdades, sem o beijo da manhã avisando: “café está pronto, cortei o abacaxi
e fiz arroz; to saindo para Sueli, ou Norma, ou Graça. Elas me chamaram para almoçar.
Passa lá depois”. Sancha, de novo, chora. Essa passagem é uma dolorosa.
Páscoa = passagem. Passagem para o
novo mundo; para uma aventura ‘fênix’; para dias bobos; para falta de sorrisos,
agitação, cuidados e segurança; mas também, para aprendizados. Sancha se sente
muito só. Esta é sua passagem para ressurreição sem celebrações; é ressurreição
por obrigação ou para sobrevida. No celular, muitos afetos, muito carinho,
muitas palavras; só que tudo isso não preenche o silencio dos últimos 5 meses.
E ela sabe disso.
Sancha sabe que seus sentimentos
devem ter a durabilidade de uma decisão e uma ação. Mas só hoje, só por hoje,
Páscoa = passagem de uma dor para outra dor sem remédio, sem compreensão e sem
paz. É um sacrifício imposto sem piedade. Sancha não tem força para se
levantar. Então, ela se deixa levar. Não tem jeito. Ela sonha e lembra: a força
fundamental de uma vida é saber vive-la em toda a sua intensidade. Assim viveu
sua mãe. Assim Sancha vai aprender a viver.
“Levanta-te e anda”! A vida não para
mesmo.
FELIZ PÁSCOA a
todos
Profª Claudia
Nunes (04.04.2021)
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