Da mesa da sala
de aula, a professora observa seus
alunos de forma diferente. No repentino silencio daquela hora, eles estavam
diferentes mesmo. Ontem, alunos agitados; agora, em grupo, focados e
desenvolvendo uma atividade. Mesmo dentro de um contexto de violência grave,
eles tinham condições de fazer a diferença. Eles só não sabiam disso. Eles
foram influenciados por um meio ambiente preconceituoso e ignorante. Sem
parcerias emocionais coerentes e adequadas, eles chegaram aos 18 anos com
poucas chances de realizar metacognição (pensar sobre o pensar) e elaborar seu
tempo com mais habilidade. Eles mal se conheciam. Suas potencialidades foram,
por muito tempo, alijadas para segundo plano: eles foram invisibilizados desde
o nascimento e tinham pouca consciência disso.
Será que é
possível tocá-los de modo especial? Que tipo de encantamento lhe daria o up necessário ao autoconhecimento e
autossuficiência de uma vida em sociedade? A
professora não sabe. Ela não tem resposta. Ela só precisava lhes dar
qualidade cognitiva. Mas ela estava chateada. De repente, ela estava muito chateada.
Qualidade cognitiva ignorava seus mecanismos emocionais; suas rotinas de vida;
seus múltiplos saberes; seus sonhos e desejos. Tudo isso foi tão encoberto por
tantas influencias desajustadas que seus comportamentos exprimiam mais
frustração (pelas indiferenças e indisciplinas) do que resiliência ou
superação. Eles perderam o ponto da vontade muito normal na adolescência: o
ponto do sonho.
Como restaurar
seus sonhos? Como remexer em suas emoções e fazê-los desacreditar de tudo o que
disseram para eles, sobre eles, a vida toda? A professora não sabia. Eles apenas sobreviviam; tinham poucos
objetivos, muita insegurança e medo; eram solitários apesar de se socializarem
muito bem. O que seria deles daqui a dez anos? A professora não sabia. Alguém precisava surgir como exemplo na
vida deles: devia ensiná-los a lutar, a superar, a fracassar e levantar, a
pensar, a entender que o tempo deveria ser aproveitado para viver consciente de
si e dos outros sem tanta ansiedade. Eles deveriam entender que, em um futuro
próximo, eles poderiam atuar como cidadãos e iniciar mudanças importantes na
sociedade. Mas o número de experiências a que tinham acesso não criava memórias
positivas. Eles viviam o conturbado \ o caos \ a sobrevivência.
Será que eles
sabem que a vida deles tem real importância? Será que eles entendem o termo ‘valorização
pessoal’? Será que sabem que o controle do tempo... do próprio tempo... está em
suas próprias mãos? A professora não
sabia. Ela os olhava animados, conversando, rindo, produzindo, e não tinha
resposta para nenhuma dessas perguntas. Ela estava triste. Como é difícil ser
jovem de comunidade hoje! Livros e livros de autoajuda surgem como grandes
solucionadores da vida tóxica das pessoas. Mil regras e estratégias são criadas
para proporcionar realização de vida em diferentes setores. Mas e aqueles
jovens? A professora os olhava e sabia:
ATENÇÃO.
Ninguém lhes
dava atenção e eles não tinham atenção. No círculo vicioso, o vagalhão atenção,
foco e concentração perdia força na maré de exigências, obrigações,
preconceitos, violências, fome, ignorância, e os incapacitava a ‘ser gente’.
Exemplo, atenção, foco e concentração, palavras que mobilizam memória,
linguagem, raciocínio lógico e funções executivas: todas relacionadas às
funções cognitivas.
Aos 18 anos,
como focar em sonhos e desejos se o estofo, os comandos, o chão, a família não
lhes dá segurança para experimentar suas potencialidades para talvez errar e
voltar para começar de novo? Para essa
questão a professora tinha resposta:
eles deveriam aprender a entender a si mesmos; deveriam se conhecer realmente;
deveriam entender o que os leva a fazer o que fazem e se isso é tão importante
para suas vidas. Eles devem se questionar sobre como seus atos, hoje, pode
reverberar em seus objetivos de vida. Eles devem aprender o autoconhecimento
para moldar o próprio destino. Todos têm talentos, habilidades e estas precisam
ser estimuladas e exploradas para autossuficiência futura.
Com certeza,
eles não têm as mesmas oportunidades que outros jovens, até mesmo de outras
comunidades. Mas precisam aprender que oportunidade é algo que se conquista com
muito esforço e só um pouco de sorte. A
professora sabe que isso não é fácil. Mas encantar e despertar outros
comportamentos emocionais e cognitivos exige pequenas mudanças nas formas de se
relacionar e no volume de informações a que estes alunos têm acesso.
Fim da aula. A
professora, agora, sabe de algumas coisas cuja palavra de ordem era DESAFIO.
Seus alunos precisavam de desafios. Desafios de seu tempo, para suas mentes,
com suas imagens, seus saberes, suas emoções, com a força da verdade, de forma
a provocar a vontade de mudar. Acreditar, desejar, crescer, guiar,
experimentar, palavras que os destinarão para sua própria grandeza: a grandeza
do seu desejo \ sonho.
Próxima aula:
roda da verdade: quem é quem no jogo da vida em sociedade? Vamos explorar as
sutilezas dos sonhos mais guardados da vida de uma pessoa e pensar em como
conquistá-los a partir de valores sociais fundamentais. Não é possível
desperdiçar tanta juventude num tempo só.
Profa
Claudia Nunes (22\10\19)
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