sexta-feira, 3 de abril de 2020

QUARENTENA: adaptação e mutação positiva



Então o mundo parou. Parou para se olhar e se proteger. Um pequeno animalzinho exigiu parada quase total da humanidade. Em nossa loucura de vida e de destruição, criamos muitas doenças e armadilhas e agora quarentena. Nós desorganizamos a Natureza. Nós construímos prédios para tocar as nuvens e lixo a perder de vista. Não sabemos o que temos em nossos armários mentais, tal a bagunça emocional; e seguimos ignorando o outro, suas necessidades e deficiências. Nós inventamos a idéia do ‘eu-sozinho’. Agora, um vírus fez parar tudo por medo. Aos nossos olhos, nosso medo maior: a morte. Nós desenvolvemos altas tecnologias: de nada adiantam. Agora, só as mentes humanas para criar ou inovar medicamentos. As tecnologias voltam ao ponto de partida: simples recurso. E nós, isolados e em casa. O vírus fez casa lá fora; e nós encapsulados aqui dentro. Nós, os racionais, os inteligentes, os criativos, os donos do mundo, temos que ‘arregar’ e aguardar a passagem dessa onda soberba. A onda passara no tempo dela. Nem deu tempo de marcar as portas com sangue e impedir mortes, agora, dos mais velhos e não dos primogênitos. Nem o divino quis nos avisar, afinal, fomos nós que produzimos a morte ao longo do tempo e agora ela invade lugares e corpos, abusada e incólume. E nós, em casa, escondidinhos, aguardando esse tsunami tóxico passar sem alcançar nossas frestas cheias de orgulho. Que coisa! Que tristeza! Que angústia! Que ansiedade! De outro lado, é tempo de conhecer a própria casa e as pessoas que vivem nela. É tempo de cuidar e cuidar muito. É tempo de ver os mais velhos, de novo, como centros do universo e exemplos e vida. É tempo de reclusão para outra evolução: a dos sentidos mais empáticos e solidários. Não dá para beijar e abraçar; mas dá para sorrir, acenar, ajudar, cantar, limpar, limpar e limpar em silencio e sem a aproximação latina. Que loucura! É uma viagem assustadora. Quem somos nós mesmos? De novo, a pergunta da humanidade. Somos sociais, dizem, mas perdemos o rumo dessa certeza em algum ponto da história. Encarcerados devemos respirar com calma; interagir sem mãos; proteger sem proximidade; reconhecer sem abrir a boca. É o tocar sem tocar e, ainda assim, afetar positivamente. É uma viagem louca. Estamos parados no tempo vendo o sol ir e vir sem vivê-lo ao relento do bate pernas cheios de responsabilidades e cegos. Em casa, o vírus nos provoca muitas reflexões e perspectivas. É doloroso. Em casa, o jogo da humildade: brincar com filhos; conversar com os mais velhos; limpar armários e a casa; remexer e lavar roupas aparentemente limpas; descobrir o sentido de família, dos objetos descobertos e outras possibilidades de ser. É doloroso, o tempo da memória essencial. Não há rotina; não nos reconhecemos; não sabemos o que fazer. Em casa, muita comida, muitas crianças, alguns idosos e a luta intensa entre o que sei e o que posso fazer. É crescimento e areia movediça. É não ter tempo para mentiras ou ignorâncias, ainda que haja um propósito bem conhecido: sobrevivência. Em casa, nós vivemos a caverna platônica, hoje, com as informações de fora: puro desgoverno, alguma impaciência e grande torcida pela luz do sol outra vez. Não há discussão, argumento, relativização. Isolados, somos nossa primitividade e nossa essência. Isolados só nos resta imaginar e ver o tempo passar como Carolina, ou Aurélia, ou mesmo Capitu. Só nos resta engolir em seco e criar coragem para matar o tempo, controlar instinto e montar um esquema psíquico em que ‘ninguém largue a mão de ninguém’ ou atravesse o reino do lado de lá sem luta. Há um vírus passeando pelo mundo e nós recuperando nossa humanidade. Luta vigorosa: vírus biológico e vírus homem. Gandhi, um dia, disse: “seja a mudança que você quer ver no mundo”. Como o mundo parou, o planeta agradece. Pessoas querida, relaxem, respirem, leiam, aprendam, acessem, conheçam, arrumem, meditem, se exercitem, vejam, escrevam, conversem, brinquem, brinquem e brinquem. Aproveitem o tempo de vírus e ajustem suas humildades, orgulhos, prepotências, amores, histórias, medos, valentias, possessividades, positividades e liberdades. Não somos hospedeiros de uma toxina em surto, pura e simples. Somos moradas da inteligência, da força e da superação, com um pouco de esquizofrenia. Somos adaptação e mutação. Aproveitem!!!

Profª MSc Claudia Nunes (19.03.20 – 5º dia em casa com mamy)

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